Viagem ao Peru e Bolívia (5° Dia)

19/05/2012

Levantei cedo, banho, arrumei algumas coisas numa pequena mochila para levar no city tour que faria pelo Vale Sagrado. Pouco antes das 8h00min eu e Tiago saímos do hostal e fomos até o centro. Ao passar pela frente da catedral vi que estava tendo missa e me chamou atenção algumas pessoas pedindo esmola na porta. O contraste era grande, na porta os pedintes e dentro altares de ouro. Demos uma pequena volta pela Plaza de Armas e fomos até o local marcado para pegar a van que faria o city tour. Não demorou muito e a van chegou. Embarcamos e logo o guia pediu para o Tiago descer e entrar num micro ônibus. Isso fez com que ficássemos separados durante todo o city tour. Fui no último banco da van, ao lado de uma peruana e sua filha. A mulher ficou olhando “torto” para mim. O restante do grupo era todo de peruanos, sendo um casal em lua de mel, uma mulher com dois filhos pequenos e sua mãe idosa e mais um grupo de amigos. Pelo que entendi eram todos de outras cidades do Peru e estavam conhecendo Cuzco. O guia pediu que todos falassem seus nomes e de onde eram e quando disse que era brasileiro, a peruana que me olhava torto ficou toda derretida, me disse que sonhava em conhecer o Brasil, que achava os brasileiros maravilhosos.

Saímos da cidade e seguimos por uma estrada muito bonita, passando por montanhas e alguns vales. Logo fizemos uma rápida parada, num local cheio de barraquinhas com vários produtos de artesanato. O pessoal foi fazer compras e eu fiquei num canto esperando, pois além de não gostar desses locais de compras para turistas, eu estava com minhas mochilas cheias e não podia comprar nada, pois não tinha onde colocar. E cada coisa a mais que eu comprasse era um peso a mais para carregar nas costas, então não pretendia comprar nada ali ou em outro lugar.

Após meia hora o guia chamou todos de volta a van e a senhora que estava ao meu lado e sua filha se atrasaram. Quando apareceram estavam cheias de compras. Pelo que entendi elas estavam mais interessadas em fazer compras em Cuzco do que conhecer a cidade e as atrações da região. Elas eram de Lima, a capital e acho que alguns dos produtos que estavam levando era para vender lá em Lima. Seguimos com o passeio e fizemos uma rápida parada num mirante, de onde se tinha uma bela vista do Vale Sagrado. O vale tinha esse nome mais por se tratar de um local bonito e dedicado à agricultura, do que por razões religiosas ou sagradas. Após algumas fotos embarcamos novamente na van e seguimos com nosso tour. A senhora de idade que fazia parte do grupo começou a passar mal e sua filha ficou cuidando dela. E durante todo o tour a tal senhora passou mais tempo gemendo dentro da van do que aproveitando algum passeio.

Chegamos à entrada do parque nacional de Pisaq, que são ruínas espalhadas por uma montanha. O guia perguntou quem tinha o tíquete que dava direito a entrar em Pisaq e em outras atrações. Quase ninguém tinha e ele se disponibilizou a comprar os tíquetes. O preço era $ 80,00 soles. Disse a ele que eu mesmo preferia comprar o meu tíquete. Descemos todos da van e fui comprar o tíquete de um dia por $ 70,00 soles. Sempre fico esperto com guias turísticos, seja onde for, pois eles sempre dão um jeito de ganhar alguns trocados ás custas de turistas, seja ganhando comissão nas lojas e restaurantes onde leva os turistas, ou então intermediando algum serviço. O trabalho que o guia teve para comprar os tíquetes foi recolher o dinheiro na van, descer, andar cinco metros e ir na bilheteria que nem fila tinha. Pelos meus cálculos ele levou uns $ 60,00 soles da galera, somente nessa compra de tíquetes. O detalhe é que no tíquete vinha impresso o valor de $ 70,00 soles e não vi ninguém reclamar com o guia por estar pagando mais caro. Fiquei na minha, pois o problema não era meu, eu me preocupava com o meu dinheiro e se os demais não estavam nem aí por pagar mais caro pelas coisas o problema era deles.

Entramos em Pisaq e fomos seguindo por uma trilha, passando por algumas ruínas e fizemos uma parada onde o guia contou a história do local. Depois seguimos para um outro local, onde no alto de uma pequena montanha era visível algumas ruínas. A vista do local em geral era muito bonita. Pedi para o guia autorização para fazer o passeio sozinho por ali, pois ficar andando em grupo atrás do guia não faz o meu gosto, prefiro seguir sozinho, indo onde sentir vontade. O guia disse que tudo bem, apenas me alertou para o horário que eu deveria estar na saída do parque para não perder a van. Acho que ele ficou aliviado em me ter longe do grupo, talvez com medo de eu contar ao pessoal que ele tinha cobrado mais caro pelos tíquetes. Acabei encontrando a Marcelle e a Neusa, que são do grupo de Londrina. Conversamos um pouco e tiramos fotos juntos. Logo apareceu a Heverly com o restante do grupo de Londrina. Era a segunda vez que nos encontrávamos sem querer. O grupo de Londrina seguiu para outro local e eu fiquei andando sozinho por Pisaq. Acabei encontrando o Tiago, que chegava com seu grupo. Como estavam em um micro ônibus, o grupo dele sempre estava atrasado com relação ao meu, pois na van éramos mais velozes na estrada. O Tiago seguiu com o seu grupo e eu fui para a saída do parque, onde encontrei o meu grupo e embarcamos todos na van.

Seguimos com o tour e paramos num pequeno povoado, cujo nome não lembro. O local era cheio de lojinhas de artesanato. Mais uma vez encontrei a Heverly, sem querer, no meio de uma ruela. Fui com ela até o ônibus do pessoal de Londrina e ela me deu de presente uma foto, que tinha sido tirada em Cuzco no dia que nos encontramos pela primeira vez. O fotógrafo era da cidade e tirou a foto sem nós vermos. Ela acabou ficando com o presente e ia me mandar pelo correio quando chegasse ao Brasil, pois se eu ficasse com a foto ia acabar amassando em razão de carregá-la na mochila por muito tempo. O pessoal de Londrina seguiu seu tour e eu voltei para encontrar meu grupo. Acabei me perdendo nas ruas estreitas do povoado e só encontrei o caminho correto ao observar as montanhas em volta e conseguir me localizar. No caminho um morador local me chamou de brasileiro e na hora não entendi como ele tinha descoberto isso. Somente mais tarde é que me dei conta de que a camiseta que estava usando tinha uma pequena bandeira do Brasil pregada na barra direita.

Eram quase 14h00min quando paramos num restaurante no pequeno povoado de Urubamba. Eu não pretendia comer a comida local, da qual vinha fugido e muito menos naquele restaurante para turistas, onde certamente a comida seria pouca, ruim e cara. E o guia ia levar uma bela comissão. Avisei o guia que não ia comer ali e que voltava em uma hora, que seria o tempo que o pessoal ficaria ali. Ele disse que tudo bem e parecia preferir que eu ficasse cada vez mais longe do grupo. Caminhei um pouco, encontrei a avenida principal e fui caminhar por ela. O povoado era pequeno e muito organizado. Fui subindo pela avenida e observando as pessoas, as casas, as lojas, as montanhas em volta. Me chamou atenção os táxis, que na verdade eram motos com um largo banco atrás e uma capota. Outra coisa que me chamou atenção foi ao passar em frente a uma casa funerária e ver alguns caixões. Eles tem vidro em cima e nas laterais, ou seja, você pode ver o defunto pelos lados. Nunca tinha visto algo igual! Fui até o final da avenida e resolvi retornar. Ao passar em frente a um confeitaria o meu fraco por doces falou mais alto e entrei. Escolhi uma torta de chocolate recheada com doce de leite, que junto com um sorvete foi o meu almoço do dia. A torta estava deliciosa e só não comi outra por que não tinha espaço no estômago, seria gulodice comer outra. Vi que já tinha se passado quase uma hora desde que saíra do restaurante e resolvi voltar para junto do meu grupo.

Chegando no restaurante o pessoal já estava embarcando na van e ouvi alguns reclamando que a comida tinha sido pouca e o preço caro demais. Mais uma vez eu tinha acertado em não ficar junto ao grupo. Já viajei muito, tanto sozinho como em viagens guiadas e aprendi que ir nos lugares que o guia indica é furada, pois sempre são locais caros e nem sempre de boa qualidade. E que o guia sempre está ganhando alguma grana por levar os turistas nesses locais. Tudo bem, esse é o ganha pão dele, mas deixo que ele ganhe a vida em cima dos outros turistas menos avisados e não em minhas costas.

Seguimos para a próxima parada do tour, que seria o povoado de Ollantaytambo. Eu já conhecia esse povoado, pois foi ali a última parada antes de iniciar a Trilha Inca no ano anterior. Apenas não tinha conhecido as ruínas que ficam em montanhas em volta do povoado. Acho o lugar muito legal e foi bom retornar ali. Desembarcamos na entrada das ruínas e encontrei novamente o pessoal de Londrina, que tinha acabado de chegar ali. Pedi autorização ao guia para fazer o passeio pelas ruínas junto com meus amigos brasileiros e ele autorizou na hora.

Fiz todo o passeio com o grupo de Londrina, ouvindo as explicações da guia deles, que era muito melhor que o guia do meu grupo. Passei a maior parte do tempo junto com a Heverly e a Marcelle. A Marcelle sofria um pouco com as descidas de escadarias, um pouco por medo, outro pouco por se sentir mal. Ficamos cerca de uma hora fazendo o tour pelas ruínas de Ollantaytambo e o mais legal era a vista lá do alto, tanto a vista das montanhas em volta, quanto à vista do povoado lá embaixo. Ao me despedir dos amigos de Londrina, mais uma vez combinei com a Heverly de nos encontrarmos na Plaza de Armas a noite para irmos comer uma pizza juntos. O pessoal de Londrina foi embora e eu reencontrei o meu grupo. Embarcamos na van e mais uma vez ficou faltando à senhora de Lima e sua filha. Uns quinze minutos depois elas apareceram cheias de sacolas. Nem tinham feito o passeio pelas ruínas, apenas tinham ficado fazendo compras nas várias barracas de artesanato do local. Definitivamente o motivo da viagem delas não era cultural, mas sim comercial. E a senhora de idade estava cada vez passando mais mal e a filha dela pediu para a senhora de Lima e sua filha trocarem de lugar com ela, pois queria que a senhorinha seguisse deitada. O resultado de tal troca foi que fiquei espremido num canto com a senhorinha doente deitada ao meu lado e gemendo cada vez mais alto.

Seguimos para o próximo destino, que era um pequeno povoado chamado Chinchero. A estrada até lá era muito bonita e era possível ver algumas montanhas nevadas. O motorista da van mais uma vez mostrou ter o pé pesado e que gostava de ultrapassar em curvas. Chegamos à Chinchero no final da tarde e tive enorme dificuldade para descer da  van em razão da senhorinha doente estar deitada nos bancos ao meu lado. Mais uma vez preferi andar sozinho pelo povoado do que ficar seguindo o grupo e o guia. O que mais gostei foi da igreja do local, que é muito antiga e dentro tem uma infinidade de imagens, quadros e outros tipos de enfeites. Nunca vi nada igual e infelizmente não era permitido tirar fotos dentro da igreja. Dei mais uma volta por algumas ruínas próximas à igreja e entrei num pequeno museu. A noite chegou de vez e com ela o frio aumentou. Logo voltei para perto da van e fiquei esperando o pessoal das compras retornar. Ao lado uma mulher vendia milho cozido. Era um milho local, gigante. Fiquei na dúvida sobre comprar ou não uma espiga. O cheiro estava muito bom! Depois de observar por alguns minutos os cuidados higiênicos da vendedora de milho, desisti, pois comer um milho daqueles seria diarréia na certa. O pessoal retornou e fomos embarcar na van. A velhinha doente, sua filha e netos tinham desaparecido! O guia disse que embarcaram em outra van, pois não iam voltar a Cuzco, mas sim seguiriam de trem para Águas Calientes. Sinceramente não sei se a senhorinha chegou viva ao fim da viagem.

Chegamos à Cuzco às 19h15min. Desembarquei perto da Plaza de Armas, dei um tchau geral a todos e fui na agencia onde tinha comprado o pacote para a Trilha Salkantay, para acertar os detalhes do dia seguinte. Chegando lá encontrei o cara que me vendeu o pacote, ele estava completamente bêbado e não disse coisa com coisa. Era para eu estar em frente a agencia às 4h00min da manhã. Saí da agencia com receio de que o cara não se lembrasse do horário e do local que tinha marcado para eu encontrar o grupo da Trilha Salkantay.

Dei uma volta pelo centro da cidade e comprei algumas coisas para levar na trilha. Entre as compras uma lanterna de cabeça, alguns biscoitos, chocolate e pequenas latas de 100 ml de Leite Moça. Acabei comprando também uma mochila. Eu tinha levado uma mochila grande, de 70 litros e duas pequenas. Mas na trilha o ideal seria levar um mochila média, a qual eu teria que carregar e uma pequena com até 5 kg, que seria transportada por mulas nos dois primeiros dias. Voltei para o hostal, tomei banho e me arrumei para sair. Passei na recepção e deixei pago e reservado uma vaga num quarto coletivo para quando voltasse da trilha, dali quatro dias. Aquela seria minha última noite dividindo quarto com o Tiago, pois a partir do dia seguinte cada um seguiria para um destino diferente. Quando estava saindo o Tiago estava chegando do city tour. Ele comentou que tinha passado na agencia para acertar detalhes sobre sua ida para Machu Picchu no dia seguinte e que o guia estava bêbado. Ri do comentário dele e disse que também tinha falado com o guia bêbado.

Fui para o centro e fiquei uma hora no frio da Plaza de Armas tentando encontrar a Heverly. Pelo jeito é mais fácil nos encontrarmos por acaso, pois das vezes que marcamos algo não dá certo, nos desencontramos. E não foi somente no Peru que nossos encontros não dão certo, pois lembrei que meses antes ela tinha me dado um cano em Londrina. KKkkk… Desisti de encontrar a Heverly e da pizza e fui comer um lanche no Bembo’s. Em seguida voltei ao hostal, onde arrumei as coisas que ia levar para a Trilha Salkantay em duas mochilas, a média nova e numa pequena. E na mochila grande e na outra pequena, coloquei tudo o que não ia levar na trilha. Essas mochilas ficariam guardadas até minha volta em um depósito no hostal. Antes de dormir descobri que o terceiro quarto que tínhamos ocupado em dois dias no hostal, também estava sem água. O tal Hostal Samanapata era uma bela droga! Logo fui para a cama quentinha e aproveitei para dormir no conforto que não teria nos próximos dias na trilha, dormindo em barraca.

Contraste: pedintes na porta e altares de ouro.
Centro de Cuzco.
No Vale Sagrado.
Vale Sagrado.
Ruínas de Pisaq.
Pisaq.
Em Pisaq, com Tiago.
Em Pisaq, com as londrinenses Marcelle e Neusa.
Num povoado que esqueci o nome.
No centro de Urubamba.
Confeitaria onde almocei em Urubamba.
Peruanitas em Ollantaytambo.
Ruínas de Ollantaytambo.
Fazendo o tour por Ollantaytambo com o pessoal do Londrinapé.
Povoado de Ollantaytambo.
Ruínas de Ollantaytambo.
Artesanato a venda em Ollantaytambo.
Igreja de Chinchero.
Nas ruínas em Chinchero.

De volta a Aguas Calientes

Sair de Machu Picchu e voltar a Águas Calientes, me deixou com uma sensação de quero mais. Não ter entrado em Machu Picchu caminhando pela Trilha Inca, e não ter subido até Wuayna Picchu, me deixou meio frustrado e com vontade de voltar ao Peru o mais breve possível para fazer o que ficou faltando.

Descer a montanha de ônibus foi mais rápido do que subir. Descemos na rua, na esquina do restaurante onde deixei a mochila. Eram 15h00min e mal entramos no restaurante começou a chover forte. Os guias peruanos estavam todos ali, tomando cerveja. Fui cumprimentá-los e acabei sofrendo o maior acidente de toda a viagem. Escorreguei no piso molhado e bati a mão em uma coluna. Senti uma dor terrível e o local logo ficou inchado. Coloquei gelo, mas não aliviou muito. No final do dia toda a região em volta do lugar da batida estava roxa e muito dolorida. Fiquei com receio de que fosse algo grave, tamanha era a dor e a aparência ruim com que o ferimento ficou. Achei isso irônico, pois tinha passado dias no meio do mato, correndo enormes riscos de me machucar, talvez até morrer (muitos já morreram na Trilha Inca) e fui me machucar justamente ao entrar num restaurante, o que parecia ser um lugar seguro. Meu escorregão acabou chamando a atenção de todos que estavam no restaurante naquela hora, muitos turistas, até um casal de brasileiros. Em seguida chamamos atenção novamente, pois meu irmão e a garçonete meio que se atrapalharam ao arrumar a mesa e ela derrubou um copo no chão. Mais uma vez todos olharam em nossa direção e para piorar os peruanos gritaram em coro: Brasil, Brasil, Brasil, Brasiiiiiillll !!!! Foi um grande mico e tive vontade de me esconder debaixo da mesa.

Eu meu irmão almoçamos uma pizza e tomamos um litro de Coca-Cola gelada. Após alguns dias comendo a horrível comida servida na trilha, foi muito bom comer algo descente. Os peruanos logo foram embora, deram tchau e dificilmente voltarei a ver algum deles novamente em minha vida. Ainda estávamos comendo quando algumas pessoas do meu grupo chegaram para pegar suas mochilas. E aos poucos foi chegando o restante do pessoal. A chuva tinha aumentado muito e ninguém mais quis ficar passeando por Machu Picchu debaixo de tanta água. Logo meu irmão foi para a estação de trem e fui com ele. Despedimos-nos e dei uma volta por uma enorme feira de artesanato que existe ao lado da estação. Tem muita coisa bonita, mas os preços são para turistas endinheirados, o que não é meu caso. Vi muita coisa feita de prata, algo que achei que seria barato ali. Mas não, é tudo mais caro que no Brasil. Acho que os espanhóis roubaram todo o ouro e prata do Peru, que agora qualquer objeto feito com esses metais é muito caro. A cidade é pequena e como chovia muito resolvi voltar logo para o restaurante.

Até o horário de ir pegar o trem, fiquei no restaurante conversando com o pessoal. Acabei ficando numa mesa muito animada, junto com os dois colombianos do grupo, o Juan e sua esposa Cecília, a Carolina, a Roxana e por último chegou o Che. Fizeram alguns brindes com um tipo de caipirinha feita com pisco, uma bebida local. Acabei tendo que participar dos brindes e tive que tomar um pouco de pisco. O chato nesse tipo de viagem onde você acaba fazendo parte de um grupo de desconhecidos, é que a viagem termina justamente quando você finalmente ficou enturmado e fez muitas amizades. Daí todos se separam e nunca mais se encontram novamente.

Já estava escuro quando fomos para a estação e a chuva continuava firme. Fui um dos últimos a embarcar e logo o trem partiu. Gosto de viajar de trem, mas a noite não da para ver nada, ainda mais com chuva. Os locais por onde íamos passar são interessantes, com paisagens bonitas, mas não dava para ver nada. O jeito foi ficar olhando para dentro do trem. O pessoal ficou jogando baralho do meu lado. Conversei um pouco e depois fiquei quieto pensando na vida. Estava cansado e as duas horas de viagem não foram das melhores. Descemos na estação de Ollantaytambo, pois o trecho até Cuzco está interrompido desde ás fortes chuvas de março do ano passado. Fomos caminhando até um enorme estacionamento onde estavam muitas vans e ônibus esperando o pessoal que desembarcava do trem. Logo encontramos nosso ônibus e tivemos que esperar que fizessem uma chamada demorada e confusa, até que pudéssemos embarcar. Acabei indo parar no ônibus onde estava quase todos do outro grupo que sempre andou próximo a nós. Sentei-me na segunda poltrona atrás do motorista e ao meu lado estava o inglês com quem caminhei junto no final do terceiro dia de trilha. Na poltrona a minha direita duas australianas, a Kylah e sua amiga cujo nome não lembro. O ônibus era desconfortável, e teríamos mais duas horas de viagem pela frente, até Cuzco. Tentei dormir mas foi impossível quando vi as manobras imprudentes que o motorista fazia. Ele corria feito louco e fazia somente ultrapassagens perigosas. Era de dar medo e o sono logo foi embora. O radio do ônibus estava ligado, tocando umas músicas peruanas. Teve uma hora que começou a tocar Leonardo, cantando em espanhol. Comecei a rir…

Chegamos a Cuzco com chuva e muito frio. O ônibus parou numa praça perto da Plaza de Armas e ali desembarquei junto com mais cinco conhecidos. Despedi-me do pessoal e fui para o hotel, distante 200 metros. Cheguei à portaria do hotel e logo encontraram a reserva que eu tinha deixado feita antes de partir para a Trilha Inca. Aproveitei para pegar a mochila que tinha deixado guardada no depósito do hotel. Estava tudo em ordem, nada faltando ou sobrando. Era quase meia noite quando entrei no quarto. Tomei um banho não muito quente, pois a água não esquentava direito e caí na cama. Após seis noites mal dormidas, ou dormidas com pouco conforto, finalmente eu poderia dormir muitas horas numa cama confortável e quentinha. Para garantir dormi com o aquecedor do quarto ligado. A sensação era boa, de missão cumprida. Eu vivi quatro dias intensos e inesquecíveis percorrendo a Trilha Inca e conhecendo Machu Picchu. Agora era descansar, pensar na volta ao Brasil e depois na próxima viagem, na próxima aventura…

Eu e meu irmão.
Duas coisas que adoro: Pizza e Coca-Cola.
o ferimento na mão, que piorou muito nas horas seguintes.
Muitos brindes com pisco.
Che, eu, Juan e Cecília.
No trem.
O pessoal jogando baralho no trem.
Desembarcando em Ollantaytambo.

Ollantaytambo

Minha primeira noite em Cuzco não foi das melhores no quesito sono. Dormi muito mal, acordei várias vezes com falta de ar, tive sonhos ruins. Sei que levantei ás seis da manhã no maior bagaço e pra piorar ás três noites seguintes seriam no meio das montanhas, dormindo em barraca. Se no conforto da cama do hotel dormi mal, fiquei preocupado em como seriam as noites seguintes. Caindo de sono terminei de arrumar minhas coisas, fui até a portaria do hotel e deixei uma mochila para ser guardada no depósito. É meio que praxe todos os hotéis e hostels terem um depósito para que os hóspedes deixem algo guardado enquanto vão fazer alguma trilha ou então seguem para Machu Picchu. Não me cobraram nada pelo serviço de guardar a mochila, talvez em razão de eu ter feito uma nova reserva para quando voltasse da Trilha Inca. Eu ainda sentia enjôo, falta de ar e tonturas, então tomei uma pílula para altitude, que tinha comprado no dia anterior, tomei uma xícara de chá de coca e masquei algumas folhas de coca. No hotel tinha uma mesinha num canto com chá de coca para os hóspedes e também uma cestinha com folhas de coca. O sabor da folha de coca não é dos melhores, a boca fica meio adormecida. Sei que pouco tempo depois eu já me sentia melhor, acredito que a combinação  pílula + chá de coca +  folha de coca, fez um efeito mais imediato. 

Fiquei quase uma hora na calçada em frente ao hotel esperando que alguém da agencia de turismo fosse me buscar. Nesse tempo pelo menos uns cinqüenta taxis passaram na rua em frente e buzinaram para mim. Parece que na cidade existem mais taxis do que carros de passeio e os motoristas têm o péssimo hábito de buzinar para todos os estrangeiros que eles vêm na rua, na esperança de que algum resolva seguir no seu taxi. Sei que é algo irritante, ás vezes passavam três taxis juntos e os três buzinavam. Finalmente apareceu alguém da agencia, era a Glória, uma peruana que seria uma das guias na Trilha Inca. Fui com a Glória até um ônibus estacionado perto do hotel. Eu fui o último a embarcar e ali mesmo se iniciou uma chamada para conferir se não faltava ninguém. Os hispanos não conseguem pronunciar meu nome corretamente, isso acontecia muito no tempo em que eu vivi nos Estados Unidos. Eles não conseguem pronunciar o “V”, que pra eles tem o som de “B”. Então meu nome que é “José Vanderlei”, acaba sendo pronunciado como “Rosé Banderlei”, o que para mim é algo horrível. Felizmente nos dias seguintes todos passaram a me chamar de Vanderlei ou de Vander, mesmo que errando na pronúncia, mas isso é bem melhor do que o “Rosé”.  Após umas três ou quatro chamadas, finalmente resolveram pegar a estrada. Fiquei no fundo do busão e  próximo a mim iam dois caras com cara de estrangeiros, que depois vim a descobrir serem da Inglaterra e do Canadá. Logo na saída da cidade percebi que a periferia é muito pobre, com casas construídas nos morros. Desde março de 2010 quando a região sofreu com ás chuvas, no que foi chamada de enchente do século, parte dos trilhos do trem que iam de Cuzco até Aguas Calientes (pequena cidade aos pés de Machu Picchu) foram destruídos e por essa razão parte do trajeto tem que ser feito de ônibus. Na estrada fiquei assustado com a velocidade que o motorista conduzia o ônibus, tirando fina de outros veículos. Como estava com sono resolvi encostar minha cabeça na janela e logo adormeci. Fui acordar quase duas horas depois, quando chegamos ao pequeno vilarejo de Ollantaytambo, no km 68. Os guias avisaram que ali seria o último lugar onde poderíamos comprar por preços justos equipamentos que faltassem, água e algum tipo de comida. 

O vilarejo é muito interessante, com uma enorme praça central, algumas lojas e pequenos prédios em volta. Ao lado do vilarejo dá pra ver montanhas muito altas e bonitas e também algumas ruínas de construções incas. O que mais me chamou atenção foi que numa das calçadas existe um tipo de caneleta por onde corre água que vem das montanhas. A água é limpa e gelada. Andei pelas proximidade e vi que essa canaleta na calçada também passa bem na porta de algumas casas. Aproveitei para usar o banheiro de um mercadinho e esse foi o último banheiro descente que usei em quatro dias. Logo voltamos para o ônibus e pegamos a estrada novamente. Fomos através de uma estradinha ruim que seguia por um vale e passava bem perto dos trilhos do trem. Seguimos até o km 82, onde paramos e desembarcamos junto com nossas mochilas. 

No meu grupo eram 59 pessoas, que foram subdivididas em dois grupos. Fui parar num grupo de 29 pessoas. Eu, dois colombianos e 26 argentinos. Por sorte sempre me dei bem com argentinos e principalmente com argentinas. No outro grupo cujo guia falava inglês, ficaram alguns canadenses, ingleses, australianos e… argentinos. No início não entendi o porquê de tantos argentinos, mas depois conversando com alguns, vim descobrir que em razão da moeda deles estar muito desvalorizada, eles procuram destinos turísticos onde o valor da moeda não seja dos piores, como é o caso da Bolívia e do Peru. Em vez de irem em peso ao Brasil como faziam antes, agora é mais barato ir pra mais longe, pois no Brasil a moeda deles vale somente a metade, enquanto no Peru tem quase o mesmo valor que a moeda local. 

Após acertamos os últimos detalhes e verificarmos nosso equipamento, fomos em direção ao posto de controle da trilha. No caminho paramos em frente a uma placa que indica o início da Trilha Inca, e onde tradicionalmente todos os grupos que por lá passam, tiram uma foto em frente. Com nosso grupo não foi diferente e após várias fotos seguimos até o posto de controle. Eu era o último da fila, na minha frente tinha um argentino com a cara do Che Guevara quando mais moço e ainda por cima ele usava um boné igual o utilizado pelos revolucionários de Fidel Castro e de Che Guevara,  na Revolução Cubana, inclusive com uma bandeira cubana pregada na lateral. Sei que nos dias seguintes todos passaram a chamar esse argentino pelo nome Che. Passei pelo posto de controle sem nenhum problema e ganhei uma carimbo em meu passaporte. A sensação era de estar entrando em um outro país, devido ao tipo de controle feito para entrar no “Santuário Histórico de Machu Picchu”. Ali iniciava a aventura, era o começo do sonho…

Ollantaytambo
A calçada com a canaleta de água e alguns moradores locais.
Caminhando pelas calçadas de Ollantaytambo.
Ruas de Ollantaytambo e ruínas incas nas montanhas próximas.
A tradicional foto em frente a placa no início da Trilha Inca.