Levantei cedo, peguei minhas coisas e fui de taxi para o aeroporto. Pelo caminho fui assistindo as barbeiragens e imprudências dos motoristas. Chegando ao aeroporto fiz os tramites normais de embarque e passei tranquilamente pela Policia Federal local. Então fui para a sala de embarque e para variar o vôo atrasou. Aproveitei para usar a internet e comprar chocolates no Freeshop.
O vôo de volta não foi nada tranqüilo, teve muita turbulência. O piloto avisou que teria que ir desviando de espessas nuvens de chuva e que por essa razão o vôo seria mais demorado do que o previsto. Chacoalhou muito durante quase toda a viagem e fiquei muito enjoado. O pior é que não conseguia dormir, não conseguia ler e assim o tempo não passava. O jeito foi ouvir música no MP3 para tentar me distrair um pouco. No final da tarde teve um momento em que foi bem visível o tal desvio que o piloto estava fazendo das nuvens de chuva. Dava para ver pela janela nuvens escuras e muitos raios, bem próximos ao avião. Era uma cena ao mesmo tempo bonita e assustadora.
Felizmente entre turbulências e mais turbulências, aterrissamos em São Paulo sãos e salvos. Chegava ao fim minha aventura peruana, que será inesquecível por muitas razões. Pretendo voltar ao Peru algum dia, para fazer o que ficou faltando fazer dessa vez e para conhecer novos lugares.
O hotel onde fiquei em Lima era bem no centro da cidade. Próximo a ele tinha uma rua muito parecida com a rua XV, em Curitiba. Essa rua terminava em uma praça bem em frente ao Palácio do Governo do Peru. Em volta da praça muitos prédios pintados de amarelo. Caminhei bastante pelas ruas, prestando atenção aos detalhes. Aproveitei para matar saudades de coisas que comia nos Estados Unidos. O almoço foi pizza no Papa Jhones e a janta foi frango frito no KFC.
Em Cuzco fui confundido muitas vezes como sendo norteamericano. Muita gente, principalmente vendedores se dirigiam a mim falando em inglês e quando eu respondia em português, espanhol ou portunhol, eles faziam uma cara de espanto. Já em Lima preferi usar somente camisetas amarelas da seleção de futebol.
Em Lima não existe o problema da altitude, pois a cidade fica a beira mar. Mas voltar ao nível do mar também me fez mal. Acho que era o excesso de oxigênio no ar que me deixou com dor de cabeça e tontura. Devido aos muitos dias que passei em altas altitudes e com ar rarefeito, creio que meu organismo estava começando a ficar acostumado com o pouco oxigênio e sentiu diferença quando voltei ao nível do mar.
Como percebi em todos os lugares do Peru onde estive, o trânsito é uma caos. Os motoristas são todos imprudentes, egoístas e adoram uma buzina. Logo foi complicado dormir com tantas buzinas a noite. Mesmo assim descansei bem em minha última noite em terras peruanas.
A manhã de minha partida de Cuzco foi sem chuva, o que me deixou mais tranqüilo, pois me preocupava algum problema ou atraso no vôo por culpa da chuva. Fechei a conta no hotel e logo embarquei num taxi rumo ao aeroporto. Os taxis na cidade são baratos e não existe taxímetro, é tudo na base da negociação. Não levou nem dez minutos para chegar ao aeroporto e pude conhecer um pouco mais da periferia da cidade, pela janela do carro.
Meu vôo seria pela Star Peru, uma companhia aérea de médio porte e com aviões de tamanho médio. Fiz os tramites para despachar bagagem e fui para a sala de embarque. Lá descobri que meu vôo atrasaria em pouco mais de uma hora. Então sentei no chão perto de uma tomada e fiquei usando o computador. Encontrei as duas australianas que faziam parte do outro grupo que fez a Trilha Inca. Conversamos rapidamente e mostrei a elas um pequeno vídeo que fiz delas dançando. Elas ficaram vermelhas de vergonha e pediram para que eu enviasse o vídeo para o email delas.
E finalmente chegou a hora do embarque e do adeus a Cuzco. Diferente das muitas horas de ônibus que levei de Lima até Cuzco, o retorno seria de apenas uma hora de vôo. O aeroporto de Cuzco é complicado para aterrissagens, pois fica entre muitas montanhas e o piloto tem que fazer uma manobra radical para pousar. Ele executa uma virada lateral de 180 graus, algo mais comum a aviões de guerra. Já para decolar não é necessário executar tal manobra, então embarquei mais tranqüilo. Por mais que eu viaje de avião, não consigo gostar de voar, prefiro sempre ter os pés no chão.
O vôo foi tranqüilo e comecei a ler o livro do Bingham que tinha comprado no dia anterior. Do meu lado foi uma peruana que começou a puxar conversa. Quando soube que eu era brasileiro, ela me encheu de perguntas. Disse que seu sonho é conhecer o Rio de Janeiro, o carnaval. Falei a ela que o Brasil tem lugares mais interessantes e menos violentos que o Rio de Janeiro, para ela conhecer. E entre a leitura do livro e a conversa com a peruana, o vôo transcorreu tranqüilo, ou melhor, quase tranqüilo. Um pouco antes de chegar a Lima, teve uma turbulência daquelas inesperadas e que assustam bastante. E para descer em Lima o piloto executou a manobra de 180 graus que ele está habituado a executar para descer em Cuzco. Foi assustador e minha labirintite deu as caras, fiquei tontinho. Com certeza essa foi uma das piores aterrissagens que já fiz.
No desembarque em Lima me despedi da peruana e liguei para o taxista que conheci dias antes. O telefone dele não atendia, acho que era seu dia de folga. Então o jeito foi encontrar outro taxista e seguir rumo ao centro da cidade. Ficaria em Lima até a manhã seguinte, quando então embarcaria para o Brasil.
Fiquei cerca de três horas esperando na rodoviária da empresa Cruz del Sur. Estava a vinte e quatro horas sem banho e resolvi tomar um banho de gato no banheiro da rodoviária. O banho consistia em molhar uma pequena toalha, passar por todo o corpo e depois passar uns lencinhos umedecidos e perfumados pelo corpo. Pra completar, cueca e meias limpas. Fazia muito calor e por sorte minha passagem leito dava direito a utilizar a sala vip da empresa, com ar condicionado. Na sala vip tive o primeiro contato com o famoso chá de coca, que é feito com as folhas da coca, ás mesmas folhas que utilizam para produzir cocaína. Esse chá é parte da cultura peruana e muito usado nas regiões mais altas do país, principalmente para combater o mal da altitude, ou seja, as tonturas e mal estar provocados pelo ar rarefeito nas altitudes elevadas. Em Lima não existe o problema da altitude, pois se está ao nível do mar, mas mesmo assim provei o tal chá. Achei horrível, mas nos dias seguintes tive que consumir muitas xícaras desse chá. O preço da passagem leito para meu trecho que era de 1.200 quilômetros custou o equivalente a R$ 140,00. A passagem de ônibus leito entre Campo Mourão e Curitiba, numa distância de 490 quilômetros, custa os mesmos R$ 140,00. Ou seja, viajar de ônibus no Peru é barato para nós brasileiros e ainda temos algumas mordomias.
Logo chegou meu horário de embarcar e fui despachar minha mochila. O sistema é diferente do que se faz no Brasil. Tive que ir num local próprio pra despachar a bagagem, parecido com o sistema utilizado nos aeroportos. As bagagens são pesadas e se passar de 20 quilos, você é obrigado a pagar excesso. Na fila de embarque tinha uma loira em minha frente e logo ela se virou e sorriu. Daí começou a puxar conversa em inglês, ela era australiana. Meu inglês está sofrível, mas mesmo assim deu pra manter um certo diálogo. Preciso urgentemente voltar a estudar inglês, pra poder xavecar as estrangeiras em viagens internacionais, rs… Pra embarcar no ônibus as bagagens de mão são revistadas, os passageiros também, inclusive com detector de metais e todos são fotografados. Achei o sistema interessante e bem que podia ser adotado algo similar no Brasil, onde ocorrem muitos roubos a ônibus. O ônibus era de dois andares e minha poltrona leito era no andar inferior. Fiquei torcendo para que a loira australiana fosse no mesmo andar, mas ela acabou indo no andar de cima. Acabei ficando numa poltrona individual e ao lado em uma poltrona dupla iam dois canadenses. Pelo caminho embarcaram mais alguns estrangeiros no andar de baixo.
Nos primeiros quilômetros após sair de Lima a estrada segue margeando o litoral. É uma região feia, praias feias e povoados muito pobres. O ônibus tinha internet e consegui ficar um tempo lendo emails e conversando pelo MSN, até que a bateria de meu not book acabou. Então para passar o tempo fui alternando cochiladas, algumas olhadas pela janela e depois vi dois filmes na tv do ônibus. De ponto negativo é que no banheiro do ônibus só é permitido fazer xixi. Se precisar fazer um cocozinho básico, você precisa avisar uma das rodo moças para que peçam ao motorista parar em algum posto de gasolina ou na beira da estrada se for algo urgente. Se levar em consideração que a viagem tem uma duração de 21 horas e só tem uma única parada de 10 minutos, esse caso do banheiro pode ser um grande problema. Eu felizmente consegui me agüentar durante toda a viagem. Outro detalhe chato é que você é obrigado a ficar atado ao cinto de segurança durante toda a viagem. Eu não atei o meu e uma das rodo moças me deu uma bronca, inclusive me advertindo de que caso eu recusasse a atar o cinto, ela faria uma notificação as autoridades locais do meu destino final e eu teria que me justificar perante as autoridades peruanas. Diante de tão amável ameaça achei melhor atar o cinto, mas bom brasileiro que sou deixei o cinto bastante frouxo e podia me virar pra todos os lados sem problema algum. Também descobri que era terminantemente proibido ficar em pé durante a viagem e muito menos ir de um andar a outro do ônibus. Ou seja, papear mais com a loira australiana estava totalmente fora de cogitação. Logo que anoiteceu as duas rodo moças vieram servir o jantar. Eu estava com muita fome e quando vi a comida não fiquei muito encorajado a comer. O cardápio era frango cozido em pedaços e um arroz amarelo, Coca-Cola e de sobremesa um pudim de leite. Não sei se foi a fome, mas a comida estava boa. Após o jantar aconteceu um bingo. O prêmio era uma passagem de volta, no mesmo trecho da ida. Não fui o vencedor, me faltaram três números. Após o bingo apagaram as luzes e passaram mais dois filmes. Assisti apenas um deles e dormi.
Acordei pouco antes da meia noite quando o ônibus fez uma parada na cidade de Nasca, para trocar o motorista, que no Peru chamam de piloto. A partir de Nasca é que começa a subida para a região alta do Peru, onde existem centenas de montanhas e pouco oxigênio no ar. Voltei a dormir e após uma hora acordei me sentindo mal, sentindo algo parecido aos meus antigos ataques de labirintite. Logo descobri o motivo, estávamos subindo uma enorme serra e eram tantas curvas fechadas que o ônibus balançava muito e deixava todos meio tontos. Fazia lua cheia e era possível ver as enormes montanhas, uma paisagem deslumbrante. Fiquei um bom tempo olhando pela janela do ônibus e em alguns trechos passávamos tão próximos ao abismo ao lado da estrada que dava um frio na barriga. Pude ver dezenas de pequenas cruzes ao lado da estrada, sinal de que ali ocorrem muitos acidentes. A temperatura despencou e logo voltei a dormir. Quando olhei no relógio pela ultima vez eram 2h35min. No horário do Brasil seriam 5h35min.
O desembarque em Lima e os procedimentos de desembarque e migração foram tranquilos. Aproveitei para trocar dólares pela moeda local, Novo Soles, ainda dentro do aeroporto nuns ghiches existentes antes da passagem pela Receita Federal local. Descobri que também trocam Reais por Novo Soles. Um real está valendo 2,80 Novo Soles, o que não é ruim. Minha intenção não era ficar em Lima, mas sim ir para o interior, mais especificamente para a cidade de Cuzco, distante uns 1.200 quilômetros dali. Lima por ser uma cidade grande e ao meu ver sem muitas atrações turísticas interessantes e trânsito caótico, acabou não me despertando nenhum interesse em conhecê-la melhor.
Ainda no Brasil tinha tentado comprar a passagem aérea entre Lima e Cuzco pela internet. Não consegui fechar a compra pois o site da companhia aérea pedia uma validação do cartão de crédito internacional. Pelo que me informei é um processo novo de segurança e somente alguns cartões de crédito do Bradesco é que já possuem tal código. Para eu conseguir esse código do meu cartão que é do Itaú, teria que ligar pra operadora do cartão e resolver um processo burocrático. Eu não tinha tempo e paciência para isso, então embarquei sem ter o treho interno no Peru comprado. Tentei comprar a passagem no aeroporto, mas não sei por qual razão os voos para Cuzco saem quase todos na parte da manhã. Como cheguei quase na hora do almoço (o Peru tem três horas a menos em relação ao Brasil) só teria mais um voo no meio da tarde, mas estava muito caro. Queriam me cobrar U$ 380,00 por uma passagem que eu tinha visto na internet por cerca de U$ 110,00. Outro detalhe estranho é que a empresa aréa Lan, cobra de não residentes uma taxa extra de U$ 180,00. Já a outra empresa que pesquisei, Star Peru, não cobra tal taxa. Ou seja, se não pesquisar você corre o risco de pagar mais caro em tudo. Eu não estava nem um pouco afim de pagar caro numa passagem interna para um voo de cerca de uma hora, então optei por ir de onibus.
Tinha pesquisado muito sobre a viagem de ônibus entre Lima e Cuzco e apesar de serem 21 horas dentro do ônibus, tal forma de viagem me atraiu desde o início em razão de poder ver pela janela do ônibus muitas paisagens interessantes e bonitas do interior do Peru. Parte da viagem seria durante a noite, mas mesmo assim daria pra ver muita coisa pela janela do ônibus. Eu tinha em mãos todas as informações sobre a melhor empresa de ônibus, preços, horários e etc, então foi só encontrar um taxista que parecesse confiável e seguir para a rodoviária. Logo encontrei uma taxista que me parecdeu honesto e fechamos o valor para me levar até a rodoviária e antes fazer um pequeno city tour pela cidade. Pelas janelas do carro vi partes ricas e pobres da cidade, coisas bonitas e feias. As ruas eram meio sujas, o trânsito caótico, os motoristas não costumam dar a vez nem mesmo quando o outro motorista dava seta avisando que ia virar pra determinado lado ou então que ia mudar de pista. Por duas vezes cheguei a fechar os olhos achando que outro carro ia bater no nosso. De interessante foi a conversa com o Sr. Ricardo, motorista do taxi. Ele me contou sobre fatos históricos locais e tivemos um longo papo sobre a Guerra do Paraguai. Após 40 minutos o Sr. Ricardo me deixou na rodoviária da empresa Cruz del Sur. Lá não existe uma rodoviária única, mas sim cada empresa grande tem sua própria rodoviária, em menor tamanho. No caso da empresa Cruz del Sur, era um local novo e bem arrumado, melhor do que muita rodoviária de cidades importantes do Brasil. Comprei minha passagem, fiz um lanche e fui esperar o horário pra embarcar.