Viagem ao Peru e Bolívia (6° Dia)

20/05/2012 

Trilha Salkantay – 1° dia

Acordei ás 3h00min, quando o Tiago saiu para ir rumo à Machu Picchu. Nos despedimos rapidamente, eu nem saí da cama. Meia hora depois levantei com muita dificuldade, me arrumei, acordei o carinha da recepção, deixei duas mochilas guardadas no depósito do hostal e saí. Fazia frio e eram um pouco assustadoras as ruas escuras e desertas de Cuzco naquele horário, mas felizmente tais ruas eram seguras. Cheguei em frente a agencia na qual comprei o pacote para a Trilha Salkantay ás 4h15min. Não tinha ninguém ali e temi que me esquecessem em razão do cara com quem comprei o pacote estar bêbado no dia anterior quando passei ali falar com ele. Esperei vinte minutos e apareceu um cara perguntando meu nome. Respondi e ele pediu para segui-lo até uma van estacionada ali perto. Entrei na van e vi quatro pessoas dentro dela. Dei um “hi” e me sentei. Seguimos até uma praça ali perto e após meia hora de espera os demais integrantes do grupo foram chegando, bem como alguns peruanos que seriam guias, cozinheiros e ajudantes. O dia estava começando a clarear quando partimos rumo ao local do início da trilha. Fazia muito frio, encostei a cabeça no vidro e dormi. Um tempo depois acordei quando estávamos em uma serra, cheia de curvas e eu quase caindo do banco. Me ajeitei um pouco melhor e voltei a dormir.

Eram quase 8h00min quando chegamos num pequeno povoado. Desembarcamos da van e entramos nos fundos de uma casa. Ali estava preparada uma mesa com o café. Tomei apenas um chá quente e fiquei observando os demais integrantes do grupo. O grupo era formado por 16 pessoas. Logo notei um cara sentado isolado e fui falar com ele, pois tinha certeza de que era brasileiro. E era mesmo! Alex, gaúcho de Porto Alegre. Começamos a conversar e uma loira veio falar conosco. Isabel, brasileira de Curitiba, mas morando em São Paulo. Ela estava junto com seu namorado, um francês. Começamos a conversar os três e então uma francesa veio conversar conosco em português. Florencia já morou na Bahia e por isso domina bem o português. Atualmente está morando na Guiana Francesa. Ficamos conversando os quatro e logo o guia nos chamou para fora, pois seriam pesadas as mochilas que as mulas levariam nos dois primeiros dias de trilha. Minha mochila pequena pesava justamente os 5 kg permitidos para serem levados pelas mulas. Nessa mochila seguiam alguns biscoitos e outras guloseimas. Conforme fosse consumindo tais coisas eu ia passando coisas da outra mochila para essa pequena e dessa forma o peso que eu teria que carregar nos próximos dias ia sendo reduzido aos poucos.

Após tudo pesado e ajustado nas mulas, seguimos para a praça em frente. Ao lado da praça estava funcionando uma pequena feira, onde o produto principal negociado eram batatas de várias qualidades. Os feirantes e moradores locais não deram atenção para nós, talvez já acostumados com as várias expedições que partem dali quase diariamente rumo a Trilha Salkantay. Tivemos uma breve reunião de apresentação no meio da praça e tiramos uma foto com o grupo todo reunido, inclusive com os peruanos que dariam apoio a expedição. Nosso grupo era formado por 3 brasileiros, 2 franceses, 3 ingleses, 3 canadenses, 2 israelenses, 1 suíço, 1 argentino e 1 italiano. Era um grupo bem eclético, mas nos próximos dias se mostraria bastante unido.

Começamos a percorrer os primeiros metros da Trilha Salkantay. Passamos por dentro da cidade e logo começamos a caminhar por uma estrada empoeirada, sempre subindo. A Trilha Salkantay não é tão famosa quanto a Trilha Inca (que fiz em 2011), mas é mais longa, tendo 82 km contra os 42 km da Trilha Inca. As duas trilhas são bem diferentes, pois enquanto a Trilha Inca é quase toda em calçadas e escadarias de pedra, passando por ruínas e antigas construções incas, a Salkantay passa por estradas, florestas, trilhas próximo a montanhas nevadas. A Inca é mais isolada, enquanto a Salkantay passa por pequenos povoados no meio da floresta e também tem um longo percurso por estrada e ao lado do trilho do trem. A Inca é uma trilha clássica e tem o número de caminhantes controlados pelo Governo Peruano, pois passa dentro de um parque nacional. Na temporada é preciso reservar seu lugar na trilha com bastante antecedência. Então a Salkantay acaba sendo uma opção para aqueles que chegam ao Peru e não conseguem lugar para percorrer a Trilha Inca. As agencias de turismo costumam “vender” a Salkantay como substituta e igual à Trilha Inca, mas as são muito diferentes. Aconselho a quem puder, que faça as duas trilhas igual eu fiz, pois são experiências totalmente distintas e inesquecíveis.

No início da caminhada segui ao lado da Florencia, conversando. Depois da primeira parada de descanso passei a caminhar com a Izabel, que é astróloga e me contou algumas coisas muito interessantes sobre o tema. Ela tinha feito a Trilha Inca dezessete anos antes e dessa vez como não conseguiu lugar para percorrer a Trilha Inca, resolveu fazer a Salkantay. Creio que quase todos do grupo estavam fazendo a Salkantay por não terem conseguido lugar na Trilha Inca. Acho que eu era a única exceção, pois tinha ido fazer a Salkantay por já ter feito a Trilha Inca dezesseis meses antes.

Os primeiros quilômetros de trilha me fizeram lembrar das caminhadas que faço no Brasil, pois andamos por estradas próximas a pequenos sítios, regiões de agricultura. E vez ou outra passava por nós algum carro ou pequeno caminhão. A manhã toda percorremos lugares parecidos e vez ou outra atravessávamos algum local de mata, mas sempre subindo. A cada meia hora em média fazíamos uma pequena parada para descanso. Eu caminhei quase sempre no final do grupo, às vezes sozinho, outras vezes iniciando um papo com alguém. Pouco depois do meio dia paramos num local descampado onde ao lado tinha uma pequena venda onde eram vendidos água, chocolate, refrigerantes e mais uma porção de coisas. Dali era possível ver ao longe uma montanha nevada, a qual seria nossa companheira na paisagem pelo resto do dia. Sentei numa pedra e comi alguns biscoitos. Daí apareceram dois cachorros e duas ovelhas, querendo um pedacinho dos meus biscoitos. As ovelhas logo foram para outro lugar, mas os cachorros permaneceram ali e dividi com eles um pacote de biscoitos. Cachorros vi aos montes enquanto estive no Peru e quase todos eram magros, com cara de famintos. Se para os moradores da região a vida é dura, para os cachorros é mais ainda, pois eles não tem comida garantida todos os dias. Me lembrei dos cachorros de casa que tem três refeições ao dia e que se uma delas atrasa, eles reclamam latindo sem parar. Os cachorros que vi no Peru tem uma verdadeira vida de cão!

Continuamos nossa trilha e após uma hora paramos no local destinado ao almoço. Ao passar pelo cozinheiro vi o mesmo provando a sopa colocando a concha na boca e devolvendo o que sobrou direto na panela. Vi que nos próximos dias eu ia sofrer com a comida! No ano anterior eu tinha passado mal na Trilha Inca por culpa da comida. Além da higiene precária, o que me deixou mal do estômago foram os temperos que o pessoal utiliza no Peru e também a água com a qual fazem à comida, que é vinda direto da montanha. Dessa vez eu me precavi um pouco e levei bastante comida, principalmente biscoitos, frutas secas, leite condensado e chocolate. Se eu visse que a comida servida para o grupo fosse me fazer mal, eu recorreria a meu estoque próprio. O almoço foi servido e logicamente recusei a sopa. E achei melhor não contar para os demais membros do grupo o que tinha visto o cozinheiro fazer com relação à sopa, pois podia causar um mal estar geral. Depois da sopa veio o prato principal, que estava muito bom. Era arroz, com tiras de carne frita e alguns legumes. Até me surpreendi com o sabor da comida e pensei em perdoar o cozinheiro por seus hábitos não muito higiênicos no preparo da comida. Lembrei que era domingo e enquanto comia olhei para o Alex, o gaúcho que estava na minha frente e contei a ele que domingo era dia de churrasco em casa. Ele disse que na casa dele também era. Então comemos aquele rango peruano pensando no churrasco brasileiro. Depois da comida foi servido chá de coca, o qual recusei, pois no ano anterior o chá foi um dos causadores de problema ao meu frágil estômago. Vale lembrar que o chá de coca, bem como as folhas de coca, são consumidos na região há muitos séculos. Eles bebem o chá para combater o mal de altitude, o frio e também para ganhar mais força e disposição. O chá não faz mal, não é droga. A cocaína é feita tendo como base à mesma folha de coca consumida há séculos, mas o diferencial é que fazem uma mistura com produtos químicos, o que causa o vício. Então não confunda as coisas e ache que tomar chá de coca tem o mesmo efeito que cheirar cocaína. O único detalhe é que se você fizer um exame de sangue após consumir chá de coca, pode aparecer traços de cocaína no resultado. Ficou famoso o caso do ex-goleiro Zetti, que num jogo da seleção brasileira na Bolívia foi pego no exame antidoping por consumo de cocaína, quando na verdade tinha consumido chá de coca para amenizar os efeitos da altitude.

Após o almoço descansamos um pouco e quase que me machuco sem querer. Ao lado de uma cerca de arame tinha alguns troncos de madeira encostados no arame. Um dos israelenses encostou num destes troncos sem perceber que os mesmos não estavam fixos ao arame. O resultado foi que se criou um efeito dominó, derrubando uns quatro troncos e o último por apenas alguns centímetros não caiu sobre meu querido pé direito. O tronco era tão pesado que tentei erguer o mesmo e não consegui. Por muito pouco que minha trilha não acaba logo no primeiro dia! Fui escovar os dentes e o suiço veio perguntar se no Brasil é hábito escovar os dentes após todas as refeições. Respondi que sim e ele disse que na região onde ele mora o costume é escovar os dentes somente pela manhã e ántes de dormir.

Pouco antes das 15h00min seguimos com nossa caminhada, dessa vez seguindo por uma estrada poeirenta e sempre tendo a frente à montanha nevada que vimos pela primeira vez pouco antes do almoço. Em algumas partes do lado direito da estrada surgiu um enorme preciício. Começou a fazer bastante calor e caminhar e ficou um pouco desgastante caminhar. Caminhei alguns quilômetros com o suíço do grupo, que falava bem o espanhol por já ter morado um tempo no México. Ele é triatleta e trabalha numa empresa de informática na Suíça. Costuma passar em média quatro meses ao ano viajando pelo mundo a trabalho, tendo visitado dezenas de países. Conversar com ele foi muito interessante e enriquecedor.

Conforme o final da tarde foi chegando, começou a esfriar. E outro motivo do frio é que estávamos nos aproximando cada vez mais da montanha nevada e o vento que vinha dela era congelante. A estrada poeirenta se transformou numa estrada larga e cheia de pedras. Passamos por um riacho e alguns lugares muito bonitos. Quase no final da tarde chegamos ao local onde passaríamos a noite. Era uma grande barraca feita de lona azul, de chão batido e eternit como telhado. Dentro dessa grande barraca, algumas barracas para três pessoas estavam montadas e seria nelas que dormiríamos. Quando cheguei no acampamento vi que ao lado tinha outra montanha nevada, tão bonita quanto à montanha que “seguimos” a tarde toda.

Na separação das barracas, acabei dividindo uma com o suíço. Era bem mais cômodo ficar em dois do que em três numa barraca. Arrumei minhas coisas na barraca, coloquei no chão um isolante que tinha sido disponibilizado aos caminhantes e sobre ele estiquei meu saco de dormir. Me espantou o quão frio era o chão e vi que o isolante não era grosso o suficiente para isolar tamanho frio. Ou seja, eu passaria um pouco de frio a noite. Antes de escurecer resolvi ir tomar um banho de gato, pois banho é uma de minhas prioridades, seja onde for. Peguei uma pequena toalha e fui até um local onde duas torneiras despejavam uma água muito gelada. Lá encontrei meu companheiro de barraca, o suíço. Ele também estava se lavando na água fria e me senti aliviado por isso, pois no ano anterior na Trilha Inca dividi a barraca com um argentino porquinho que fedia a noite na barraca. Após me lavar como dava e passar a toalha molhada no corpo, fui até a barraca e passei pelo corpo alguns lenços umedecidos e perfumados que levará. Apesar de sentir muito frio após tal processo de limpeza, a sensação de banho tomado era muito boa.

Pouco depois das seis todos se reuniram na mesa montada ao lado das barracas para tomar café. Tinha pipoca e meu café foi somente pipoca. O guia, Daniel, veio conversar comigo e vi que ele sabia um bom repertório de palavrões brasileiros. Conversei um pouco com a Florencia e fui até a barraca dela passar pomada e fazer massagem no pescoço dela, pois ela sentia muitas dores provavelmente em razão do peso da mochila que tinha carregado o dia todo. Em trilhas e outras situações parecidas é comum um ajudar o outro no que for preciso e possível. Logo fomos jantar e não consegui comer. O cheiro da comida me deixou enjoado e comecei a me sentir mal do estômago, possivelmente por culpa do almoço. Eram 7h30min quando a maioria do pessoal foi se ajeitar nas barracas para dormir. Fazia muito frio e ainda tive coragem de ficar um tempo do lado de fora vendo o céu e as estrelas. Estava uma noite muito bonita, com o céu repleto de estrelas. E ao lado as montanhas nevadas deixavam a noite ainda mais bonita. Foi mais um daqueles momentos inesquecíveis, onde fotos ou gravações não conseguem captar a beleza do momento. Tal beleza é possível de se guardar na memória apenas. Comecei a sentir muito frio e fui para minha barraca. Me enchi de blusas e entrei no saco de dormir. Enquanto me aquecia olhei no relógio e vi que eram 9h30min no Brasil. Lembrei que estava passando o Fantástico e que em casa naquela hora o pessoal deveria estar terminando de jantar o que sobrou do tradicional churrasco do almoço de domingo. Também lembrei que era aniversário de minha amiga Andrea C. e fiz uma breve oração por ela. Mesmo sabendo que ela não é lá muito cristã, sei que Deus estaria abençoando a vida dela naquele momento, em mais um aniversário que ela completava. E assim adormeci…

Feira na pracinha.

Grupo reunido antes do início da trilha.

Caminhando pelo pequeno povoado.

Com Izabel, a curitibana do grupo.

Vista bonita.

Dando biscoito para os dogs.

Com Florencia, a francesinha que fala português.

O primeiro almoço na trilha.

A estrada percorrida a tarde.

Ao fundo a montanha nevada.

Tropa de mulas com parte de nossas coisas.

Paisagem bonita.

Pequena ponte no caminho.

Jantar no acampamento.

Trilha Inca (4º dia)

Acordamos ás 03h30 e ainda chovia e fazia um pouco de frio. Por ter ido dormir tarde senti muita dificuldade para levantar. Arrumei minhas coisas e fui me reunir ao pessoal dentro do bar. Enquanto todos tomavam café, preferi ficar sentado num canto cochilando. Depois teve a reunião de todas as manhãs explicando a programação das próximas horas. Em seguida começamos a descer a montanha, abandonando de vez a Trilha Inca. Seguimos num ritmo forte e felizmente a chuva logo parou. Íamos clareando a trilha com lanternas, pois a escuridão era total. Mais uma vez encontrei o “cão inca” que parou na minha frente e se deitou na trilha, bem onde eu ia passar. Após pouco mais de uma hora de caminhada e com o dia começando a clarear, chegamos à margem do Rio Urubamba. Aproveitamos para descansar e esperar o restante do pessoal do nosso grupo. Aproveitei para tirar o casaco e percebi que minha camiseta estava toda molhada de suor.

Ás 07h00min o grupo estava todo reunido e fomos até um posto de controle em frente a uma pequena ponte que atravessa o rio Urubamba. Tivemos que esperar um pouco até um funcionário abrir um portão que dá acesso a ponte. Atravessamos a pequena ponte que chacoalhava muito e logo estávamos nos trilhos do trem seguindo para Aguas Calientes. Não demorou muito e a chuva recomeçou. Pelo caminho vi pedras enormes que pareciam ter caído da montanha poucas horas antes. Mais tarde ficamos sabendo que na noite anterior tinha acontecido um pequeno tremor de terra na região. Caminhei um bom tempo sozinho e depois com meu amigo Diego. Conforme nos aproximávamos de Aguas Calientes a chuva aumentava. A estrada de ferro segue todo o tempo ao lado do rio. Passamos por algumas poucas casas e por uma represa. Pouco mais de uma hora de caminhada e chegamos a Aguas Calientes sob muita chuva. Paramos debaixo de uma marquise para descansar e esperar o restante do pessoal. Depois fomos até um restaurante cujo dono é argentino e ali deixamos nossas mochilas e fomos comprar ás passagens do ônibus que leva até Machu Picchu.

Antes de partir para a Trilha Inca, falei com meu irmão pela internet e ele me contou que estava indo para o Peru a trabalho. Então ele disse que tentaria ir para Machu Picchu no domingo e tentaria me encontrar por lá. Depois não tivemos mais contato e eu não sabia se ele tinha ido mesmo para o Peru. Quando estava na fila para comprar a passagem do ônibus, vejo meu irmão descendo tranquilamente pela rua ao lado. Fui em direção a ele rindo e ele tomou o maior susto ao me ver. Foi um encontro não programado, pois pelo plano original não era pra eu estar em Aguas Calientes naquela manhã. Foi um encontro muito legal, pois nada como encontrar alguém da família após os difíceis dias na Trilha Inca. Apresentei meu irmão a alguns amigos do grupo e a nossos guias. Ele foi bem recebido por todos e a partir dali acabou fazendo parte de nosso grupo e seguiria junto conosco para Machu Picchu. Ali terminava a aventura pela Trilha Inca e iniciaria uma nova aventura rumo a Machu Picchu. Missão cumprida! Essa era a sensação geral e mesmo não tendo percorrido a Trilha Inca por inteiro em razão do desmoronamento e do fechamento da trilha, todos estavam contentes e ansiosos para chegar logo a Machu Picchu que estava bem perto, na montanha pouco acima de onde estávamos.

De madrugada, com cara de sono.

Terminando de descer a montanha, ao clarear do dia.

Rio Urubamba.

Atravessando a pequena ponte sobre o rio Urubamba.

Caminhando ao lado dos trilhos.

Longa caminhada pelos trilhos do trem.

O trem trazendo turistas para Machu Picchu.

Caminhando entre os trilhos e o rio, sob muita chuva.

Chegando a Aguas Calientes.

Eu e Diego descansando sob uma marquise.

Eu e meu irmão em Aguas Calientes.

Trilha Inca (3º dia)

Mais uma vez acordamos ás 05h00mim e ainda estava escuro e chovendo. Dormi nove horas direto, algo que não acontecia fazia vários dias. O Diego acordou reclamando da chuva que tinha molhado a barraca e algumas coisas dele. Fui conferir meu lado da barraca e minhas coisas, mas estava tudo seco. Demos uma olhada geral na barraca e dava pra ver nitidamente que metade da barraca estava molhada e a outra metade não. O Diego ficou olhando aquilo com cara de quem não acreditava e eu fiquei rindo. Entendi que em nossa barraca, que entre nós existia um equilíbrio entre sorte e azar e que todo o azar ia para o lado do Diego e toda a sorte para o meu lado. Coisas da Trilha Inca!

Arrumei minhas coisas e fui sob chuva até o banheiro. O banheiro masculino tinha fila e o feminino estava vazio. Como estava apurado não pensei duas vezes e entrei no banheiro feminino. Logo escutei vozes femininas do lado de fora e me preparei para as reclamações quando fosse sair. E não deu outra, quando abri a porta me deparei com umas dez meninas que começaram a reclamar por eu estar usando o banheiro feminino. Respondi que ele estava vazio quando cheguei e saí rindo, o que deixou a mulherada ainda mais brava e ouvi xingamentos em pelo menos quatro idiomas diferentes.

Após o café os guias fizeram uma reunião e nos deram uma péssima notícia. O posto de controle do governo peruano que existe no acampamento onde estávamos, tinha sido informado via rádio que em razão da chuva das últimas horas ocorreram deslizamentos na parte final da Trilha Inca, que vai do último acampamento até a entrada de Machu Picchu. Então por razões de segurança a parte final da trilha foi fechada e ficaria assim até meados ou final de março. Em fevereiro a Trilha Inca é fechada para manutenção e por ser época de chuvas, então somente em fevereiro é que tentariam resolver o problema dos desmoronamentos. Foi uma frustração geral em todos de nosso grupo. Tínhamos sofrido tanto, íamos penar mais um dia caminhando pela trilha e perderíamos justamente a melhor parte que era chegar caminhando em Machu Picchu. A alternativa seria desviarmos nossa rota no final do último dia, pernoitar no alto da montanha e de madrugada descer a montanha. Atravessaríamos uma pequena ponte sobre o rio Urubamba e caminharíamos um bom tempo ao lado dos trilhos do trem até chegar à pequena cidade de Aguas Calientes. Lá pegaríamos um dos muitos ônibus que seguem até a entrada de Machu Picchu e que partem a cada 15 minutos. Tudo o que eu nunca desejei foi chegar a Machu Picchu de ônibus, mas não teria outra alternativa. Após assimilar o golpe e a decepção, passei a olhar a situação por outro lado. Eu sabia que janeiro é época de chuvas e aceitei o risco de ir para a Trilha Inca nessa época. Pegamos dois dias de sol na trilha, então não dava pra reclamar da sorte. E entendi o fato de não poder chegar até Machu Picchu caminhando, como um sinal de que devo voltar para o Peru outra vez e fazer a Salcantay, uma outra trilha que leva até Machu Picchu e que é mais longa e mais difícil de percorrer. Acho que estou começando a ficar místico e comecei a sentir certas coisas, receber sinais… sei lá! De qualquer forma eu não ia ficar abatido, pois percorreria 90% da Trilha Inca e isso era bem melhor do que nada.

Pouco antes da 07h00mim iniciamos a caminhada pela trilha. Não seria um dia tão difícil como o anterior, mas sob chuva as coisas complicavam um pouco. Sendo o terceiro dia o corpo estava mais adaptado com o ritmo da caminhada e com a altitude. A única coisa chata foi ter que usar capa de chuva, o que limita um pouco os movimentos e esquenta o corpo mais que o normal. Após uns minutos tirei o capuz da capa da chuva, pois com ele minha visão periférica ficava limitada e isso não estava me agradando. Preferi molhar a cabeça na chuva, era bem melhor. De cara já pegamos uma forte subida e com as pedras da trilha molhadas pela chuva, o cuidado para não cair tinha que ser dobrado e em alguns trechos em que caminhávamos ao lado do abismo esse cuidado era triplicado. Para mim sempre o início da caminhada é mais difícil, meu corpo demora para aquecer e pegar ritmo. Após não muito tempo de caminhada chegamos até uma antiga ruína inca chamada Runkuraqay. Estávamos a 3.800 metros e com muita chuva. A ruína ficava ao lado da trilha, mais ou menos na metade de uma montanha. De onde estávamos à vista era bonita, dava pra ver bem no fundo de um vale o acampamento onde tínhamos passado à noite. Ainda eram visíveis algumas barracas montadas, de outros grupos. Observando a geografia em volta, a impressão que dá é que somente pela trilha seria possível transpor as montanhas do lugar, cheia de precipícios e de encostas escarpadas. Runkuraqay foi construída em forma de circulo, dentro de um semicírculo e com apenas uma entrada. Acredita-se que foi construída para ser um posto de vigilância e também de parada para descanso ou de troca, para os mensageiros que seguiam a pé rumo Machu Picchu. Fizemos uma longa parada no local e os guias separaram o grupo para poderem contar mais tranquilamente à história (ou provável história) do lugar. Os incas foram gênios em sua época, mas não tinham uma escrita que possibilitasse que sua história chegasse até os dias de hoje. Então muito do que se fala sobre os incas são suposições e até mesmo os nomes dos locais são outros, já que não se sabe ao certo os verdadeiros nomes. Mesmo adorando historia e sendo formado em história, eu não conseguia ficar muito tempo parado ouvindo o que os guias contavam. Eu preferia andar pelo lugar, tirar fotos, tocar nas rochas, ficar imaginando quem passou por ali, como era aquele local há centenas de anos. Cada um tem um jeito de curtir lugares históricos, o meu jeito é esse.

A chuva parou um pouco, mas logo que reiniciamos a subida da montanha ela voltou forte. A trilha era difícil e fui apertando o passo e tomando cuidado para não cair. Com a chuva e a neblina nosso raio de visão ficou limitado a não mais que 400 metros. Então não era possível admirar a vista estupenda que poderíamos ter lá de cima. Esse problema se estendeu por quase todo o dia e sei que acabei deixando de ver muitas paisagens maravilhosas pelo caminho por culpa da chuva e da neblina quase constantes. Após pouco mais de uma hora de difícil subida chegamos ao alto da montanha, um local conhecido por Second Pass (Segundo Passo) e que fica a 3.900 metros de altitude. Nesse local também existiam rochas mais altas ao lado da trilha e em cima delas amontoados de pequenas pedras. Acabei encontrando quatro brasileiros; um casal de Belo Horizonte, uma garota de São Paulo e outra de Santos. Eles estavam num pequeno grupo, junto com alguns chilenos. Conversamos um pouco trocando experiências sobre os últimos dias. Não demorou muito e meu grupo partiu e eu junto. Dessa vez tinham algumas pequenas descidas intercaladas a pequenas subidas. Logo no início passamos por um local onde existia dois lagos muito bonitos logo abaixo da trilha, mas a neblina não permitiu bater boas fotos dos lagos. Depois de uma hora e meia de caminhada chegamos à outra ruína inca. Deixamos nossas mochilas num canto da trilha e um guia ficou tomando conta delas.

Subimos por uma escadaria estreita que foi construída de forma estratégica no bico de uma montanha e entramos em Sayaqmarka, uma enorme ruína e a que mais gostei de todas que visitei. O nome do local no idioma quéchua significa “Cidade Inacessível”. As ruínas são enormes e muito bem preservadas e estão em vários níveis ligados por escadas. Existem inúmeros aposentos, canais e pátios. Segundo nosso guia contou, o lugar foi um pequeno centro religioso para aldeias periféricas. Logo que chegamos ao lugar a chuva e a neblina foram embora e o sol surgiu forte. Mais uma vez o grupo foi dividido pelos guias para as devidas explicações sobre o lugar. Depois tivemos meia hora para explorar o local. Preferi caminhar sozinho, observando os detalhes e acabei indo parar num pátio externo onde existia um muro bem ao lado do abismo. Tirei fotos e continuei explorando o lugar. Bem mais abaixo em frente da montanha onde estava visualizei outra construção inca de menor tamanho e vi que a trilha passava bem ao lado. Logo o tempo fechou novamente e começou a chover. Descemos de volta para a trilha e seguimos nosso caminho mais uma vez debaixo de chuva. Quando passei pela construção inca que tinha visto lá do alto em Sayaqmarka, chovia tanto que nem tive vontade de parar. 

Continuei caminhando e logo cheguei ao local do almoço. Nossos porteadores já tinham chegado ao lugar muito antes e montado a barraca da cozinha e a barraca para o almoço. Ao lado de onde foram montadas as barracas existia uma construção com banheiros masculino e feminino e cuja higiene também não era boa. A chuva aumentou e deixamos as mochilas do lado de fora, uma sobre as outras debaixo de uma pequena lona. Tivemos que nos espremer dentro da barraca das refeições, pois chovia muito e não dava pra deixar as entradas abertas como sempre fazíamos e que era algo que deixava a barraca mais espaçosa. Comi três coisas no almoço que até agora não tenho a mínima idéia do que eram. Tinha um negócio que a princípio pensei ser um bolinho e que ao morder descobri ser uma mistura de batata com mandioca, de sabor estranho. Após o almoço não nos demoramos muito e fomos nos preparar para seguir a caminhada. O sol apareceu novamente, ardido e forte. Mas não durou nem 5 minutos e voltou a chover. Estávamos entrando numa região de floresta tropical e o clima ficou ainda mais estranho.

O trecho que fizemos à tarde é considerado o mais bonito da Trilha Inca, mas não deu para ver muita coisa pois a chuva e a neblina nos acompanharam durante toda a tarde. O sol deu as caras raríssimas vezes e por poucos minutos somente. Já a neblina não foi embora nem mesmo quando o sol aparecia. Foi uma caminhada relativamente tranqüila, principalmente se comparada a dificuldade do dia anterior. A trilha em sua maior parte seguia por um terreno mais plano e praticamente todo o percurso seguia pelo topo de uma cadeia de montanhas. A vegetação ia ficando cada vez mais densa e bonita. Passamos por um túnel inca feito no meio da rocha, ao lado de um precipício. Era uma obra de engenharia impressionante, principalmente se levarmos em consideração a época em que foi construído e as ferramentas que os incas possuíam. Pouco após deixar o túnel passei por uma situação complicada. Comecei a sentir fortes dores na barriga e uma vontade imediata de ir ao banheiro. Mas estávamos numa trilha estreita onde do lado direito existia um paredão de rocha de centenas de metros de altura e do lado esquerdo um precipício sem fim. A frente e atrás caminhavam várias pessoas, muitas sendo mulheres. Então onde é que eu ia resolver meu problema? Onde achar um banheiro ou uma moita num lugar daqueles? Fiquei muito preocupado, me segurei o que pude e já estava começando a ficar desesperado. E para piorar a chuva aumentando. Caminhei uns 15 minutos na maior tortura e tentando encontrar uma saída para tal situação, até que finalmente numa curva da trilha avistei uma pedra enorme e atrás dela um pequeno carreiro. Fui investigar o lugar e pelas marcas vi que alguém já tinha usado tal lugar pelas mesmas razões que eu. Não pensei duas vezes e entrei no carreiro. Quando dei o segundo passo escorreguei no capim molhado e no barro e saí deslizando morro abaixo. Consegui parar uns três metros depois, me segurando em alguns galhos e no capim alto. Quando olhei e vi que mais um metro para baixo de onde estava era o precipício, gelei! Mas na situação em que estava não dava pra gelar por muito tempo, pois tinha algo mais imediato para fazer. Analisei a situação e rapidamente decidi como resolver meu problema. Prefiro não entrar em detalhes para preservar a mim e a você caro leitor. Sei que devo ter feito o “serviço” numa das posições mais estranhas da história. E qualquer descuido eu ia parar morro abaixo. A situação era pra chorar, mas eu morria de rir e lembrei de meu irmão que adora parar em moitas na beira da estrada. Depois da emergência resolvida tive que pensar em como sair dali sem correr o risco de escorregar e ir parar no abismo. Lembrei de uma queda que tive ao descer o Pico do Marumbi uns anos antes e que foi bem parecida com essa. Então usei da mesma estratégia da outra vez para rastejar morro acima e com cuidado consegui chegar de volta a trilha. Eu estava com lama da cabeça aos pés, mas ao menos tinha resolvido o problema emergencial. Voltei a caminhar e só então me dei conta do risco que corri. Mais um metro deslizando e eu teria caído num precipício enorme e como ninguém tinha me visto entrar ali, se eu tivesse caído morro abaixo nunca iam saber onde fui parar, como desapareci. Ninguém mais ia saber de mim, nem mesmo minha família. Eu seria declarado desaparecido nas montanhas peruanas. Faltou muito pouco para isso acontecer, na verdade faltou um metro. Achei melhor não pensar mais nisso e seguir em frente, agora literalmente aliviado. Logo encontrei ao lado da trilha uma pequena mina de água e aproveitei para me lavar e tirar parte do barro das botas, da mochila e da roupa.

No meio da tarde paramos em mais uma ruína inca, Phuyupatamarca. Essa ruína fica a 3.680 metros de altitude e segundo nosso guia ela servia ao culto e à morada de nobres e sacerdotes. Pela redondeza existiam também alguns núcleos religiosos de vilas campesinas, mas que por serem construídas com tijolos de adobe, se desmancharam pela ação do tempo. Em Phuyupatamarca foram catalogados três praças, seis banhos litúrgicos, canais de água, quinze quartos e um observatório. Mais uma vez nossos guias contaram a história do local e depois liberaram o grupo para que cada um seguisse no seu ritmo. Também informaram onde deveríamos sair da trilha e seguir rumo ao último acampamento, que seria ao lado de um tipo de bar, onde existia banho quente, cerveja e Coca-Cola. A chuva voltou mais uma vez e a neblina desceu de vez. Percebi que não daria pra ver muita coisa pelo caminho e nem tirar boas fotos, então resolvi seguir num ritmo forte pois a idéia de um banho quente e de uma Coca-Cola gelada era muito atraentes para mim naquela altura dos acontecimentos.  O trecho era quase todo de descida e partes planas, com raras subidas. Então fui caminhando forte, o último grande teste para saber se minhas hérnias de disco estavam curadas. Pelo caminho fui passando por integrantes de meu grupo e do outro grupo co-irmão. Fiquei sentido pelo tempo estar ruim, pois sabia que estava perdendo paisagens lindas. Segui por cerca de uma hora e meia num ritmo forte e constante, parando poucas vezes para beber água e bater uma ou outra foto da trilha. Logo alcancei dois argentinos que sempre caminhavam na frente e o meu colega inglês do outro grupo. Então passamos a caminhar os quatro juntos e num ritmo ainda mais forte. Pouco depois chegamos a uma bifurcação na trilha, num local onde existe uma torre metálica de energia elétrica. Ali o guia tinha avisado que era para seguir pela trilha da direita e chegaríamos ao nosso acampamento. Seguindo a esquerda entraríamos no trecho bloqueado da Trilha Inca, que leva até as ruínas de Intipata e depois a Machu Picchu. Bem que deu vontade de seguir pela esquerda!

Alguns metros após caminhar pela trilha da direita, surgiu a nossa frente uma vista de tirar o fôlego. Várias montanhas com os topos cercados por nuvens e abaixo delas no fundo de um vale corria o rio Urubamba. Parei uns instantes para admirar tal vista e voltei a caminhar, agora por uma descida íngreme e que seria a última do dia. Não demorou muito e ultrapassei um dos argentinos e logo encostei no outro. Ele não queria ficar pra trás e forçou tanto para se manter a minha frente que logo parou, com dor no joelho. Cheguei no acampamento junto com o inglês do outro grupo e fui o terceiro de meu grupo a chegar. Na minha frente chegaram dois argentinos, os mesmo que tinham sido os primeiros a chegar no dia anterior. Nossas barracas estavam armadas uma ao lado da outra na encosta do morro e logo em frente a elas tinha um enorme barranco. Se o cara não tomasse cuidado ao sair da barraca, corria o risco de ir parar morro abaixo. Em frente a mesma maravilhosa vista que eu tinha visto um pouco mais acima. Escolhi uma barraca, deixei minhas coisas e fui procurar o tal banho quente. No local ao lado do acampamento existe o Wiñaywayna Visitors Center, uma construção grande de alvenaria onde funciona uma lanchonete e existem mesas enormes. O que me chamou a atenção foram algumas placas avisando que aquela construção era segura em caso de terremotos. Ali também tem banheiros limpos, com chuveiro quente ao custo de cinco soles. Acabei sendo o primeiro a tomar banho e foi uma delícia após três dias de trilha poder tomar um banho de verdade. Depois do banho fui na lanchonete comprar uma Coca-Cola, que para minha decepção não é gelada. Aproveitei para repor meu estoque de chocolates e então fui para a barraca descansar. A chuva ficou mais forte e depois de uma hora o Diego chegou, mais uma vez sem mochila. Falei a ele sobre o banho quente mas ele não quis saber. E não foi por falta de dinheiro que ele não quis tomar banho, mas sim por não querer tomar banho. Então como último recurso ofereci a ele meus últimos lenços umedecidos e ele aceitou. Era melhor que meu companheiro de barraca tomasse um banho de gato do que nenhum banho.

Após descansar um pouco fui no centro de visitantes. Lá fiquei conversando com o pessoal e depois me sentei do lado de fora, ao lado de uma espécie de mirante e fiquei olhando a vista dali. Era demais, algo muito bonito e uma paisagem que mudava a todo instante por culpa da mudança e da quantidade de nuvens e até de alguns raios de sol. Algo pra se lembrar para sempre. Foi nesse momento que tive o primeiro contato com o “cão inca”, história que contarei numa postagem especifica daqui uns dias. Logo serviram nosso café da tarde dentro do enorme refeitório e depois conversei mais um pouco e tirei fotos. Quando anoiteceu serviram o jantar, mas não comi nada. Os guias vieram perguntar o motivo de eu não querer comer e após contar sobre minha dor de barriga, me mandaram comer um pouquinho de macarrão, que logo depois me levariam um chá especial que curaria meu problema. Comi um pouco da macarronada que estava horrível e quando me entregaram uma caneca de chá tive que ser muito corajoso para beber. A cor e o cheiro não eram nada atrativos e o sabor muito menos. Achei melhor não perguntar do que era o tal chá, mas o resultado foi bom e quase imediato.

Em seguida ao jantar todos fomos para o mirante do lado de fora, onde ocorreu a despedida dos porteadores. Todos do grupo se apresentaram aos porteadores e eles a nós, falando suas idades, estado civil e quantidade de filhos. Fiquei impressionado quando soube a idade de alguns. Tinha um de 40 que da pra dizer que é meu pai e outro de 21 que aparenta ter a minha idade. Todos levam uma vida sofrida e a idade pra eles pesa mais do que pra nós. Fizemos uma vaquinha que é tradicional na trilha e o que foi arrecado foi dado de presente aos porteadores. E não é que um dos porteadores vestia uma camisa do Palmeiras! Eu corinthiano que sou nem dei muita bola pra ele. Já para um outro porteador que vestia uma camisa da seleção brasileira, fiz questão de dar um abraço e tirar uma foto com ele. Pena que as fotos desse evento não ficaram boas, pois estávamos no meio da neblina.

Acabei encontrando os quatro brasileiros com quem conversei pela manhã na trilha. Reunimos-nos numa mesa e ficamos um bom tempo conversando e bebendo Cuzqueña e Coca-Cola. Aquele local parecia uns daqueles bares de fim de mundo que vemos nos filmes. E foi interessante numa noite de sábado quatro brasileiros se reunirem ao redor de uma mesa para falar da vida, após terem percorrido quase 40 quilômetros de umas das trilhas mais famosas, bonitas e difíceis do mundo. O clima era de missão cumprida. Eram quase onze horas quando resolveram fechar o bar e tive que ir para a barraca. Chovia muito forte e dei carona a minha amiga Carolina até a porta de sua barraca. A carona consistia de iluminar o caminho com minha lanterna. Andar sem lanterna na escuridão do lugar, com chuva e com barrancos, era quase um suicídio. Entrei na barraca, dei boa noite para o Diego e fiquei pensando que o dia seguinte seria o grande dia, o dia de conhecer Machu Picchu e realizar um sonho de quase trinta anos. Dormi ouvindo o barulho da chuva batendo na lona da barraca a poucos centímetros do meu rosto.

Eu e Diego e eu com o casal Juan e Cecília, no amanhecer do 3º dia.

Caminhando sob chuva e com o guia Juan Carlos.

Nas ruínas de Runkuraqay.

Ao fundo as ruínas de Runkuraqay.

Na trilha; com os brasileiros e Roxana; com Carolina; um dos lagos.

Nas ruínas de Sayaqmarka.

Em Sayaqmarka.

Em Sayaqmarka.

Sayaqmarka.

Construção inca que é vista do alto de Sayaqmarka.

Phuyupatamarca.

Em Phuyupatamarca e em trechos da trilha.

Parte final da Trilha Inca no terceiro dia.

No acampamento da última noite.

Parte da vista que se vê do mirante do Wiñaywayna Visitors Center.

Quatro brasileiros conversando num bar no meio da floresta peruana.

Trilha Inca (2º dia)

Acordamos ás 05h00min, fazia muito frio e o tempo estava bem nublado. Arrumei minhas coisas, guardei tudo na mochila e fui escovar os dentes e usar o banheiro. Estávamos usando o banheiro de uma moradora local e a higiene do mesmo não era das melhores. Tudo bem, no meio do mato não dava pra esperar grande coisa. O mais chato era ficar na fila do banheiro. Nessa manhã fiquei atrás de cinco argentinas, todas descabeladas, com cara de sono e com um rolo de papel higiênico na mão. Era uma cena engraçada, que achei melhor não fotografar, pois elas podiam não gostar. Após utilizar o banheiro fui direto para a barraca das refeições. Não costumo tomar café da manhã, pois não sinto fome antes do meio dia, mas como seria o dia mais puxado na trilha achei melhor comer um pouco. O cardápio foi bom, com direito a um tipo de pão tostado e panquecas. Pra beber café, leite solúvel e chá de coca. Optei pelo chá de coca que no caso era de saquinhos, igual ao chá mate que compramos no supermercado. Descobri outra forma de fazer o chá de coca, que é através de infusão, ou seja, colocar folhas de coca na água quente. Acabei inventado uma nova maneira de fazer o meu chá, colocava um saquinho de chá no caneco com água quente e adicionava algumas folhas de coca também. Ficava bem forte, mas dava pra beber. Junto com o chá de coca tomei uma Sorojchi Pills, para o mal de altitude, um relaxante muscular para aliviar possíveis dores e um Centrun, complexo de vitaminas. Ou seja, estava “turbinado” e pronto pra encarar a difícil subida do vale.

Pouco antes das 07h00min os guias reuniram o grupo, deram alguns avisos e começamos a caminhada. Fazia frio e optei por utilizar somente um casaco leve, pois conforme fosse caminhando sabia que sentiria calor. Passamos pelas últimas casas existentes na trilha, onde alguns moradores vendem água, Gatorade e refrigerantes. Algumas pessoas do meu grupo aproveitaram para comprar água e pagaram um preço absurdo, mas justificável, pois dá o maior trabalho levar mercadorias até aquele local e o transporte é feito nas costas ou em lombo de mula. Eu tinha levado um bom estoque de água, para dois dias e um Gatorade para ser usado nesse trecho da trilha. Para o último dia tinha levado uma cartela de pastilhas antibactericida, para colocar na água que encontrasse pelo caminho, fosse em bicas ou rios. O bom da história era que conforme eu caminhava e consumia minha água, o peso da mochila ia diminuindo. Pelos meus cálculos eu chegaria no alto do vale com uns dois quilos a menos de peso nas costas, que seria o peso da água que eu consumiria para percorrer o trecho mais difícil. O trecho era todo de subida e até o corpo aquecer por completo fica complicado caminhar, sem contar que o ar ia ficando cada vez mais rarefeito. Fizemos algumas curtas paradas pelo caminho e numa delas um cachorro enorme e com cara de poucos amigos veio em minha direção quando eu estava sentado numa pedra e colocou a cabeça na minha coxa, pedindo carinho. Primeiro levei um susto, mas logo estava acariciando a cabeça do cachorro.

Continuamos nossa caminhada, sempre subindo. Então fizemos uma parada num posto de controle do governo, onde os guias reuniram todos do nosso grupo e deram mais avisos. A partir dali não precisávamos mais seguir em grupo, cada um poderia seguir no seu ritmo. Informaram que teríamos que parar num local chamado Paqaymayu, onde estariam montados os acampamentos de todas as equipes que estavam na trilha naquele dia. Conforme fôssemos chegando no local deveríamos procurar nosso acampamento, que era o de número nove. Outro aviso do guia foi que ao chegarmos no alto da passo (First Pass) a 4.215 metros, o ponto mais alto da Trilha Inca, não deveríamos ficar mais de 15 minutos lá, pois começaríamos a sentir fortes dores de cabeça em razão da escassez de ar. Ao passar por mim o guia olhou nos meus olhos e disse que somente os fortes chegariam ao alto do passo naquele dia. Quando voltamos a caminhar resolvi seguir sozinho e no ritmo que aguentasse, queria me testar e ver até onde suportaria. Não foi nada fácil, mas conforme ia caminhando e o corpo aquecendo eu me sentia mais disposto a caminhar. Pelo caminho ia ultrapassando pessoas de outros grupos que estavam na trilha e que eu ainda não tinha visto. Eram muitos estrangeiros, se falava muitos idiomas numa verdadeira Babel. Logo comecei a andar junto com dois argentinos do meu grupo e conversamos um pouco. E quando souberam que eu tinha 40 anos e duas hérnias de disco, ficaram impressionados com minha disposição em caminhar. Pelo caminho existiam alguns pontos de parada para descanso e quando passava por esses locais via muita gente deitada, descansando. Então percebi que meu grupo tinha pernoitado num dos últimos acampamentos da trilha e que também tinha sido um dos últimos a iniciar a caminhada naquela manhã. Evitei fazer paradas longas e principalmente me sentar. Fiz uma única parada de dez minutos, onde aproveitei para tirar a mochila das costas e me sentar por alguns instantes. Logo voltei a caminhar e a trilha ia ficando cada vez mais inclinada e dessa vez era toda calçada em pedras e com muitos degraus. O que me ajudou bastante foi o bastão que estava levando, pois além de dar melhor equilíbrio, na hora de subir os degraus ele funcionava como uma terceira perna e preservava um pouco os joelhos, que estavam sendo muito exigidos nesse trecho da trilha. Logo chegamos numa região de mata fechada e a trilha ia fazendo círculos. Ali parei de andar com os argentinos e fiz uma pequena parada. Sentia-me muito tonto e com falta de ar, a vista ficou turva e achei que fosse desmaiar. Nesse momento baixei a cabeça e fiz uma oração, não queria de maneira alguma desistir, queria chegar até o fim, precisava chegar até o fim. Respirei fundo, reuni todas minhas forças e logo me senti melhor para continuar caminhando.

Saímos da região de floresta fechada onde estávamos e chegamos a um local aberto. A trilha seguia pela esquerda, circundando uma montanha enorme. Do lado direito um vale aparecia bem lá embaixo e vi uma pequena casinha coberta de palha e ao lado um pasto com Lhamas pastando. Foi interessante vislumbrar tal cena, pois nunca tinha visto Lhamas pastando. Atrás era possível ver as mesmas montanhas que víamos desde o início da trilha. Mesmo elas ficando cada vez mais distantes conforme caminhávamos parecia que ficavam maiores. É que íamos subindo e dessa forma elas ficavam mais visíveis e pareciam ser maiores. Sei lá, acho que é esse o motivo ou então eu estava muito tonto e vendo coisas… rs. Olhar para cima era desanimador, pois não dava pra ver o final da montanha, o ponto mais alto da trilha. Reuni minhas forças e continuei subindo. Por mim passaram muitos porteadores carregados de coisas e vi muitos outros parados, sentados ao lado da trilha. Ali dava pra ver mais claramente a quantidade de pessoas que estavam na trilha naquele dia e o grande número de porteadores dos vários grupos. Eu sabia que no máximo podem entrar na Trilha Inca 500 pessoas por dia, quantidade que é muito bem controlada pelo governo peruano visando a segurança de todos e também a preservação da trilha. O sol começou a castigar e minha camisa estava empapada de suor. Abri meu Gatorade, bebi a metade e segui em frente. Fazia breves paradas de não mais que um minuto e continuava a andar. O ar cada vez faltava mais e dar um novo passo era um esforço tremendo. Se eu que estava bem preparado fisicamente estava sentindo tanta dificuldade para subir em direção ao passo, fiquei imaginando meus amigos do grupo. Será que alguém iria desistir? A mochila parecia ficar cada vez mais pesada, mas em nenhum momento a tirei das costas. As tiras começaram a doer no ombro e preferi deixar como estavam, pois sabia por experiência que após um tempo o ombro fica adormecido e não se sente mais dor, então era melhor não tirar a mochila. Não sei precisar quanto tempo levei para subir esse trecho rumo ao passo, que é o mais difícil da Trilha Inca. Estava com relógio, mas a mente ficava meio atrapalhada e não consigo me lembrar quanto tempo levei caminhando nesse trecho. Fiz algumas paradas rápidas para tirar fotos e numa delas uma alemã que passava por mim pediu para tirar uma foto dela e depois ela tirou uma foto minha. Uns minutos depois ultrapassei essa alemã, que estava sentada na beira da trilha e pelo visto não sairia dali tão cedo. Sei que em certo momento olhei pra cima e consegui visualizar o alto do passo e vi algumas pessoas sentadas lá em cima. Essa visão me deu uma força extra e segui ainda com mais vontade de chegar. Parecia que eu ia conseguir chegar até lá em cima e venceria o maior desafio da Trilha Inca, algo que em alguns momentos cheguei a duvidar de que seria capaz de conseguir.

Quando pisei no alto do First Pass, me invadiu uma sensação que não é possível descrever, uma sensação de missão cumprida, de superação. Deixei minha mochila no chão e fui até a borda da montanha e fiquei olhando a paisagem. A beleza era grande, uma das cenas mais belas que vi na vida. Dali também dava pra ter uma visão ampla da Trilha Inca morro abaixo, o trecho por onde eu tinha passado. Dava pra ver dezenas de pessoas subindo aquele trecho, alguns perto do fim e muitos lá embaixo, a mais de uma hora de caminhada de onde eu estava. O sol e o calor que me torturaram na última hora desapareceram e uma nevoa tomou conta do lugar, a temperatura baixou muitos graus em poucos minutos. Vi um pouco acima um marco de madeira e fui até lá tirar fotos. No marco estava escrito a altitude de 4.215 metros, o ponto mais alto da Trilha Inca e também a altitude mais alta onde já cheguei com minhas próprias pernas. Um pouco mais acima visualizei uma pedra enorme. Resolvi subir nessa pedra, um último esforço para atingir o lugar mais alto do First Pass. Lá em cima encontrei centenas de pequenas pedras amontoadas umas sobre as outras. Entendi que ali deveria deixar uma das pedras que trazia no bolso e para a qual tinha contado todos meus dramas, meus problemas, meus sonhos. Esse tipo de amontoado de pedras é uma antiga tradição inca. Os incas costumavam fazer isso em lugares altos ao lado do caminho por onde passavam e acreditavam que quando deixavam folhas de coca mastigadas sobre esses pequenos amontoados de pedra, também deixavam ali o cansaço do caminho e outros males. Segurei firme uma das pedras que tirei do bolso, fiz uma oração e coloquei a pedra em cima de um dos muitos amontoados de pedras ao meu redor. Acreditei de coração no que pedi e no que estava fazendo. O resultado… só o tempo dirá! Fiquei mais algum tempo em cima da rocha olhando para baixo, vendo ás pessoas que chegavam ao alto do passo. Vi alguns conhecidos chegando e fiquei feliz por eles. Então resolvi gravar na máquina fotográfica uma mensagem que acabou se transformando num desabafo. Lembrei de tudo que passei no último ano, de todas as dificuldades, das dores, do sofrimentos. Lembrei da família, dos amigos, de todos que me ajudaram e me deram forças para me curar e estar naquele momento ali, no alto do passo. Lembrei também daqueles que pisaram em mim, me magoaram, me fizeram mal. Na verdade mais do que a força dos amigos, a força que me levou até ali foi o mal que os outros me fizeram. Canalizei tudo o que me fizeram de mal, todas minhas dores e transformei isso em combustível pra me levar até ali. Agora me sinto curado, me sinto bem, me sinto feliz e mais forte do que nunca. Algo aconteceu comigo no alto daquela pedra, não sei explicar ao certo, mas tenho certeza de que lá em cima deixei muitos sentimentos ruins, muita mágoa e muitas pessoas que me fizeram mal nos últimos meses. Posso afirmar que desci daquela rocha mais leve de espírito e livre do passado.

Fiquei meia hora no alto do passo tirando fotos, descansando e conversando com algumas pessoas que chegavam. Tinha um inglês do outro grupo que veio conosco, com quem conversei um pouco em inglês. Logo comecei a sentir uma dor estranha na cabeça como se ela estivesse sendo apertada por duas mãos. Então lembrei do que o guia falou sobre não ficar muito tempo lá em cima. Peguei minhas coisas e comecei a descer o First Pass pelo outro lado da montanha. A descida não tinha fim e logo descobri que descer era pior do que subir. Parte do preparo muscular que fiz para enfrentar a Trilha Inca foi visando subidas. Em nenhum momento me preparei para descidas. A maioria dos músculos das pernas que utilizamos pra subir são diferentes do que utilizamos para descer. Loco comecei a sentir fortes dores na parte da frente das coxas. Acredito que eu devia ser um dos poucos na trilha que estava infeliz com a descida. Eu preferia era subir mais e não descer. Outra dificuldade na descida é o peso da mochila nas costas, que te empurra pra baixo. Se não tomar cuidado você acaba caindo, podendo se machucar e dar adeus a trilha. Nessa hora o bastão ajudou ainda mais do que na subida. Ele servia como ponto de equilíbrio e logo eu estava conseguindo descer rápido sem o risco de cair. As dores nas coxas fui suportando. Após meia hora de descida o sol reapareceu e voltei a sentir muito calor. Fiz uma breve parada num local muito bonito, onde tirei o casaco, bebi bastante água e resolvi colocar na cabeça minha bandana com a bandeira do Brasil. Sendo o único brasileiro do meu grupo eu tinha que marcar isso de alguma forma. Continuei descendo a trilha que era toda de pedras, com centenas, milhares de degraus. Voltei a lembrar de tudo o que tinha passado recentemente, de meus problemas físicos e ás vezes não conseguia acreditar que estava ali realizando tal proeza de percorrer a lendária Trilha Inca. Comecei a ficar arrepiado e não demorou para eu chorar feito criança. Isso me fez bem, parece que eliminei de vez tudo o que ainda me incomodava. Coisas da Trilha Inca! Como eu disse em outra postagem, muitas pessoas que passam por esse lugar acabam tendo revelações, acabam se encontrando na vida. A Trilha Inca é meio mágica, mística, difícil de explicar. Para entender vá até lá e tire suas próprias conclusões.

Eu ainda tinha lágrimas escorrendo pelo rosto quando uma moça ao passar por mim perguntou se eu era brasileiro. Eu estava tão acostumado a ouvir e falar somente espanhol nos últimos dias que respondi a ela que sim, em espanhol. Ela era brasileira, do litoral de São Paulo e seu nome era Marceli. Era a primeira pessoa do Brasil que eu encontrava na Trilha Inca e fiquei feliz com tal encontro. Disfarcei para enxugar ás lagrimas que restavam em meu rosto e iniciamos uma gostosa e animada conversa. O papo estava tão bom que nem senti mais a dificuldade da meia hora final de trilha até chegar ao acampamento. Na entrada do acampamento, que era enorme, com as diversas equipes espalhadas pelo lugar, tiramos uma foto, nos despedimos e nunca mais nos vimos. Logo encontrei meu acampamento, que era um dos últimos morro abaixo. Eram quase 14h00mim e descobri que tinha sido o sexto a chegar no acampamento e que a caminhada daquele dia estava encerrada, que passaríamos a tarde e a noite ali. Eu achava que teríamos que caminhar mais naquele dia e fiquei extremamente feliz com a notícia. Escolhi uma barraca vazia, arrumei minhas coisas e tomei meu banho de gato. Em comemoração por ter superado o pior trecho da trilha, troquei toda a roupa. Dessa vez coloquei camisa, calça, cueca e meias limpas. Voltou a fazer calor e então tirei as pernas da calça, que virou uma bermuda. Por último troquei a bota pelo velho e confortável chinelo Havaianas. Fiquei deitado por cerca de uma hora descansando, quando então vieram me chamar para o almoço. A maior parte de nosso grupo já tinha chegado. Na barraca do almoço senti falta de minhas amigas Carolina, Roxana e do Diego, meu parceiro de barraca. O almoço foi arroz, frango e legumes. Com a fome que estava a comida desceu muito bem. Então se iniciou na barraca uma conversa sobre as posições que cada um tinha chegado ao acampamento. Eu chegar em sexto acabou sendo considerado um grande feito, ainda mais porque no dia anterior eu sempre era um dos últimos na triha. É que ninguém sabia que eu estava me poupando. E confesso que também fiquei surpreso em ser um dos primeiros a chegar. E olha que demorei mais do que a maioria parado no alto do passo. Sei que daquele momento em diante passei a ser mais respeitado por todos e não me chamaram mais de brasileiro. Passaram a me chamar de Vander. Nos dias seguintes até pessoas com quem eu não havia conversando ainda, me chamavam pelo nome. Naquela tarde algumas pessoas vieram me perguntar se eu tinha feito algum treinamento especial para percorrer a trilha. Outros vieram perguntar se eu tinha mesmo 40 anos, ou então se era verdade que eu tinha duas hérnias de disco. Isso foi algo interessante e me mostrou que a idade não está no RG, mas sim na mente. Posso ser um quarentão, mas de mente e de espírito ainda sou muito jovem e muitas aventuras mais virão pela frente.

O tempo mudou novamente, voltou a esfriar e fui para a barraca. Tentei dormir, mas não consegui, possivelmente em razão do chá e das folhas de coca que tinha consumido pela manhã. Então fiquei deitado descansando e pensando na vida. Aproveitei para examinar meus pés detalhadamente. Tenho as unhas dos dedões dos pés pretas, em razão de terem sido machucadas em caminhadas passadas. Para que esse problema não se agravasse na Trilha Inca, resolvi utilizar uma técnica que desenvolvi e que usei na última caminhada que fiz em dezembro, em Rosário do Ivaí. Coloquei algodão nos dedões e nos calcanhares, local onde sempre saem bolhas. E por cima do algodão enchi de micropóro. O resultado foi bom, pois não piorei o estado dos meus dedos e não ganhei nenhuma bolha em toda a Trilha Inca. Fazia quase duas horas e meia que eu tinha chegado, quando apareceu o Diego meu parceiro de barraca. Ele estava com uma cara de cansado e contou que na metade do caminho pagou para um porteador levar sua mochila. Esse estratagema é muito utilizado na trilha, o pessoal paga para alguém levar suas coisas. Depois chegam em suas casas contando aos amigos que percorreram a Trilha Inca, que são fodões, mas omitem essa questão da mochila ter sido carregada por outro. Para mim não importa o que os outros fazem ou deixam de fazer na trilha, o que importa é que carreguei minhas coisas o tempo todo. E não fui fazer a Trilha Inca para mostrar ou provar algo para alguém. Fui fazer a Trilha Inca porque eu queria, porque esse tipo de aventura me atraí e também porque eu precisava mostrar para mim mesmo que eu estava curado dos muitos problemas que tive em 2010, principalmente os físicos.

Meu agora amigo Diego pediu emprestado meus lencinhos umidecidos para se limpar. Cedi os lenços a ele de bom grado. Ao menos nessa noite nossa barraca ficaria mais cheirosa e agradável. Ficar a toa na barraca estava sendo chato e resolvi dar uma saída. O tempo fechou de vez, ventava e fazia frio. Andei pelo acampamento, tirei algumas fotos, mas não encontrei ninguém para conversar. Estavam quase todos dentro de suas barracas descansando e fugindo do frio. Ao lado do acampamento corria um rio de águas cristalinas e fui até lá renovar meu estoque de água. Utilizei as pílulas antibacteria para garantir água pura. Depois fiquei na barraca de refeições com alguns argentinos que jogavam baralho. Eles também jogam “truco”, igual no Brasil. Como não gosto e não sei jogar “truco”, fiquei apenas os observando e papeando. No final da tarde o tempo fechou de vez e começou a garoar. Nós estávamos no fundo de um vale, com montanhas por todo lado, um lugar muito bonito. Ao redor muitas nuvens e neblina. Ás 17h00 teve café, onde serviram uns bolinhos muito bons.

Descobri que existiam dois banheiros no acampamento, um mais acima e outro abaixo de onde foram montadas nossas barracas. O de baixo era mais próximo e quando escureceu se tornou uma aventura ir até o banheiro. Era escuro a beça, precisava levar lanterna e para chegar até ele precisávamos atravessar uma pequena ponte de madeira. A chuva começou forte e não parou mais, choveu a noite toda. Ás 19h00min teve janta, a comida estranha de sempre que não era ruim, mas também não era boa. Depois da janta serviram outros tipos de chá e não o de coca. Acho que queriam que o pessoal dormisse. Tomei um chá de aniz, de gosto duvidoso. Logo fui para a barraca e quando eram quase 20h00min me deitei. O chá de aniz somado ao esforço físico do dia e o barulho da chuva, deram um resultado magnífico. Dormi como um anjo até o dia seguinte. Só tive sonhos bons e nem me incomodei com os roncos do Diego.

Amanhecer no acampamento e trechos da trilha.

Trechos da subida até o First Pass.

Trilha fora da mata, porteadores e Lhamas pastando.

No alto do First Pass.

Amontoado de pedras onde deixei uma de minhas pedras.

No alto do First Pass o marco dos 4.215 metros.

Várias fotos no alto do passo (First Pass).

A Trilha Inca no trecho de descida após o First Pass.

Descendo pela Trilha Inca.

Uma das poucas paradas para descanso durante a descida do passo.

Com a brasileira Marceli; em frente a barraca e na hora do almoço.

De bobeira pelo acampamento do segundo dia de triha.

Trilha Inca (1º dia)

Após passar pelo posto de controle e atravessar a ponte sobre o rio Urubamba, finalmente iniciei a caminhada pela Trilha Inca. Parecia que todos no grupo estavam ansiosos para iniciar logo a trilha. Para mim era a realização de um antigo sonho, justamente após sofrer muito com duas hérnias de disco, ter sido ameaçado de ficar torto, manco e até mesmo ir parar em uma cadeira de rodas. Nada disso aconteceu, consegui me recuperar com fé, dedicação ao tratamento médico, muito esforço e força de vontade. Fisicamente estava bem preparado, tinha treinado muito nas semanas anteriores, algumas vezes até três horas por dia. Ao dar os primeiros passos na Trilha Inca senti uma sensação boa e confesso que até me dei um pequeno beliscão pra ver se não estava sonhando. O beliscão foi algo meio instintivo e ri quando me vi fazendo tal bobeira. Meu maior receio era de sentir dores, de travar a perna e não conseguir terminar a trilha. Preocupava-me o peso da mochila nas costas, não sabia como minhas hérnias de disco iriam reagir a tal peso. Mas independente de tudo, eu daria o meu melhor, ia me esforçar e tentar provar a mim mesmo que estava curado de todos meus males. Pretendia percorrer toda a Trilha Inca e chegar em Machu Picchu, onde deixaria para trás todos os meus problemas, as coisas ruins e as pessoas que me fizeram ficar  mal. Para muitas pessoas a Trilha Inca e principalmente Machu Picchu tem um forte valor espiritual, algo  místico. Já li e ouvi relatos de pessoas que tiveram nesses locais experiências diversas, que encontraram ao percorrer a Trilha Inca a verdadeira razão de suas vidas, saíram dali mudadas, deram novos rumos ás suas vidas. Eu não sou nada místico, apenas sou uma pessoa que acredita muito em Deus e tem muita fé. E sou muito cético em relação ás coisas, por isso não sabia o que podia acontecer comigo após percorrer a Trilha Inca. Mas por via das dúvidas fiz algo que me ensinaram, peguei duas pedras e coloquei no bolso. Durante os dias na trilha fui conversando com essas pedras, contando a elas sobre minha vida, meus problemas, meus medos, meus sonhos e tudo o que gostaria de mudar em minha vida, ás coisas e pessoas que gostaria de afastar de vez de minha vida, tudo o que eu queria deixar para trás após sair da Trilha Inca. Deixaria uma dessas pedras pelo caminho e a outra em Machu Picchu.

O primeiro trecho da Trilha Inca foi difícil, era uma subida e como ainda não estávamos adaptados a caminhar na altitude com o ar rarefeito, foi meio cansativo esse início. Para compensar o cansaço tínhamos a paisagem, que para todos os lados que olhávamos era maravilhosa. Seguimos costeando uma montanha e abaixo de nós seguia o rio Urubamba. Do outro lado do rio mais montanhas e um vale que seguia junto ao rio, tudo muito bonito. No início estranhei ás muitas paradas para descanso, mas logo entendi que o motivo era para o pessoal não se cansar muito, ir se adaptando aos poucos. Comecei caminhando sozinho e depois de pedir para uma argentina tirar uma foto minha, iniciamos uma animada conversa e caminhamos um bom tempo juntos. O nome da argentina era Carolina e acabamos nos tornando bons amigos nos dias seguintes. Meu espanhol estava meio enferrujado, mas foi possível conversar sobre diversos assuntos, ela falando em espanhol e eu misturando espanhol com portunhol. Para quem fala espanhol é um pouco difícil entender o português. Já pra nós brasileiros é mais fácil entender o espanhol e falando em portunhol acabamos nos fazendo entender melhor. Nos dias seguintes alguns argentinos elogiaram meu espanhol. Fiquei na dúvida se estavam sendo sinceros ou caçoando de mim. Como eu era o único que falava português no grupo, tive que me virar no espanhol e a prática acabou ajudando e logo estava me expressando bem em espanhol, me fazendo entender pelos demais.

Com minha amiga Carolina caminhei boa parte da tarde e em alguns trechos a esperei, pois ela se cansava facilmente, ficava com falta de ar. Eu não queria forçar muito meu ritmo nesse primeiro dia, queria me poupar para o dia seguinte, que seria o mais difícil de todos. A trilha sempre subia e em alguns trechos era plana. No início víamos algumas casas simples ao lado da trilha e por nós passava vez ou outra algum morador. Comentei com a Carolina sobre ás crianças que vimos pelo caminho, que possivelmente passariam a vida toda naquele lugar, nem sabiam muito sobre o mundo, sobre nossa maneira de viver, nossos valores. Então chegamos á conclusão que não devíamos sentir pena delas por isso, pois possivelmente seriam mais felizes do que nós, não conhecendo muitas das coisas ruins que conhecemos, como violência, estresse, depressão, trânsito ruim e outros males das grandes cidades onde vivemos. Aquelas crianças iam crescer e viver num lugar bonito, com ar puro, no meio da natureza, sem muitas das comodidades que a vida moderna nos oferece, mas também sem muitos dos problemas que essa mesma vida moderna nos trás.

No meio da tarde fizemos uma parada mais longa, para o almoço. Eu que sou chato para comida, estava meio temeroso com relação ao que iria encontrar pela frente nas refeições. E fui preparado para o pior. Seguiria a risca o conselho que me foi dado de não visitar nunca a barraca onde eram feitas as refeições. A mesa do almoço foi montada dentro de uma barraca grande e todos os 29 membros do grupo se espremeram dentro dela, sentados em pequenos bancos. Eu preferi ficar numa das pontas. Primeiro foi servida uma sopa de repolho. Os guias traziam os pratos da cozinha e entregavam para quem estava numa das pontas da mesa e esse passava o prato para quem estava ao seu lado, que passava para o outro ao seu lado e assim sucessivamente até chegar ao último da mesa. Logo percebi que tal sistema era prático, mas não muito higiênico, pois muita gente pegava na borda do prato com ás mãos sujas e fatalmente alguma, ou várias bactérias iam parar no alimento. Mas como quem está na chuva é pra se molhar, o jeito era não se preocupar muito com ás coisas e aprender a conviver com ás mínimas condições de conforto e higiene. Se eu quisesse conforto e higiene total, não estaria ali, mas sim em algum outro lugar que me oferecesse tais coisas. Então o jeito era abstrair e levar tudo numa boa. Até  me lembrei dos tempos de Exército e das comidas ruins e estragadas que tantas vezes comi. E não morri por isso, até saí de lá mais forte  e gordinho. A sopa de repolho não era lá muito saborosa, mas deu pra engolir. Depois veio o prato principal, macarrão, fiapos de omelete e batata. A quantidade de comida nos pratos não era muita, mas ninguém reclamou. Achei que um dos motivos era porque comer muito em alta altitude dificulta a digestão e causa mal estar. Depois um dos guias falou que era esse mesmo o motivo de a comida não ser tão farta. De qualquer forma acho que ninguém passou fome. Na mesa era comum um doar aos que comiam mais, parte da comida que não gostavam ou que não conseguiam comer. Após o almoço foi servido chá de coca bem quente, pra ajudar na digestão e para dar uma força extra para o pessoal. O chá de coca não vicia, não é alucinógeno e não faz mal. Ele apenas ajuda a combater o mal estar causado pelo ar rarefeito. O sabor do chá não agradava muito meu paladar, mas mesmo assim eu tomava sempre e sem açúcar. Também foram distribuídas folhas de coca e guardei algumas no bolso para mascar em momentos que me sentisse muito cansado. A folha de coca, a exemplo do chá também não vicia ou tem efeito alucinógeno. Ela ajuda no combate ao mal estar e da uma força extra. Tanto a folha de coca quanto o chá, são consumidos naquela região a centenas de anos e não causam mal algum.

Após o almoço tivemos uma hora de descanso e então voltamos a caminhar pela trilha. Antes de nós partiram os “porteadores”, carregadores que levam nas costas os equipamentos para acampamento e a comida a ser consumida nos três dias de trilha. Pela lei não podem carregar mais de 25 kg cada um, mas mesmo assim o peso que levam requer muito esforço numa altitude tão alta. De qualquer forma é assim que ganham a vida e sustentam suas famílias. Continuei caminhando ao lado da Carolina e muitas vezes parei para tirar fotos da bela paisagem. Teve um trecho curto de subida que foi muito difícil e o ar faltou muitas vezes. O guia falou que aquele trecho era apenas uma pequena amostra do que nos esperava no dia seguinte. Fizemos mais algumas paradas rápidas para descanso e após chegarmos a um local plano no alto de uma montanha, um dos guias falou que teríamos uma surpresa. Dividiram o grupo em dois e cada pequeno grupo seguiu um dos guias. Meu grupo foi até um canto da montanha e lá do alto avistamos embaixo no vale uma antiga vila inca, chamada Llactapata. Essa vila inca com terraços cultiváveis, era um local para cerimoniais e por volta de 1536 foi queimada pelos incas, para evitar que fosse tomada pelos espanhóis. A vista da vila era maravilhosa e sentamos para ouvir o guia Juan Carlos, contar a história do lugar. Eu não consegui ficar sentado muito tempo e ao mesmo tempo que ouvia suas explicações, aproveitava para tirar fotos e caminhar por perto do grupo. Após uma hora prosseguimos em nossa caminhada e passamos ao lado de um antigo forte inca, mas não pudemos parar para visitá-lo. Após tantas subidas, finalmente começamos a descer um pouco. Seguimos em direção a um vale cercado de montanhas por ambos os lados e ao lado da trilha tinha um rio de águas cristalinas. Caminhamos até o final da tarde e pouco antes de escurecer chegamos a Wayllabamba, a última comunidade existente na Trilha Inca e onde já estava armado nosso acampamento. Esse local ficava no fundo de um vale a 3.000 metros de altitude.

Na hora de dividir o grupo nas barracas, os dois casais ficaram sozinhos em barracas e o restante do pessoal deveria ficar três em cada barraca. Daí um argentino (Diego) me perguntou se eu gostaria de dividir uma barraca com ele. Falei que sim e por sermos os dois “grandes” o guia autorizou que ficássemos somente em dois numa barraca. Arrumei minhas coisas no lado direito da barraca e fui tomar meu banho de gato. Molhei uma pequena toalha, passei pelo corpo e depois fiz o mesmo com lencinhos umedecidos e perfumados. Coloquei uma camiseta limpa e me senti revigorado, limpinho e cheiroso. As meias, a calça e a cueca permaneceram sendo ás mesmas. Já meu companheiro de barraca apenas trocou a camiseta e o cheiro de suor e chulé vindos do lado dele da barraca não eram nada agradáveis. Arrumei meu saco de dormir, enchi meu travesseiro inflável e tive a grande idéia do dia; coloquei o casaco que comprei no dia anterior em Cuzco e que era grosso e macio, debaixo do saco de dormir na região onde ficaria minhas costas. Testei minha “cama” e aprovei o uso do casaco como colchão por baixo do saco de dormir, pois ficou muito macio. Senti muita falta do colchão de ar que costumo usar para dormir quando vou acampar ou fazer caminhadas. Ele pesa dois quilos e meio quando está vazio, o que tornou inviável levá-lo para a Trilha Inca. Descansei um pouco, comi uns chocolates e fui jantar. O esquema era o mesmo do almoço e de entrada foi servida uma sopa de legumes, com poucos legumes e muita água. Depois teve o prato principal que consistia de arroz, legumes e truta. Não como peixe e doei meu pedaço de truta a um argentino (Jesus)  que estava sentado ao meu lado. Nos dias seguintes acabamos ficando bons amigos. Após a janta teve de sobremesa um negócio vermelho feito com milho, que parecia gelatina mole, mas que estava gostoso. Por último foi servido um chá diferente cujo nome não lembro. A temperatura baixou bastante e antes das nove todos se recolheram para suas barracas. Lembrei que era noite de lua cheia e resolvi esperar um pouco pra ver a lua surgir por cima das montanhas. A espera valeu a pena e pouco após ás nove horas a lua deu ás caras. Ela estava muito brilhante e clareou todo o vale onde estávamos e deixou melhor definido o perfil das montanhas em volta. Foi uma das noites de lua cheia mais bonitas que vi na vida. Fui o único que ficou no frio presenciando tal espetáculo da natureza, ninguém mais viu. Pena que é impossível captar tamanha beleza através de uma fotografia ou gravação. Foi o tipo de experiência que ficará gravada na memória para sempre. Pouco antes das dez entrei na barraca e a temperatura despencava. Diego roncava alto no seu lado da barraca. Entrei no saco de dormir e fiquei um tempo pensando na vida, depois adormeci. Acordei três vezes durante a noite, por culpa da inclinação do local onde a barraca foi armada. Durante o sono eu ia escorregando aos poucos e tinha que vez ou outra levantar e puxar o saco de dormir de volta para a parte mais alta da barraca. Fora esse imprevisto a noite foi muito boa, dormi bem e até sonhei. E melhor não contar o sonho aqui… rs!!! 

Ps1: antes de iniciarmos a trilha foi feita uma apresentação, onde falamos nossos nomes e idades. Eu, com 40 anos era o mais velho do grupo. A maioria do pessoal estava na faixa etária entre 20 e 28 anos. 

Ps2: durante todo o primeiro dia de trilha me chamaram de “brasileiro”. A única exceção foi minha amiga Carolina que me chamava de Vander ou Vanderlei e também sua amiga Roxana, que me chamava de Vander ou Bander. Um dos guias me chamava de “Brasil”.

Iníco da trilha e ponte sobre o rio Urubamba.

Primeiros passos pela Trilha Inca e parada para descanso.

Após muita subida um pouco de terreno plano.

Llactapata

O guia Juan Carlos contando a história de Llactapata.

Curtindo a vista no meio das montanhas.

Parte final do primeiro dia de Trilha Inca.

Hora da janta.

Trilha Inca

Trilha Inca, ou Caminhos Inca é o nome que se dá ao extenso sistema de caminhos construído durante o Império Inca. Todos os caminhos da América do Sul direcionavam a Cuzco, a principal metrópole sul-americana do período pré-colombiano, legado de uma antiga tradição cultural. Foi usado pelos conquistadores espanhóis para dirigir-se a Bolívia, Chile e as cordilheiras argentinas. Esta rede de estradas se estendia do centro do Equador até a região central do Chile, ao sul, e da costa do oceano Pacífico até as encostas orientais dos Andes. O percurso deste trecho famoso que é conhecido como Trilha Inca e começa no km 82 da ferrovia Cuzco/Quillabamba, atravessa as montanhas acima da margem esquerda do rio Urubamba e chega até Machu Picchu depois de 4 dias de caminhada. São cerca de 42km de extensão e a altitude máxima é de 4215 metros.

Durante o primeiro dia de caminhada o terrenos é liso, sem pedras (calçamento), mas sobe continuamente. Alguns consideram esse como o dia mais difícil de todo a Trilha Inca, pois apesar de ainda não se chegar às grandes alturas o organismo ainda não está bem adaptado e sofre-se muito com os efeitos da altitude também conhecido como “soroche” ou “mal da montanha”. No segundo dia de caminhada a trilha fica cada vez mais íngreme e o terreno cada vez mais irregular. A trilha eleva-se abruptamente em direção à primeira passagem, Warmiwañuska (passagem da mulher morta) a 4.200 metros acima do nível do mar. Geralmente venta bastante neste local e o frio é intenso devido à altitude elevada. É um momento para sentar, descansar e admirar as lindas paisagens, mesmo que o tempo esteja nublado. De Warmiwañuska a trilha é marcada por grandes descidas e algumas pequenas subidas. Muitos trechos possuem calçamento original inca. Ao longo deste percurso existem os sítios arqueológicos de Runkuraqay, Sayacmarka, Puyupatamarka e Wynaywayña.

Os nomes da maioria dos lugares ao longo da trilha são originários da língua Quéchua e foram adaptados pelo do norte-americano Hiran Bingham em sua expedição de 1915. Runkuraqay (pilha de ruínas) está a 3.850 metros de altitude. Por causa de sua posição e da disposição de seus compartimentos, acredita-se que o edifício tenha sido um tambo, um tipo de posto para os viajantes que seguiam a trilha até Machu Picchu. Tinha áreas com dormitórios para os viajantes e instalações de estábulo para seus animais domesticados. As paredes desta construção são do tipo “pirka”.  Sayacmarka foi explorada pela segunda expedição de Bingham em 1915, que lhe deu o nome de Cedrobamba (planície de cedros). Em 1941 uma expedição liderada por Paul Fejos explorou novamente o lugar e rebatizou-a como Sayaqmarka, considerando sua localização geográfica que domina visualmente todo o vale do rio Aobamba. Dentro da cidadela existem diversas construções feitas com certa complexidade por terem sido adaptadas à forma da montanha, incluindo-se um aqueduto de pedra que uma vez levou água para o local. As paredes são sólidas e a forma da fortaleza pode ser vista facilmente de longe.

Puyupatamarka (lugar sobre as nuvens) está a 3.680 metros de altitude. Assim como os outros, este grupo arqueológico também foi descoberto por Bingham em 1915, mas foi Paul Fejos quem em 1941 o rebatizou com o nome de “Puyupatamarka” em razão de que este lugar, quase sempre, se acha por sobre a neblina e as nuvens que se formam nos vales ao redor. Estas ruínas estão numa área de onde visualmente é possível controlar um amplo território e possivelmente foi um importante núcleo administrativo e religioso. Destaca-se neste conjunto uma plataforma de forma quase ovalar e uma série de estruturas retangulares alinhadas ao longo de um dos lados com canais por onde ainda escorre a água a partir do nível mais alto. Alguns acreditam que essas estruturas eram banhos com alguma função ritual. Wynaywayña foi revelada por Paul Fejos em 1941. Posteriormente, em 1942, o arqueólogo peruano Julio C. Tello rebatizou o lugar com o nome de Wiñaywayna (jovem para sempre) que também é o nome quéchua de uma espécie de orquídea, muito comum nas redondezas. Neste grupo arqueológico se encontram diversas construções bem trabalhadas, entre elas se destaca uma na parte superior conhecida como “torre” construída parcialmente com pedras trabalhadas; uma sucessão de 10 fontes rituais do lado direito que são clássicas em todos os povoados importantes e também o setor agrícola com grande quantidade de terraços artificiais. Mais abaixo estão outras construções na borda do precipício, com paredes do tipo “pirka”, de onde se tem uma vista maravilhosa da parte inferior das montanhas. Em direção ao noroeste chega-se até “Intipata” (lugar do sol) consistindo essencialmente de terraços artificiais para uso agrícola.

A etapa final da Trilha Inca a partir de Wiñaywayna é através de um impressionante caminho talhado com maestria na montanha, em cujo lado direito está um profundo precipício. É uma caminhada fácil, seguindo pela trilha larga e por entre um bosque bem arejado. Depois de mais ou menos uma hora, a trilha se estreita em degraus que conduzem acima até uma pequena estrutura de pedra com um chão de grama de alguns metros quadrados. Este é Intipunku (porta do sol) situado à 2.650 metros de altitude. Possivelmente foi uma espécie de alfândega para controlar a entrada de quem chegava à eterna cidade. De Intipunku se tem a fantástica visão panorâmica de Machu Picchu. Pela conjunção destas intrigantes ruínas com as espetaculares paisagens que oferece aos viajantes durante os dias de caminhada a Trilha Inca é uma das rotas de trekking mais famosas do mundo. Percorrer a Trilha Inca é reviver o modo como os incas faziam para chegar a Machu Picchu. Devido à altitude e ao esforço requerido nos dois primeiros dias de caminhada é um momento de superação e um desafio pessoal.

Mapa da Trilha Inca.

Trecho da Trilha Inca no primeiro dia.

Trilha com calçamento, no segundo dia.

Trecho da trilha percorrido no terceiro dia.

Trecho da trilha no final do terceiro dia.

Ollantaytambo

Minha primeira noite em Cuzco não foi das melhores no quesito sono. Dormi muito mal, acordei várias vezes com falta de ar, tive sonhos ruins. Sei que levantei ás seis da manhã no maior bagaço e pra piorar ás três noites seguintes seriam no meio das montanhas, dormindo em barraca. Se no conforto da cama do hotel dormi mal, fiquei preocupado em como seriam as noites seguintes. Caindo de sono terminei de arrumar minhas coisas, fui até a portaria do hotel e deixei uma mochila para ser guardada no depósito. É meio que praxe todos os hotéis e hostels terem um depósito para que os hóspedes deixem algo guardado enquanto vão fazer alguma trilha ou então seguem para Machu Picchu. Não me cobraram nada pelo serviço de guardar a mochila, talvez em razão de eu ter feito uma nova reserva para quando voltasse da Trilha Inca. Eu ainda sentia enjôo, falta de ar e tonturas, então tomei uma pílula para altitude, que tinha comprado no dia anterior, tomei uma xícara de chá de coca e masquei algumas folhas de coca. No hotel tinha uma mesinha num canto com chá de coca para os hóspedes e também uma cestinha com folhas de coca. O sabor da folha de coca não é dos melhores, a boca fica meio adormecida. Sei que pouco tempo depois eu já me sentia melhor, acredito que a combinação  pílula + chá de coca +  folha de coca, fez um efeito mais imediato. 

Fiquei quase uma hora na calçada em frente ao hotel esperando que alguém da agencia de turismo fosse me buscar. Nesse tempo pelo menos uns cinqüenta taxis passaram na rua em frente e buzinaram para mim. Parece que na cidade existem mais taxis do que carros de passeio e os motoristas têm o péssimo hábito de buzinar para todos os estrangeiros que eles vêm na rua, na esperança de que algum resolva seguir no seu taxi. Sei que é algo irritante, ás vezes passavam três taxis juntos e os três buzinavam. Finalmente apareceu alguém da agencia, era a Glória, uma peruana que seria uma das guias na Trilha Inca. Fui com a Glória até um ônibus estacionado perto do hotel. Eu fui o último a embarcar e ali mesmo se iniciou uma chamada para conferir se não faltava ninguém. Os hispanos não conseguem pronunciar meu nome corretamente, isso acontecia muito no tempo em que eu vivi nos Estados Unidos. Eles não conseguem pronunciar o “V”, que pra eles tem o som de “B”. Então meu nome que é “José Vanderlei”, acaba sendo pronunciado como “Rosé Banderlei”, o que para mim é algo horrível. Felizmente nos dias seguintes todos passaram a me chamar de Vanderlei ou de Vander, mesmo que errando na pronúncia, mas isso é bem melhor do que o “Rosé”.  Após umas três ou quatro chamadas, finalmente resolveram pegar a estrada. Fiquei no fundo do busão e  próximo a mim iam dois caras com cara de estrangeiros, que depois vim a descobrir serem da Inglaterra e do Canadá. Logo na saída da cidade percebi que a periferia é muito pobre, com casas construídas nos morros. Desde março de 2010 quando a região sofreu com ás chuvas, no que foi chamada de enchente do século, parte dos trilhos do trem que iam de Cuzco até Aguas Calientes (pequena cidade aos pés de Machu Picchu) foram destruídos e por essa razão parte do trajeto tem que ser feito de ônibus. Na estrada fiquei assustado com a velocidade que o motorista conduzia o ônibus, tirando fina de outros veículos. Como estava com sono resolvi encostar minha cabeça na janela e logo adormeci. Fui acordar quase duas horas depois, quando chegamos ao pequeno vilarejo de Ollantaytambo, no km 68. Os guias avisaram que ali seria o último lugar onde poderíamos comprar por preços justos equipamentos que faltassem, água e algum tipo de comida. 

O vilarejo é muito interessante, com uma enorme praça central, algumas lojas e pequenos prédios em volta. Ao lado do vilarejo dá pra ver montanhas muito altas e bonitas e também algumas ruínas de construções incas. O que mais me chamou atenção foi que numa das calçadas existe um tipo de caneleta por onde corre água que vem das montanhas. A água é limpa e gelada. Andei pelas proximidade e vi que essa canaleta na calçada também passa bem na porta de algumas casas. Aproveitei para usar o banheiro de um mercadinho e esse foi o último banheiro descente que usei em quatro dias. Logo voltamos para o ônibus e pegamos a estrada novamente. Fomos através de uma estradinha ruim que seguia por um vale e passava bem perto dos trilhos do trem. Seguimos até o km 82, onde paramos e desembarcamos junto com nossas mochilas. 

No meu grupo eram 59 pessoas, que foram subdivididas em dois grupos. Fui parar num grupo de 29 pessoas. Eu, dois colombianos e 26 argentinos. Por sorte sempre me dei bem com argentinos e principalmente com argentinas. No outro grupo cujo guia falava inglês, ficaram alguns canadenses, ingleses, australianos e… argentinos. No início não entendi o porquê de tantos argentinos, mas depois conversando com alguns, vim descobrir que em razão da moeda deles estar muito desvalorizada, eles procuram destinos turísticos onde o valor da moeda não seja dos piores, como é o caso da Bolívia e do Peru. Em vez de irem em peso ao Brasil como faziam antes, agora é mais barato ir pra mais longe, pois no Brasil a moeda deles vale somente a metade, enquanto no Peru tem quase o mesmo valor que a moeda local. 

Após acertamos os últimos detalhes e verificarmos nosso equipamento, fomos em direção ao posto de controle da trilha. No caminho paramos em frente a uma placa que indica o início da Trilha Inca, e onde tradicionalmente todos os grupos que por lá passam, tiram uma foto em frente. Com nosso grupo não foi diferente e após várias fotos seguimos até o posto de controle. Eu era o último da fila, na minha frente tinha um argentino com a cara do Che Guevara quando mais moço e ainda por cima ele usava um boné igual o utilizado pelos revolucionários de Fidel Castro e de Che Guevara,  na Revolução Cubana, inclusive com uma bandeira cubana pregada na lateral. Sei que nos dias seguintes todos passaram a chamar esse argentino pelo nome Che. Passei pelo posto de controle sem nenhum problema e ganhei uma carimbo em meu passaporte. A sensação era de estar entrando em um outro país, devido ao tipo de controle feito para entrar no “Santuário Histórico de Machu Picchu”. Ali iniciava a aventura, era o começo do sonho…

Ollantaytambo

A calçada com a canaleta de água e alguns moradores locais.

Caminhando pelas calçadas de Ollantaytambo.

Ruas de Ollantaytambo e ruínas incas nas montanhas próximas.

A tradicional foto em frente a placa no início da Trilha Inca.

Caminho do Itupava

No sábado pela manhã, eu e Hiroo, meu vizinho, fomos fazer o Caminho do Itupava. Esse caminho foi aberto entre os anos de 1625 e 1650. Por quase três séculos foi o único caminho entre o litoral paranaense e a região de Curitiba. Algumas fontes contam que ele foi aberto pelos portugueses, outras dizem que foi por caçadores indígenas. Boa parte do caminho é calçado com pedras e alguns registros dizem que esse calçamento foi feito pelos Jesuítas, outros dizem que foi por escravos. A caminhada se inicia a 1.000 metros de altitude, sendo que o final está praticamente ao nível do mar. Nos últimos anos o caminho passou por algumas modificações, como a colocação de pontes por sobre os rios que cortam o caminho, mas a maior parte permanece da mesma forma como na época em que os primeiros viajantes a subir a Serra do Mar trafegavam por ali. Já percorri o caminho uma vez em 2002, mas seguindo um pouco pela estrada de ferro e atravessando a Represa da Copel que existe logo no inicio da Serra. Dessa vez seguimos pelo caminho original, sem atalhos.

Fomos de carona com o pai do Hiroo, até o ponto inicial do caminho, na cidade de Borda do Campo. Após preencher um cadastro obrigatório do Posto do IAP, iniciamos a caminhada ás 08h00min. O clima estava bom para caminhar, fazia sol e um friozinho simpático. Nossa meta era percorrer os 16,3 km do Caminho do Itupava e depois seguir mais 3,7 km até a Estação de trem do Marumbi, para pegar o trem de passageiros que segue para Curitiba quase no final da tarde. Caso ocorresse algum imprevisto e perdêssemos o trem, nossa meta seria andar mais 8 km até Morretes e voltar de ônibus para Curitiba.

No inicio da caminhada imprimimos um ritmo forte, que serviu para esquentar o corpo. Eu estava caindo de sono, pois tinha saído na noite anterior e dormido menos uma hora e meia. Ou seja, era algo insensato fazer uma caminhada tão longa após uma noite mal dormida. Mas resolvi arriscar, confiando em minha raça e força de vontade. Meu único receio continuava sendo o tendão do pé direito, que não está cem por cento.

O trecho inicial do caminho passa por uma pedreira abandonada e por algumas trilhas de terra em meio á mata. Alguns trechos de subida não muito forte se alternavam com descidas. Somente após uma hora de caminhada é que passamos a caminhar pelo trecho de pedras original do Caminho do Itupava. Daí o cuidado tinha que ser redobrado, pois estava tudo úmido e escorregadio. Ao chegar no primeiro rio, atravessamos pela ponte que foi colocada no local. Da outra vez que passei por ali, tinha atravessado o rio com água no meio da coxa. Era mais emocionante atravessar pelo rio, mais como a água estava gelada, resolvi deixar a emoção de lado e atravessar pela ponte. Nossa primeira parada foi na Casa Ipiranga (em outro post conto a história desse local). Tiramos algumas fotos, demos uma olhada pelo lugar, ou melhor, pelo que sobrou do lugar, e subimos alguns metros pelo trilho do trem até onde existe uma pequena cachoeira e uma roda d’agua. Tinha uma porção de gente acampada ali e ficamos um tempo descansando e conversando com dois caras que estavam totalmente bêbados e drogados. Os caras eram repetitivos e não falavam coisa com coisa. Verificando o relógio, o mapa de quilometragem e horário da trilha, descobrimos que estávamos pouco mais de uma hora abaixo do tempo estipulado no mapa. Ou seja, podíamos até diminuir nosso ritmo, que teríamos tempo de sobra para cumprir nossa meta, que era pegar o trem na Estação Marumbi.

Resolvemos partir e alguns metros abaixo seguindo pelo trilho do trem, reencontramos o Caminho do Itupava. Esse trecho se mostrou difícil, com muita subida e alguns lamaçais que mais pareciam areia movediça. Tivemos que tomar muito cuidado para não escorregar e nem ficar atolados ao passar pelos lamaçais. Começamos a encontrar vários grupos de pessoas, que aproveitando o feriadão e o tempo bom, também se aventuravam por ali. Em alguns trechos tínhamos que diminuir o ritmo e andar atrás destas pessoas. Mas logo passávamos por elas e continuávamos em nosso ritmo. E assim seguimos por toda a manhã, subindo morro, descendo morro, cuidando pra não cair. O Hiroo caiu sentado duas vezes, eu passei ileso. Foram apenas alguns escorregões sem queda e alguns furos de espinho na mão. Teve um momento em que tive que escolher entre cair ou segurar numa árvore cheia de espinhos. Escolhi os espinhos.

Atravessamos alguns riachos e rios não muito grandes, quase sempre pulando de uma pedra a outra. Todos eram de água cristalina e serviam para matarmos nossa sede. Logo começamos a ouvir o barulho dos trens e sabíamos que nossa meta para descanso e almoço estava próxima. O pior trecho acabou sendo a descida do morro que leva até o Santuário de Nossa Senhora do Cadeado (em outro post conto sobre esse local). É uma descida muito inclinada e por sorte, na parte final foram colocados abençoados corrimões. No Santuário aproveitamos para descansar e lanchar. Parece que os demais grupos também tiveram a mesma ideia. A vista dali é muito bonita, em frente da para ver boa parte da estrada de ferro e muitos morros.

Após o “almoço” e o descanso, retornamos ao caminho, dessa vez morro abaixo. Esse trecho final é complicado, pois a descida é íngreme e as pedras escorregadias. Mas correu tudo bem e após quase uma hora de caminhada chegamos na parte plana, e atravessamos por pontes dois rios e alguns riachos por pinguelas. E finalmente chegamos ao fim do caminho. O caminho original seguia até Paranaguá, mas ele não existe mais, sobre seu trajeto original foram construídos estradas e até uma BR.

Tínhamos tempo de sobra até pegar o trem, então subimos tranquilamente morro acima em direção ao Marumbi. Paramos na Estação Engenheiro Langue, que está abandonada, mas foi reformada faz alguns anos. Ali existe um vitral muito bonito, mas que está com vários pedaços quebrados. O que dá pena mesmo são das casas abandonadas. No passado elas eram utilizadas pelo trabalhadores da Rede Ferroviária Federal. Bem que a ALL (America Latina Logística) que tem a concessão da Rede Ferroviária naquele lugar, poderia reformar estas casas e utilizá-las como pousada ou algo parecido. Após um breve descanso e algumas fotos, seguimos pela trilha de 850 metros que leva até a Estação Marumbi. Essa trilha corta caminho e passa pelo trilho do trem. O trilho faz algumas voltas até chegar a Estação. No caminho paramos para ver um trem de carga descendo a serra carregado. É algo bonito e barulhento de se ver. Mais alguns minutos de caminhada e finalmente chegamos na Estação Marumbi. Foram 07h10min de percurso, sendo 06h10min de efetiva caminhada e 01h00min de descanso. A estação estava cheia de gente e ficamos descansando até a chegada o trem, que atrasou um pouco.

Ás 16h10min, embarcamos no trem e fomos observando a maravilhosa vista da serra do mar. Alguns lugares por onde passamos são de dar medo, mas a beleza da paisagem compensa qualquer coisa. Chegamos em Curitiba no inicio da noite, cansados, doloridos, mas felizes e realizados por termos cumprido com exito o desafio proposto. Agora é descansar e planejar a próxima aventura.

Caminho do Itupava e Casa Ipiranga.
Caminho do Itupava e Casa Ipiranga.

Água cristalinas.
Águas cristalinas.

Santuário de Nossa Senhora do Cadeado.
Santuário de Nossa Senhora do Cadeado.

Trilho, tunel e trem...
Túnel,  trem e trilho…

Trechos do Caminho do Itupava.
Trechos do Caminho do Itupava.

Sobre os trilhos.
Sobre os trilhos.

Estação Engenheiro Langue.
Estação Engenheiro Langue.

Estação Engenheiro Langue e Eatação Marumbi.
Estação Engenheiro Langue e Estação Marumbi.

De trem rumo a Curitiba.
De trem rumo á Curitiba.