No meio do caminho tinha uma vaca…

No meio do caminho tinha uma vaca, tinha uma vaca do meio do caminho…

Drummond escreveu sobre a pedra que existia no meio do caminho, já no meu caso vou escrever sobre a vaca que tinha no meio do caminho (daquelas de quatro patas, par de chifres e rabo).

No último dia 17 estava indo de carro de Curitiba para Campo Mourão, por uma estrada que liga ás cidades de Reserva e Cândido de Abreu. A estrada é nova, com pouco trânsito e uma paisagem muito bonita, atravessando um longo trecho de serra. O único problema é que ela não tem acostamento. Já tinha passado por ali quatro vezes antes, mas nunca tinha notado as placas que informam sobre animais na pista. Achei até normal tal placa, pois ao lado da estrada existe muito pasto e criação de gado. Logo após passar pela primeira placa fiquei mais atento na estrada, mas após rodar uns 50 km acabei esquecendo. E foi ai que tudo aconteceu, ou melhor, quase aconteceu. Numa descida onde devia estar há uns 100 km/h ou 110 km/h, eis que uma vaca (de quatro patas) sai do meio do mato e entra na pista, bem na minha frente. Junto comigo seguia o Márcio, amigo de meu irmão que pegava carona até Campo Mourão. Ele deu um grito de alerta ao mesmo tempo em que eu vi a vaca e numa fração de segundos tive que decidir o que fazer. Frear não ia dar tempo, então ao mesmo tempo em que tirei o pé do acelerador, buzinei e desviei pela contra mão. A vaca parou sem saber o que fazer e por sorte não vinha nenhum carro em sentido contrário, pois senão eu teria que escolher entre bater de frente com o veiculo que viesse ou atropelar a vaca. Sair da estrada não seria aconselhável, pois ela não tem acostamento e no trecho onde estávamos é cercada por muitas árvores. No fim saímos ilesos e fora o enorme susto nada aconteceu. Atropelar uma vaca em velocidade razoável pode ser muito perigoso, pois em razão de sua altura e seu peso a tendência é que no momento do impacto ela seja jogada contra o pára-brisa ou para cima do carro, causando um acidente sério. Há uns 22 anos em Campo Mourão teve um caso de um  conhecido que morreu ao atropelar uma vaca e no impacto a cabeça da vaca foi parar dentro do carro e ele foi espetado pelo chifre bem no coração. Em 1995 o filho de minha ex-chefe atropelou uma vaca e quase morreu, ficou todo quebrado e o carro deu perda total. E em ambos os casos até hoje ninguém descobriu quem era o dono dos animais.

Quatro dias depois do quase atropelamento da vaca de quatro patas, eu e Márcio (nova carona) voltávamos para Curitiba pela mesma estrada e notamos que existiam muitas outras placas sobre animais na pista (com o desenho de uma vaca). Paramos para tirar fotos e então percebemos que essas placas são feitas de madeira, tipo chapas de compensando, enquanto as demais placas da estrada são feitas de metal. Deduzimos que já deve ter ocorrido algum acidente grave nessa estrada envolvendo boi, vaca, touro e até búfalo (vimos alguns nos pastos, pelo caminho) e depois fizeram essas placas de forma emergencial e colocaram em alguns trechos. O aviso é até válido, mas não resolve muito pois a vaca que cruzou nossa frente apareceu de repente, saindo do nada.

Existe uma lei que responsabiliza o dono de animais soltos em estradas, mas como a fiscalização é  insuficiente os bichos continuam soltos e os donos parecem que não estão preocupados. E quando ocorre algum acidente, principalmente com vitimas humanas é quase impossível de o dono aparecer. Num pais onde as leis não são fiscalizadas e cumpridas, fica difícil pedir que punam os donos de animais que andam soltos pelas estradas. Então cuidado, tanto com as vacas de quatro quanto com de de duas patas, pois elas podem causar sérios riscos a sua integridade física.

Vander e as vacas.
Vander e as vacas.
Vander procurando vacas e Márcio fazendo pose.
Vander procurando vacas e Márcio fazendo pose.

9ª Peregrinação pelo Caminho de Peabiru – Parte 3

Domingo, 19/04/2009:

Acordei pouco depois das 06h00min e mal conseguia me mover. Meu corpo doía por inteiro, principalmente as costas. Foi a maior tortura levantar, desmontar barraca e arrumar as coisas. Tive que tomar um relaxante muscular para suportar as dores. Tomei café, fiz uma rápida visita a igrejinha de madeira e logo fui pra estrada. Alcancei a Zilma e o Emerson e fomos conversando. A estrada estava horrível, com muita poeira e apesar de não serem longas como na tarde anterior, subidas existiam aos montes. Aos poucos o remédio foi fazendo efeito, o corpo aqueceu e as dores se tornaram suportáveis. Caminhamos a manhã toda e além do Emerson e da Zilma, também segui na companhia da Christine e do Valtério. Pouco antes do meio-dia paramos num lugar chamado Pranchinha (ou Pranchita como alguns preferem). Dali teria mais uns três quilômetros de caminhada e depois seguiríamos de ônibus por uns 12 km até a cidade Luziânia. Uma bolha no pé estava incomodando e decidi subir na Toyota da equipe de apoio. Tinha caminhado algo em torno de 47 km em um dia e meio, então achei que não faria falta deixar de caminhar os poucos quilômetros finais, que poderiam piorar a situação de meu pé. Em cima da Toyota fomos eu, Zilma e Mariá. Depois o Valtério se juntou a nós e demos boas risadas. Apesar do sacolejo e de comer poeira, foi divertido. Paramos num lugar onde hoje existe uma plantação de soja, mas que no passado existiu uma pequena comunidade chamada Campina da Lizeta. Nessa comunidade existiam várias casas e famílias, Igreja e Cemitério. Hoje não existe mais nada, apenas soja e mais soja. O que aconteceu na Campina da Lizeta, aconteceu em muitos outros lugares do Paraná. As grandes fazendas de soja, cada vez mais mecanizadas, fizeram que existisse um enorme êxodo rural. As famílias que viviam nesses locais não tinham mais onde morar e tiveram que ir pra cidades maiores, quase sempre indo viver em favelas.

Próximo a Luziânia passamos por um grupo enorme de cavaleiros. Paramos na entrada da cidade e seguimos a pé até um lugar onde seria servido o almoço, para nós e para os cavaleiros que participavam da “Cavalgada do Descobrimento”. No local do almoço conversei com algumas pessoas, tirei fotos e depois fui para a fila da comida. O prato principal era picadão de carne cozida, que confesso não é dos meus pratos preferidos, depois de comer tal prato quase todos os dias durante os dois anos que passei no Exército. Mas a comida estava boa e fui encher o prato de novo.

A tarde seguimos de ônibus para uma cachoeira que fica na saída da cidade, um local muito bonito. A água estava gelada, mas não resisti e acabei entrando. Foi relaxante ficar sentando no pé da cachoeira e também serviu pra tirar um pouco da poeira acumulada pelo caminho. Depois embarcamos no ônibus e seguimos para Campo Mourão. Pelo caminho muita cantoria e um pouquinho de tristeza, pois o final de semana tinha sido tão bom que ninguém queria que terminasse. Chegando em Campo Mourão me despedi do pessoal e fui pra casa. A noite o Wagão me levou até Nova Cantu pra buscar meu carro e ás 23h00min estava de volta na casa de meus pais, exausto, moído, dolorido, mas contente por ter participado de minha terceira Peregrinação pelo Caminho de Peabiru. Esse é o tipo de programa que a pessoa faz uma vez e volta outras vezes ou então nunca mais aparece. È cansativo, mas ao mesmo tempo é prazeroso, você tem contato com pessoas dos locais por onde passa e é sempre bem tratado, o povo é hospitaleiro. Lógico que existem exceções, como os bêbados que me deram informações erradas, mas a maioria do pessoal é muito querida. E você acaba fazendo novos amigos e fortalecendo antigas amizades.

È isso ai, até a(s) próxima(s)!!!!

Segunda manhã de peregrinação.
Segunda manhã de peregrinação.
Igreja da Pranchinha e equipe de apoio.
Igreja da Pranchinha e equipe de apoio.
Na estrada comendo poeira e chegando em Luziana.
Na estrada comendo poeira e chegando em Luziana.
LEm Luziana.
Em Luziânia.
Em Luziana com os cavalos e na cachoeira.
Em Luziânia com os cavalos e na cachoeira.

9ª Peregrinação pelo Caminho de Peabiru – Parte 2

Sábado, 18/04/2009:

Acordei ás 06h00min, com o despertador do celular gritando ao meu lado. Já dava pra ouvir os ruídos do pessoal se ajeitando para o café. Com muito custo sai da barraca, fazia frio e a vontade era de dormir mais um pouco. Logo lavei o rosto, escovei os dentinhos e fiz aquele xixi básico. Em seguida desmontei a barraca, esvaziei o colchão de ar e fui dar um oi para o pessoal. Vi muitas caras novas e entre elas também tinham alguns conhecidos das peregrinações anteriores de que tinha participado em 2007 e 2008. Dei uma olhada no café e mesmo não tendo o hábito de comer pela manhã, não resisti e fui fazer uma boquinha. Depois estacionei o carro dentro da escola e prometi ao vigia que até domingo a noite voltaria para buscá-lo.

Pouco depois das 07h00min embarcamos num ônibus e fomos até em frente á Igreja, bem no centro da pequena cidade. Éramos umas 60 pessoas entre peregrinos, equipe de apóio e pessoas da cidade que acompanhariam somente o inicio de nossa jornada. Após alguns curtos discursos, teve sessão de alongamento, oração e iniciamos nossa caminhada. Pela rua encontramos alguns moradores acordados, que nos olhavam com ar de curiosidade. Alguns foguetes foram disparados pelo pessoal da Prefeitura e isso deve ter acordado muita gente. O chato é que o os caras soltam o foguete e depois jogavam o foguete usado no chão, no mato. Conscientização ecológica igual a zero. Essa primeira caminhada não foi muito longa, paramos em uma espécie de pracinha onde existe uma gruta com uma imagem de Nossa Senhora Aparecida. Após sessões de fotos embarcamos no ônibus e seguimos alguns quilômetros por estrada de terra até um distrito de nome Santo Rei. Paramos na pracinha em frente á Igreja e a Professora Sinclair contou a história do local para alguns moradores que se juntaram para ver o que estava acontecendo. Confesso que não prestei muita atenção no que ela contou, pois me afastei a procura de um banheiro e aproveitei para rezar um pouco na Igreja.

Não demorou muito e iniciamos efetivamente nossa peregrinação. Antes parei para fotografar alguns garotos que estavam de pé no chão e casas antigas de madeira. Então me coloquei a caminhar e tentava avistar algum conhecido para caminhar junto quando ao passar por algumas pessoas, uma moça perguntou por que estavam carregando mochila e cajado e eu não carregava nada? Então expliquei que o pouco de que precisava estavam nos bolsos da calça e que não gostava de caminhar utilizando o cajado, que preferiria seguir de mãos livres. Quem tinha feito a pergunta era a Zilma, que é de Campo Mourão e que mais tarde descobri ser prima da esposa de um primo e que conhece alguns membros de minha família. Outra que participava da conversa era a Christine, que veio de Joinville para participar da peregrinação. Ela já fez várias peregrinações em vários lugares, inclusive a mais famosa, o Caminho de Santiago. E assim foi seguindo a manhã e no grupo com o qual fiquei caminhando sempre aparecia alguém pra caminhar junto por um tempo, que depois de afastava para frente ou para trás. Logo aparecia outra pessoa e dessa forma ia conhecendo todo mundo. O trecho da manhã foi por um lugar bonito, com muitas montanhas e com muitos pastos repletos de bois. Também teve muitas subidas e conforme a manhã avançava o friozinho foi embora e esquentou.

Caminhamos uns 14 km e na hora do almoço paramos em uma pequena localidade chamada Cateto. Ali estavam preparando o almoço, cujo prato principal seria “Porco no Tacho”. Os pedaços de carne eram cozidos em tachos de latão, que estavam sobre tijolos no chão. A fome era imensa e a comida estava boa, mas não exagerei pois a caminhada da tarde seria longa e com o calor não era interessante comer muito porco, pois poderia ocorrer alguma reação inesperada. Eu já tinha estado nessa localidade com meu pai há uns 30 anos e pelo que vi ela não mudou nada nesse tempo todo. De interessante foi usar um banheiro sem porta, que apesar dessa particularidade não provocou nenhum incidente. Antes de partir ainda sobrou tempo de deitar num gramado e descansar um pouco.

Pouco depois das 13h00min retomamos nossa caminhada. A paisagem foi se modificando aos poucos, os pastos foram desaparecendo e começaram a surgir plantações entrecortadas por algumas matas. Até inicio dos anos 70 quase todo aquele lugar era coberto por matas de Araucária. A fronteira agrícola e as plantações de soja tomaram o lugar dos pinheirais. Hoje pouco coisa sobrou, existe uma ou outra pequena reserva espalhada. No meio da tarde eu já estava arrebentado e começou uma série de subidas infinitas. Era uma subida atrás da outra, onde você olhava pra frente e não via o final da subida. Comentei com o pessoal que estava “seco” por uma Coca-Cola gelada e que seria uma boa encontrar um vendinha pelo caminho. Mas logo lembrei que não carregava nenhum dinheiro. Não encontramos nenhuma vendinha, mas ao passar por uma pequena localidade tinha um local de festas ao lado de uma igrejinha, onde estavam vendendo refrigerante e cerveja. A Christine veio em minha salvação e me emprestou uma grana pra comprar minha sonhada Coca-Cola. Ela estava deliciosa e serviu para limpar a poeira da garganta. Antes de partirmos um senhor apareceu com uns espetos de madeira com churrasco daqueles de festa de igreja. Ele fez questão que o pessoal levasse o churrasco e assim os espetos seguiram em cima da Toyota da equipe de apoio.

O restante da tarde foi puxado, as subidas se juntavam uma a outra e logo chegamos numa estrada de terra larga que era movimentada e por essa razão muito empoeirada. Cada vez que passava um carro levantava muita poeira e íamos ficando imundos. Nessa parte andei quase o tempo todo junto com a Zilma e com o Professor Emerson. Ele é mineiro, vive no Rio de Janeiro, onde faz doutorado e veio fazer uma palestra sobre cultura indígena em Campo Mourão. O cara é gente boa e engraçado, ia contando piadas pelo caminho. Algumas vezes fizemos as paradas básicas ao lado do carro de apoio, para beber água e comer uma banana ou barrinha de cereal. Mas o cansaço era tanto e as energias estavam indo embora que logo me atraquei ao churrasco frio que tínhamos ganhado. E estava uma delícia, dei uma revigorada. Uma outra parada interessante foi em frente a um pequeno Cemitério, onde nos sentamos em umas pedras enfileiradas e pintadas de cal. Íamos pernoitar em uma fazenda e por mais que a equipe de apoio falasse que estávamos perto, essa fazenda nunca chegava. A Zilma não agüentou as dores no pé e seguiu no carro de apoio. Então seguimos eu e Emerson, mas logo ele resolveu andar mais rápido e decidi não acompanhar, pois estava com medo de meu problema no tendão começar a incomodar. Então na última hora de caminhada segui com duas novas companheiras, a Carmen que é de Campo Mourão e a Juliane, enfermeira que acompanhava a peregrinação e que se cansou de seguir de carro e decidiu caminhar um pouco. Ela acabou gostando da coisa e resolveu seguir caminhando até o fim. Era até engraçado vê-la de guarda-pó branco caminhando no meio da poeira.

Já estava escurecendo quando chegamos na fazenda do Sr. Miguel Burak. Boa parte do pessoal já estava lá se ajeitando. Alguns iam dormir em barracas, outros num barracão que ficava nos fundos da casa. Além dessas duas instalações existiam a Casa da Fazenda, um local coberto onde eram realizadas festas e uma igreja de madeira construída nos anos cinqüenta. Acabei decidindo por armar a barraca ao lado da igreja, num ponto estratégico próximo ao banheiro, ao local onde seria o jantar e onde estava claro pelas luzes, pois não tinha levado lanterna. Próximo acenderam um enorme fogueira.

O banho era na casa do Seu Miguel, onde existiam quatro banheiros com chuveiro elétrico. Tinha fila, mas dei sorte e quando fui tomar banho só tinha um na minha frente. Nada mais revigorante do que um banho quente após um dia puxado. Foi difícil tirar todo o pó do corpo e minha camisa que era branca tinha ficado marrom. Depois do banho fui para o social com o pessoal. Ficamos batendo papo, bebendo e ouvindo as cantorias de uma dupla sertaneja e um sanfoneiro que animavam o local. Logo começaram umas músicas gauchas e alguns foram dançar. Não resisti e mesmo com dores pelo corpo todo dancei um pouco. Em seguida teve a janta, cujo prato principal era Galinhada. Me acabei de tanto comer e depois fiquei batendo papo com o pessoal. Muitos foram dormir cedo, mas fiquei com uma turminha de umas dez pessoas conversando até 01h30min. Desligamos todas as luzes e ficamos ao lado da fogueira conversando e contando histórias. Terminei a noite deitado no chão, olhando para o céu com milhões de estrelas. Não tinha lua e estava tudo muito escuro, um céu maravilhoso. Acabei vendo cinco estrelas cadentes, nunca tinha visto tantas assim. Quando fui pra barraca e entrei no saco de dormir, simplesmente desmaiei e dormi o sono dos justos. Ao todo tinha caminhado por volta de 35 km.

Comunidade de Santo Rei.
Comunidade de Santo Rei.

Locais por onde passamos no primeiro dia de peregrinação.

Paisagens da caminhada.
Paisagens da caminhada.
Almoço no "Cateto", rio, poeira e entardecer.
Churrasco, subida, mixirica e descanso...
Churrasco, subida, mixirica e descanso...
Pernoite na Fazenda M. Burak.
Pernoite na Fazenda M. Burak.
Papo ao lado da fogueira e Igreja de madeira.
Papo ao lado da fogueira e Igreja de madeira.

9ª Peregrinação pelo Caminho de Peabiru – Parte 1

Sexta-Feira, 17/04/2009:

Saí de Curitiba ás 13h20min com destino á Campo Mourão. Esperava chegar a tempo de pegar o ônibus com o pessoal que participaria da Peregrinação, cuja partida estava marcada para 18h30min. Levei como carona o Marcio, amigo de meu irmão. Logo na saída já encarei um congestionamento causado por uma passeata de motoboys. O atraso inicial foi se somando a outros atrasos pela estrada, em razão do grande movimento motivado pelo feriadão. E ainda por cima quase atropelei uma vaca que saiu do mato e entrou na pista. Por sorte não vinha nenhum carro em sentido contrário e consegui desviar sem danos, apenas com um grande susto. Acabei chegando em Campo Mourão ás 20h00min. O pessoal já tinha partido para Nova Cantu, local onde iniciaria a peregrinação. O jeito foi relaxar, tomar banho, jantar, descansar um pouco e pegar a estrada novamente para percorrer 150 km até Nova Cantu.

Tinha duas opções de caminho e acabei indo pelo pior. E pra piorar ainda mais, não abasteci em Campo Mourão. Acabei tendo a maior dificuldade para encontrar um Posto de Gasolina aberto e por muito pouco não fico na estrada com pane seca. E pra piorar o que já estava pior, boa parte da estrada era de subidas e descidas com muitas curvas fechadas e sem acostamento. Não dava pra correr muito e acabei chegando em Nova Cantu ás 23h30min. Já estava bastante atrasado, já tinha perdido a palestra e também a janta. Agora o problema era encontrar a Escola onde o pessoal estava alojado. E tarde da noite em cidade pequena é difícil encontrar uma viva alma para pedir informação, só tinham cachorros e bêbados zanzando pelas ruas. Na primeira informação acabei indo parar do outro lado da cidade e tive que voltar e encontrar outro bêbado para pedir nova informação. Na segunda tentativa me mandaram seguir pela avenida principal e virar a direita ao chegar ao Posto de Gasolina, depois deveria seguir até o final da rua. Segui a dica e logo senti que tinha caído em outra furada, pois a rua logo terminou e tive que seguir por uma estradinha de terra toda esburacada, ao lado só tinha mato e lá na frente um enorme muro branco. Fiquei imaginando se ali naquele lugar de filme de terror seria a escola. E logo descobri que realmente tinha caído na segunda furada da noite, pois o muro branco era nada mais nada menos que o Cemitério da cidade. Manobrei em frente o Cemitério torcendo para que o carro não desse nenhuma pane e antes de sair rapidamente dali, pude ler uma frase escrita na parte de cima do portão, “Aqui todos são Iguais”. Até que a frase era interessante e merecia uma foto, mas naquela escuridão e naquele lugar medonho achei melhor deixar a foto pra outra oportunidade que talvez nunca aconteça. Voltando a cidade achei uma senhora e um garotinho, então resolvi arriscar a pedir informação imaginando que aquela senhora com cara de vovó não teria coragem de me sacanear. E dessa vez a informação era correta, logo encontrei a Escola. Entrei portão adentro e encontrei uns poucos “peregrinos” acordados batendo papo. A maioria do pessoal já estava dormindo, alguns em barracas na quadra de esportes e outros em salas de aula. Primeiramente pensei em dormir na sala onde o pessoal estava batendo papo, mas logo avisaram que iam papear até bem tarde. Então para não acordar o pessoal que estava dormindo, armei minha barraca num cantinho do prédio, do lado de fora. O mais difícil foi encher o colchão de ar, que em razão do sono e do cansaço pareceu ter levado uma eternidade para ficar cheio. Pouco depois da uma da manhã adormeci. Estava dormindo gostoso quando acordei com os latidos de alguns cachorros e percebi que estava gelado de frio, pois não tinha fechado o saco de dormir por inteiro. Então me ajeitei da maneira correta e voltei a dormir.

Primeira manhã de peregrinação.
Primeira manhã de peregrinação.

Relatório da 9ª Peregrinação pelo Caminho de Peabiru

logopeabiru

Relatório da IX Peregrinação (Sinclair Pozza Casemiro)

Nova Cantu, 18 de abril de dois mil e nove.

Cinco e meia da manhã. “Ivy Mara Ey”. Em busca da Terra Sem Males. No Colégio Estadual “João Faria”, já se escutam os primeiros movimentos dos nova-cantuenses ajeitando o café, o movimento dos peregrinos acordando, se arrumando, se vestindo, fazendo a preparação para a caminhada do dia até a Comunidade da Estiva, em Roncador. Antes, a parada será na Comunidade do Cateto, também em Roncador, para o almoço.

Na carinhosa recepção matinal aos peregrinos, estão presentes professores do Colégio, a Secretária de Cultura e Educação Kácia, o agrimensor que mediu os terrenos do município na época da sua criação, Devoncir Graffi. O NECAPECAM distribui os kits do peregrino e o Caderno do Peregrino. A animação é geral, expectativa no ar, principalmente para quem vem pela primeira vez. Nessa caminhada, cada qual segue seu ritmo, segue sua busca. Nunca é competição, sempre é superação. Isso faz ser prazeroso o percurso, porque são muitas as diferenças, o que traz uma enorme contribuição para o enriquecimento pessoal e coletivo. Vivencia-se e compreende-se a alteridade, experenciando-se cada segundo no meio das falas, das brincadeiras, dos cantos, das angústias, das desavenças, das contradições e daquela sábia atitude de medir, avaliar, compreender e aprender. Sabe-se como partir, não se sabe como chegar, pois há roteiros para acompanhar-se o chão, a memória histórica, mas não existe roteiro para acompanhar os pensamentos, os sentimentos. Realiza-se o velho jargão: caminheiros, o caminho se faz ao andar…

Os guaranis migravam pelos Caminhos de Peabiru buscando um paraíso em que não havia fome, doença, miséria, inveja, ambição, desamor. Onde os frutos eram abundantes e a solidariedade era a condição da imortalidade. Quando o peregrino se despe das suas obrigações, se contamina pela força da busca, do coletivo passado e presente, na natureza em que se embrenha, nas culturas em que se sente envolvido, e se entrega aos dois dias na condição de caminheiro, ouvindo o outro sem julgá-lo, apenas o reconhecendo, ele compreende um pouco dessa magia de se encontrar, de tentar ser irmão, de buscar a Terra sem Males. Sempre um exercício constante, uma surpresa.

O café com café mesmo, chá, leite, bolo, pão, margarina, doce,queijo, mussarela, melancia, banana, é servido pelos cantuenses e abastece o corpo do peregrino que aí mesmo já se enturma, já começa a aprender. A calorosa companhia dos cantuenses completa o prazer da refeição.

Izalino da Paixão traz um poema, publicado na coletânea “Poesia nossa de cada dia”, falando do Peabiru. Gentilmente o Gaúcho – Dalto Vieira, o declama, ali mesmo refeitório do Colégio:

PEABIRU, CAMINHO DA TERRA SEM MALES

Peabiru,

Caminho florido pelos índios

Seguido à procura de Deus!

Peabiru, Caminho forrado de certo gramado,

Que só vós conheceis.

Peabiru,

Caminho de índio,

Em que caminhou bandeirantes, jesuítas

E andantes de Norte a Sul…

Peabiru,

Que vem do Peru,

Atravessa os países,

Do Pacífico ao Atlântico…

Por ti caminharam

Caciques e imperadores,

Na paz e na guerra,

Cruzando estas terras,

Fazendo horrores.

Ah! Se não fossem os bandeirantes,

Que a procura dos diamantes,

Fazendo errantes

Nossos índios irmãos,

Verdadeiros povos, desta terra, mandantes!

Peabiru,

Hoje só resta a história,

Que poucos conheceram

Mesmo assim vale a pena,

Desvendar este tema,

De um passado sem fim

Por ti caminharam

O velho tropeiro

E o carro de boi

Passou o canhão

E muita munição

Em nome do progresso.

Peabiru

Continua viva a sua história

Que um dia quiseram apagar.

Chegará o momento do grande resgate

E serás no futuro

Um grande caminho.

Caminho do viajante do futuro,

O Compostela da América do Sul.

Após o café, segue-se até à praça, em frente à Igreja Nossa Senhora de Fátima. A recepção festiva que a Secretaria de Cultura promoveu, com música, fogos de artifício, não é apenas para os peregrinos, diz a secretária Kácia. É para a cidade: que se desperte a curiosidade para que todos saibam que algo bom está acontecendo, que Nova Cantu recebe os peregrinos do Caminho de Peabiru. A bela arquitetura do templo católico, com a imagem da Padroeira e dos seus três peregrinos, embelezando o jardim, contempla o coletivo desses também peregrinos, do Caminho de Peabiru. É hora de se juntar para então se dividir, para partir. Em círculo ou não, o coletivo se reúne. O peregrino Amani conduz a reflexão. A professora nova-cantuense Marlene segue com o alongamento.

Dali, segue-se até a Gruta Nossa Senhora Aparecida, na saída da cidade. Construída em 1987, o local surgiu na intenção de pagamento de promessas, dispensando a necessidade de se ir à Aparecida do Norte em São Paulo. Suas águas foram bentas pelo padre jesuíta Beno Leopoldo Petry, que a idealizou e é levada desde então para os lares dos crentes. A gruta tornou-se um marco para a região.

Na primeira entrada de Santo Rei, ainda antes da Gruta, uma pedra,com placa de bronze, colocada pela administração municipal, registra a IX Peregrinação em Nova Cantu.

Da Gruta, os peregrinos são levados até o Distrito de Santo Rei, onde tem início a IX peregrinação.

No Santo Rei, a Igreja da praça está aberta para receber os peregrinos. Também um grupo de moradores – adultos e crianças – ali esperam. Conversa-se sobre a história local, sobre o projeto de peregrinação. Santo Rei fora, antes do século XVI, intensamente povoado por grupos humanos indígenas que viviam organizados politicamente em cacicados, tinham sua cultura própria. Viveu, no século XVI e no século XVII, a invasão dos não-índios: viajantes, conquistadores, catequizadores. Foi Vila espanhola, primitiva Vila Rica do Espírito Santo, depois foi Tambo de Minas de Ferro, recebeu os jesuítas, viveu intensos movimentos de ocupação indígena e não indígena. Foi palco de conquistas e conflitos. Hoje, a cultura indígena está ainda bastante presente, mas de forma escondida, nos hábitos, nos nomes de lugares, de rios, na memória histórica, em muitos dos moradores em descendência nem sempre reconhecida.

Os peregrinos se despedem deste simbólico povoado e seguem. Alguns metros à frente, uma ala de poucos pinheiros faz lembrar a intensa e fechada mata que os abrigava, entre perobas, cedros, gurucaias, e tantas outras frondosas árvores, antes da colonização de 1939. Esses colonizadores do século XX batizaram o Distrito pelo nome do dia em que ali acamparam: o dia de Santo Rei – 06 de janeiro.

Dobrando à direita, entre os campos que expõem as recentes colheitas da soja e do milho, algumas plantações também recentes da safrinha de milho, pastos para o gado, os peregrinos vão ao encontro do rio Riozinho. Como os outros rios, ele foi importante nas diversas levas de movimentação humana que o tempo ali viu passar. Muita água e muitos peixes. Hoje, em meio aos campos, penosamente sobrevive.

Os peregrinos seguem em uma paisagem ondulada, entremeada por plantações e gados, muita pedra, em boa parte acompanham o leito do rio Can-Can que, noutro ponto, originou o nome do município de Roncador. Passam por alguns trechos margeados de matas ainda resistentes à intensa devastação.

Sol forte, muita sede, a companhia do outro e a certeza do apoio da equipe do NECAPECAM encorajam os mais temerosos. Atentos, podem ouvir o canto de pássaros, observar as marcelinhas às margens da estrada, manacás, samambaias, sentir o frescor da mata sobrevivente, o cheiro da terra que os pés e os carros levantam, fazendo pó.

Finalmente, a Comunidade do Cateto. Ela tem esse nome, contam os antigos moradores, por causa do bichinho “catitei”, como diziam os índios, que ali era abundante. O cheiro desse bichinho, um porco do mato, contaminava o ar de uma boa parte da região. Era mesmo a comunidade dos “catiteis”, que virou “catetos”. Uma professora que ali nasceu, tendo vivido a infância e a adolescência correndo pelas matas, que eram densas, relembra ainda o odor que se exalava da grande quantidade do bichinho. E eles marcavam as árvores, faziam “trios”, pois se esfregavam nelas, correndo sempre. Ainda hoje, ela diz, quem ali viveu é capaz de perceber esse cheiro, não acabou de tudo, garante, com um grande sorriso.

Os peregrinos são recebidos pelo município de Roncador. Tio Tonho, Secretário de Cultura do município, acompanha tudo: a refeição, as visitas à Igreja, a movimentação geral. Um grupo de crianças da escola fundamental, acompanhadas de suas professoras, vem também fazer parte da festa. E recebem orientação sobre a história do local, sobre as culturas que ali viveram, principalmente dos indígenas, sobre a natureza. Escutam atentamente sobre os caminhos de Peabiru. Brincam com o peregrino Amani:

Lá em cima está o tiro-liro-liro

Lá embaixo está o tiro-liro-ló

Juntaram-se os dois na esquina

Tocaram concertina,

Dançaram solidó.

Depois, são levados à Igreja e também se fartam na deliciosa comida “porco no tacho”, acompanhada de mandioca cozida, forma tradicional de alimentação na região. O motorista que acompanha os peregrinos se emociona ao lembrar-se das visitas à vó, não distante dali, muitos irmãos, primos, tios, e a matriarca da família, no terreiro, preparando, no tacho, a comida pra todos, a carne de porco. “Era isso mesmo”, desse jeito”, diz, marejando os olhos.

Dali os peregrinos seguem de ônibus até o ponto onde deve se reiniciar a caminhada. Esses parênteses, ou seja, o trecho de ônibus, se fez necessário porque o local do almoço teve que ser alterado. O que acabou sendo muito mais enriquecedor, pois fez os peregrinos entrarem em contato com a realidade do cotidiano da cultura local. Puderam presenciar o que restou de um grande núcleo de povoamento nos idos de 1960, 70. Apenas a igrejinha, o barracão, poucas casas, um comércio testemunham a intensa atividade agrícola que a Comunidade do Cateto viveu antes da mecanização.

Os peregrinos alcançam a estrada de Roncador, que sai da Comunidade do Barro Preto -hoje um assentamento- para o Aterrado Alto, onde já se divisa o município de Luiziana.

A estrada larga é margeada aqui e ali com matas que, mesmo não sendo muito densas, oferecem a confortadora sombra, o ar fresco, minorando as dificuldades que o chão pedregoso e o pó acrescentam. A paisagem se modifica pela presença dos carros que de vez em quando aparecem, completando, mesmo que tumultuando um pouco, o quadro da peregrinação. Essa estrada é muito antiga, acompanha os caminhos velhos, descobertos em meio à mata, muito densa, de quando ali chegaram os primeiros colonizadores, na época já de 1940, 1950. Contam eles, os que ainda por ali vivem, que ela margeia e mesmo atravessa um caminho muito velho, mas ainda perfeitamente visível que encontraram, feito, dizem eles próprios, por outras civilizações, não podia ser das suas, da nossa. Árvores centenárias cresciam no meio dele, o que denunciava ter ali existido e desaparecido alguma outra cultura. Também foi encontrado um local imenso, de uma área aproximada de dois alqueires, em forma de murundum, perfeitamente identificado como obra humana sobre a natureza. E não poderia ter sido de culturas não índias, garantem os bem antigos moradores. Era um imponente murundum em forma de círculo que se destacava na imensidão dos campos e das matas recuperadas. São informações que comprovam os estudos do NECAPECAM. Desde o século XVI até o XIX, XX, a região fora habitada por diferentes grupos indígenas. Em sucessivas conquistas e embates, foram desaparecendo, sendo escravizados, exterminados ou expulsos das terras, não sem antes buscarem se defender, defenderem suas moradias e territórios. Há comprovações documentais desses movimentos, mas a natureza também contribui como testemunha pelas marcas que eles nela imprimiram pelos caminhos que fizeram, pelas marcas de suas moradias que são passadas às gerações atuais por meio da memória dos antepassados.

De repente, uma surpresa: na Comunidade do Mosquiteiro, assim chamada por causa deles mesmos, dos mosquitos, confirma Celeste Fioresi, um dos mais antigos, senão o mais antigo morador dali: está havendo preparação para a festa do padroeiro São José. A comunidade consta de uma igreja, um barracão, algumas casas. Já foi também muito maior, viviam centenas de pessoas e grandes lavouras. Hoje, a mecanização só deixou esses marcos como testemunho. Os peregrinos se enturmam. A generosidade e hospitalidade dos moradores permitem uma agradável parada. E os peregrinos puderam conhecer outra realidade cultural desse interior paranaense: das festas religiosas locais. Na sua preparação podemos vislumbrar e confirmar o dito popular de que “as vésperas é que são festas”. Fogos de artifício entremeiam o fazer das mulheres na cozinha: pães, bolos, bolachas. E dos homens no churrasqueado ainda tradicional da carne de gado no espeto de bambu, temperada de véspera. Os homens assam alguns espetos para os trabalhadores e organizadores da festa e os oferecem com fartura aos peregrinos. Depois da água, da comida, da conversa animada, dos abraços, dos encontros, do descanso merecido, a caminhada continua. Bem longe dali ainda podem os peregrinos ouvir o estalar dos fogos de artifícios – os “rojões” -que funcionam como convite aos moradores da região para a grande festa de comemoração do dia do Padroeiro São José, feita com atraso neste ano – dia 19 de abril ( o dia de São José é 19 de março).

E é ali que os peregrinos passam pelo seu maior desafio: a subida do Mosquiteiro. Ela é conhecida pelos moradores como “tira-teima”, “tira-prosa”. Ou, ainda ali se dava sentido a um famoso jargão dos velhos motoristas “Pago o estrago, mas não perco o embalo”, que traduz o sentimento que animava a população na época em que a estrada era o único meio de comunicação e transporte da região para o Sul.

O rio Mosquiteiro se faz presente já bem antes da ponte pelo chiado das águas, mas está difícil para os peregrinos, que sempre gostam de uma molhadinha nos pés. Quase inacessível.

O velho cemitério ainda está muito bem cuidado. Pouco antes dos peregrinos chegarem, passou o Padre com alguns fiéis, fazendo as orações que são tradicionais na região, depois da Páscoa: a de benzer os túmulos. Um ritual conhecido como “Bênção pascoal do cemitério”. Por isso é que os peregrinos podem admirar o capricho em que se encontram os silenciosos leitos, com as pedras que entornam seu campo santo, pintadas a cal, todo o terreno carpido, as árvores podadas e também pintadas a cal, as flores protegidas e bem à mostra, tudo muito limpinho. A visitação ali é intensa por mais ou menos dois ou três dias.

Um pouco mais à frente, algumas casas. Ali já foi uma povoação muito importante até bem pouco tempo, nos anos setenta, oitenta, até que a mecanização da soja modificasse tudo. Já teve escola, cuja professora ainda vive no mesmo local, já teve venda, farmácia, muitas casas. Dali é que se avistava o murundum de que falamos acima, cortado no meio pela estrada de índios que vinha de Guarapuava, de Pitanga, diz o morador que encontrou, também, pescando lá no rio Cantu, uma peça de ferro muito estranha, que entregou ao NECAPECAM para pesquisas. Um murundum de dois alqueires, mais ou menos, redondo, bem redondo, com até outra paisagem, que deixava o aterrado ainda mais alto. Ainda tem também o velho “mictório” ou “privada” da escola criada agora no tempo mais recente. Muitas memórias se cruzam neste local. De antes do século XVI, quando só os indígenas habitavam essas paisagens, do século XVI, XVII, quando os europeus espanhóis, civilizadores e catequizadores fizeram suas passagens, quando os bandeirantes paulistas vieram em missão de destruir e escravizar, Do século XIX, quando os campos do Paiquerê ou de Mourão começaram a ser alvo de novo da cobiça expansionista, e finalmente da colonização desse século XX que está ainda tão presente entre os moradores locais.

Os peregrinos por ali passam e costuram novo pedaço dessa memória. Seguindo, uma outra subida, que já foi bem maior que a do Mosquiteiro. Chegou essa subida a dar nome à comunidade: Comunidade da Estiva. Dizem os moradores, entre eles o seu Miguel Burak, que tão gentilmente acolheu os peregrinos para o jantar e o pouso do dia, que o nome se deve ao estivado que se fazia para poderem passar as carroças, os carros e caminhões em dias de chuva. A subida era medonha. Não dava mesmo pra seguir no barro. Então, fazia-se como se fosse um tapete de paus roliços, mesmo de bambus, qualquer coisa semelhante, que se amarravam, entrelaçavam, e se colava isso na estrada para ficar mais firme e os pneus poderem rodar. Se não fizesse assim, “batinava”, “batinava” e ninguém subia mesmo. Depois, de tanto aplainar, acabou ficando uma subida mansa, mais fraca que a do Mosquiteiro, como é hoje.

Ali fica o Sr. Burak. Miguel Burak. Solitário, não quer abandonar o local onde cresceu, se casou, teve os filhos, todos eles “bem de vida” e com saúde, e onde agora viuvou.Sua casa, os barracões, a Igreja são o centro de uma movimentação ainda importante para a região. É preciso continuar cuidando das preciosidades que ficaram, como a própria Igreja da Imaculada Conceição, cuja festa de homenagem se dá em 08 de dezembro. E acontece todos os anos, a exemplo do que os peregrinos viram na Comunidade do Mosquiteiro. Seu Miguel, velho guerreiro, cuida de tudo, com muita generosidade, muita disciplina e compromisso. Foi o pai quem construiu, seguindo o mesmo modelo da igreja de lá de onde veio, do Rio Negrinho, em Santa Catarina, em 1940.Quando os peregrinos chegam, estão também presentes ali as jovens que administram atualmente como presidentes o movimento religioso da paróquia. Em estilo ucraniano, paredes duplas, pintada de azul claro, toalhas rendadas, bordadas, bancos de imbuia muito lustros, vitrais que lembram a santa padroeira, flores, castiçais, confessionário, coro e altar, a Igreja é a presença viva de Deus e da força dessa gente tão especial. Um encantamento. Sublime espaço da intenção franca de preservar o bem, a pureza, em meio a tantas dificuldades humanas. O Cruzeiro à frente traz inscrita a frase “Salve sua Alma” também em ucraniano.

Seu Miguel conserva e preserva. Plantou três mil mudas de árvores, um bosque só de pinheiros também, esse ao lado do barracão que serviu de pouso aos peregrinos. E sabe que é preciso cuidar. Daqui a quinze anos, diz ele, é necessário realizar o desbaste. Há ainda muito o que se fazer por ali. Está preocupado porque a água na região já está se tornando escassa. Ele mesmo, ali, fica de vez em quando, em falta. Por isso, o banho dos peregrinos foi controlado. Mesmo com todo o risco, seu Miguel os acolheu com todo o carinho. Depois dos banhos, desligou registros, para que de manhã pudessem todos se lavar, e para que se pudesse preparar-se o desjejum. Ninguém sentiu a falta da água, ele administrou com maestria o problema. À hora do jantar, humildemente se colocou entre os peregrinos, jantou, conversou, acolheu. Na manhã seguinte, mandou abrir a Igreja para que fossem rezar. Ou apreciar a arte do templo cristão. Sempre explicando, sempre atento, foi um Mestre, um companheiro que se tornará inesquecível para os peregrinos dos Caminhos de Peabiru, com certeza. Muito obrigada, amigo.

O jantar na Comunidade da Estiva foi especial. A galinhada foi feita pelo marido da Coordenadora do NECAPECAM, o Miranda –José Miranda da Silva Filho, com seus companheiros Orovaldo Colchon, Deferson Lessak e Carlão. Uma delícia, não dá pra esquecer. Sem contar o caloroso apoio que deram ao evento. O churrasco, “carne cigana”, feito pelo próprio Secretário de Cultura de Roncador, o Tio Tonho, estava saborosíssimo e foi também uma preciosidade. Tudo acompanhado de música do sanfoneiro e violeiros mais famosos de Roncador. Uma honra. Também se apresentaram os jovens de uma nova banda da cidade. Aliás, Roncador se destaca nesse campo, o Tio Tonho também é músico, além de desenvolver outras atividades artísticas.o Tio Tonho, vereadores e membros da comunidade estavam lá, prestigiando o momento. Muitas histórias Tio Tonho contou, dos avós ciganos, do monge João Maria d’Agostini, da cultura local.

Noite adentro e à roda da fogueira, um grupo de peregrinos palestrou e filosofou animadamente. Madrugada, os cães latiram muito…

Manhã chegando, chega dona Maria Helena, moradora dali, do Aterrado Alto, que é uma denominação genérica das comunidades, com os quitutes que preparou para o café. Fez bolos, tortas e pães, acrescentou queijo, mussarela, margarina, fez chá, café, trouxe leite, não tinha como caprichar mais.

Terminado o café, ficou o convite para se visitar a Igreja, refletir. Os peregrinos foram informados de que dali por diante a peregrinação se daria por uma estrada plana, mas ainda com algumas ondulações de relevo, até a Comunidade da Pranchinha, município de Luiziana. Na verdade, a estrada ali tem as fronteiras de municípios um pouco indefinidas, ora um e outro se misturam, dizem os moradores.

O mapa consta de um roteiro que segue adiante, até Campina do Amoral, mas, se for segui-lo, pode não ser possível alcançar o almoço oferecido pelo município de Luiziana. Por isso, pede-se que se caminhe apenas até a Comunidade da Pranchinha.

A manhã é calma, muito pó, sol forte. Os carros de apoio dão suporte, a Comunidade da Pranchinha chega logo. Dali, o ônibus levará até a cidade de Luiziana, onde os peregrinos terão o almoço, juntando-se aos cavaleiros, que fazem neste dia a “Cavalgada do Descobrimento”.

Mas é ainda muito cedo quando os peregrinos alcançam a Comunidade da Pranchinha. Então, para dar continuidade à caminhada e não prejudicar a logística da organização, seguem a pé o roteiro até a cidade, sugerindo que o ônibus os alcancem. Quando o ônibus alcança os peregrinos, acolhe-os.Nesse percurso, porém, apesar dos desencontros e dúvidas, acaba-se por se peregrinar por uma localidade muito importante para a história da região e que também hoje já não existe mais: a Comunidade da Campina da Lizeta. Esse local era a estalagem dos primeiros colonizadores que iam para ocupar Campo Mourão. Conta um dos mais antigos, dos Teodoro, que dali vinham de Pitanga, Bourbônia e por ali seguiam. Assim, para o sentido e objetivo da peregrinação, o que parecia ser problema foi solução. Ou seja, o desvio levou para um ponto que tem muita significação no mapeamento turístico dos Caminhos e precisa ser peregrinado.

Pouco mais adiante, avistam-se os cavaleiros, razão da programação do almoço em Luiziana. Assim, foi possível descer do ônibus e novamente continuar a peregrinação até a cidade de Luiziana, no local do almoço, percorrendo aproximadamente os quilômetros previstos, cumprindo os objetivos da IX Peregrinação.

O almoço teve início com as considerações da administração municipal, que saudou peregrinos e cavaleiros. A Coordenadora do NECAPECAM, Marilene C. de Miranda da Silva agradeceu a todos – apoio, convidados e peregrinos. O cardápio constou de uma deliciosa carne de panela, mandioca, arroz e salada.

Após a refeição, os peregrinos foram conhecer a Cachoeira do Rio Sem Passos. O município de Luiziana se destaca pelas imponentes quedas d’águas, essa é uma delas. Os peregrinos se fartaram nas águas geladas, brincando e confraternizando. O “piscinão”, do outro lado da estrada, na verdade é um ponto de passagem usado no tempo em que não havia a ponte. Os peregrinos ali também brincam muito e ali se tira a foto de despedida.

Os peregrinos de Maringá, que estão com veículo próprio, dali se despedem. Os demais, seguem de ônibus até Campo Mourão, ao som gostoso e divertido do fundão, promovido pelos universitários de Turismo da FECILCAM, acompanhando o colega Mário no violão, o Gaúcho e companhia, encerrando com seu carinhoso adeus:

“Tiau, tiau, tiau amor,

Vou m’embora mas te levo no pensamento pra onde eu for…”

Até a próxima, amigos, e muito obrigada!

PEREGRINOS E EQUIPE DE APOIO DA 9ª PEREGRINAÇÃO

Peregrino

Cidade/Est.

Cristina Pienaro

C.Mourão

Izalino Inácio Paixão

Ubiratã

Manoel Massaranduba

Ubiratã

Silvio Cezar Walter

C.Mourão

Raquel E. L. da Silva

Maringá

Marcos A. Puzzi

Maringá

Daltro Ângelo Vieira

Cascavel

Siro Canabarro

Cascavel

Elizabeti G. Silva

Maringá

Marcos Devonsir Carraro

Maringá

Edson Hideo Zenke

Maringá

Valter F. de Araujo

Maringá

Jair Avelino Jacovos

Maringá

Maria Eliana Ferreira Jacovós

Maringá

Artur A. de Oliveira

Cascavel

Vera C. Busetti de Oliveira

Cascavel

Christine Siebje Mancinelli

Joinville(SC)

Ricardo G. Moreira

Joinville(SC)

Sirlei B. Shima

C.Mourão

José Vanderlei Dissenha

Curitiba

Pauletto Porcu

Maringá

Antonio Fiel Cruz Junior

Maringá

Amani Spachinski de Oliveira

C. Mourão

João Emmanuel D. de Jesus

C. Mourão

Mario Emmanuel Vieira de Jesus

C. Mourão

Bruna Mantuan Ferro

C. Mourão

Karina Daniel Pedrolo

C. Mourão

Fabíola Lemes

C. Mourão

Renato Nicolin

C. Mourão

Eder de Oliveira Maciel

C. Mourão

Priscila Amaral Jarutais

C. Mourão

Carmen Souza Casarin

C. Mourão

Icaro Osinski Soares

Araruna

Natalia Raffaele Costa

C. Mourão

Talita Almeida

Mambore

Elaine Evangelista Domene

Goioerê

Alexandra Siqueira

C. Mourão

Karina Aparecida Soares

C. Mourão

Nobuco Nakasato

Sinclair Pozza Casemiro

C. Mourão

Nova Cantu

CAVALEIRO

Neuso de Oliveira

Mamborê

APOIO

Jairo de Araujo

C. Mourão

Ian Félix

C. Mourão

Vanessa Vieira

C. Mourão

Walter da Silva Halateno

C. Mourão

Jaurita Lessak

C. Mourão

Marilene Celant M. da Silva

C. Mourão

Maria Luiza da Silva

C. Mourão

Antonio Gancedo

C. Mourão

Dinora Gancedo

C. Mourão

Branco

C. Mourão

Vanderlei

C. Mourão

Orovaldo Colchon

C. Mourão

Carlão

C. Mourão

Deferson Lessak

C. Mourão

José Miranda da Silva Filho

C. Mourão

Juarez Machado Portela

Roncador

Miguel Burak

Luiziana

Maria Helena Urhen

Roncador

Bodan Urhen

Roncador

Marlene (professora Educação Física)

Nova Cantu

Lazaro

Eng. Beltrão

Bruno

C. Mourão

Sabrina de Assis Andrade

C. Mourão

Ryan Lebre

C. Mourão

www.caminhodepeabiru.com.br

Casa do Ipiranga

A Casa do Ipiranga foi construída na época da abertura da estrada de ferro Paranaguá/Curitiba. Era residência do Engenheiro Fiscal do Trafego e também posto de telégrafo. O local onde ela foi construída, próximo ao Rio Ipiranga, no cruzamento com o Caminho do Itupava, tinha sido utilizado no inicio das obras da estrada de ferro, como acampamento de operários. Anos depois ela foi utilizada como clube de lazer pelos engenheiros da rede ferroviária, até a privatização da estrada de ferro em 1997. Antes da privatização a Casa do Ipiranga era preservada pela RFFSA – Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima. Após 1997, quem ficou responsável pela Casa do Ipiranga foi a FSA – Ferrovia Sul Atlântico, posteriormente tendo seu nome mudado para ALL – America Latina Logística. Após essa mudança de controle, infelizmente a Casa do Ipiranga foi sendo abandonada e aos poucos foi destruída por vândalos. Dessa forma uma construção de rara beleza e de importância histórica para o Paraná, acabou sendo destruída. Diferente da RFFSA, que além do lucro visava também á preservação do patrimônio da ferrovia, a ALL parece visar tão somente o lucro. Exemplo disso é que além da Casa do Ipiranga, várias outras casas de menor importância e beleza, que eram utilizadas por trabalhadores da rede ferroviária, estão abandonas ao longo da estrada de ferro, sendo depredadas e consumidas pelo mato.

Na Casa do Ipiranga viveu durante algumas temporadas um dos maiores pintores paranaenses, Alfredo Andersen, que era norueguês, mas passou a maior parte de sua vida no Paraná. Nessas breves temporadas Andersen registrou as lindas paisagens da Serra do Mar em suas telas a óleo.

A Casa do Ipiranga foi construída em alvenaria de tijolos sobre uma base de pedras. Ela possuía sala de estar com lareira, cozinha, sala de jantar e banheiro no térreo. No pavimento superior tinha três dormitórios e outro banheiro. Já no porão ficavam armazenadas ferramentas e outros materiais. Nos fundos foi posteriormente construído um apêndice, onde ficava uma sala de jogos toda envidraçada. Também nos fundos existia uma grande piscina com fundo em declive, alimentada de água corrente. Próximo a casa ainda existia uma pequena estufa construída com trilhos e a residência do caseiro.

Acho interessante contar que no inicio a estrada de ferro se chamava Paranaguá/Curitiba, pois a cidade de Paranaguá era mais antiga e importante comercialmente em razão do seu porto. Anos depois Curitiba acabou crescendo e ficando mais importante, então a estrada de ferro passou a ser conhecida como Curitiba/Paranaguá.

A Casa do Ipiranga quando ainda estava inteira. (fonte da foto: http://itupava.altamontanha.com/ipiranga.asp)
A Casa do Ipiranga quando ainda estava inteira. (fonte da foto: http://itupava.altamontanha.com/ipiranga.asp)
A Casa do Ipiranga em 11/04/2009.
A Casa do Ipiranga em 11/04/2009.
Lareira, piscina, fundos e laterais da Cada do Ipiranga nos dias atuais.
Lareira, piscina, fundos e laterais da Casa do Ipiranga nos dias atuais.
Pintura de Alfredo Andersen.
Pintura de Alfredo Andersen.

Caminho do Itupava

No sábado pela manhã, eu e Hiroo, meu vizinho, fomos fazer o Caminho do Itupava. Esse caminho foi aberto entre os anos de 1625 e 1650. Por quase três séculos foi o único caminho entre o litoral paranaense e a região de Curitiba. Algumas fontes contam que ele foi aberto pelos portugueses, outras dizem que foi por caçadores indígenas. Boa parte do caminho é calçado com pedras e alguns registros dizem que esse calçamento foi feito pelos Jesuítas, outros dizem que foi por escravos. A caminhada se inicia a 1.000 metros de altitude, sendo que o final está praticamente ao nível do mar. Nos últimos anos o caminho passou por algumas modificações, como a colocação de pontes por sobre os rios que cortam o caminho, mas a maior parte permanece da mesma forma como na época em que os primeiros viajantes a subir a Serra do Mar trafegavam por ali. Já percorri o caminho uma vez em 2002, mas seguindo um pouco pela estrada de ferro e atravessando a Represa da Copel que existe logo no inicio da Serra. Dessa vez seguimos pelo caminho original, sem atalhos.

Fomos de carona com o pai do Hiroo, até o ponto inicial do caminho, na cidade de Borda do Campo. Após preencher um cadastro obrigatório do Posto do IAP, iniciamos a caminhada ás 08h00min. O clima estava bom para caminhar, fazia sol e um friozinho simpático. Nossa meta era percorrer os 16,3 km do Caminho do Itupava e depois seguir mais 3,7 km até a Estação de trem do Marumbi, para pegar o trem de passageiros que segue para Curitiba quase no final da tarde. Caso ocorresse algum imprevisto e perdêssemos o trem, nossa meta seria andar mais 8 km até Morretes e voltar de ônibus para Curitiba.

No inicio da caminhada imprimimos um ritmo forte, que serviu para esquentar o corpo. Eu estava caindo de sono, pois tinha saído na noite anterior e dormido menos uma hora e meia. Ou seja, era algo insensato fazer uma caminhada tão longa após uma noite mal dormida. Mas resolvi arriscar, confiando em minha raça e força de vontade. Meu único receio continuava sendo o tendão do pé direito, que não está cem por cento.

O trecho inicial do caminho passa por uma pedreira abandonada e por algumas trilhas de terra em meio á mata. Alguns trechos de subida não muito forte se alternavam com descidas. Somente após uma hora de caminhada é que passamos a caminhar pelo trecho de pedras original do Caminho do Itupava. Daí o cuidado tinha que ser redobrado, pois estava tudo úmido e escorregadio. Ao chegar no primeiro rio, atravessamos pela ponte que foi colocada no local. Da outra vez que passei por ali, tinha atravessado o rio com água no meio da coxa. Era mais emocionante atravessar pelo rio, mais como a água estava gelada, resolvi deixar a emoção de lado e atravessar pela ponte. Nossa primeira parada foi na Casa Ipiranga (em outro post conto a história desse local). Tiramos algumas fotos, demos uma olhada pelo lugar, ou melhor, pelo que sobrou do lugar, e subimos alguns metros pelo trilho do trem até onde existe uma pequena cachoeira e uma roda d’agua. Tinha uma porção de gente acampada ali e ficamos um tempo descansando e conversando com dois caras que estavam totalmente bêbados e drogados. Os caras eram repetitivos e não falavam coisa com coisa. Verificando o relógio, o mapa de quilometragem e horário da trilha, descobrimos que estávamos pouco mais de uma hora abaixo do tempo estipulado no mapa. Ou seja, podíamos até diminuir nosso ritmo, que teríamos tempo de sobra para cumprir nossa meta, que era pegar o trem na Estação Marumbi.

Resolvemos partir e alguns metros abaixo seguindo pelo trilho do trem, reencontramos o Caminho do Itupava. Esse trecho se mostrou difícil, com muita subida e alguns lamaçais que mais pareciam areia movediça. Tivemos que tomar muito cuidado para não escorregar e nem ficar atolados ao passar pelos lamaçais. Começamos a encontrar vários grupos de pessoas, que aproveitando o feriadão e o tempo bom, também se aventuravam por ali. Em alguns trechos tínhamos que diminuir o ritmo e andar atrás destas pessoas. Mas logo passávamos por elas e continuávamos em nosso ritmo. E assim seguimos por toda a manhã, subindo morro, descendo morro, cuidando pra não cair. O Hiroo caiu sentado duas vezes, eu passei ileso. Foram apenas alguns escorregões sem queda e alguns furos de espinho na mão. Teve um momento em que tive que escolher entre cair ou segurar numa árvore cheia de espinhos. Escolhi os espinhos.

Atravessamos alguns riachos e rios não muito grandes, quase sempre pulando de uma pedra a outra. Todos eram de água cristalina e serviam para matarmos nossa sede. Logo começamos a ouvir o barulho dos trens e sabíamos que nossa meta para descanso e almoço estava próxima. O pior trecho acabou sendo a descida do morro que leva até o Santuário de Nossa Senhora do Cadeado (em outro post conto sobre esse local). É uma descida muito inclinada e por sorte, na parte final foram colocados abençoados corrimões. No Santuário aproveitamos para descansar e lanchar. Parece que os demais grupos também tiveram a mesma ideia. A vista dali é muito bonita, em frente da para ver boa parte da estrada de ferro e muitos morros.

Após o “almoço” e o descanso, retornamos ao caminho, dessa vez morro abaixo. Esse trecho final é complicado, pois a descida é íngreme e as pedras escorregadias. Mas correu tudo bem e após quase uma hora de caminhada chegamos na parte plana, e atravessamos por pontes dois rios e alguns riachos por pinguelas. E finalmente chegamos ao fim do caminho. O caminho original seguia até Paranaguá, mas ele não existe mais, sobre seu trajeto original foram construídos estradas e até uma BR.

Tínhamos tempo de sobra até pegar o trem, então subimos tranquilamente morro acima em direção ao Marumbi. Paramos na Estação Engenheiro Langue, que está abandonada, mas foi reformada faz alguns anos. Ali existe um vitral muito bonito, mas que está com vários pedaços quebrados. O que dá pena mesmo são das casas abandonadas. No passado elas eram utilizadas pelo trabalhadores da Rede Ferroviária Federal. Bem que a ALL (America Latina Logística) que tem a concessão da Rede Ferroviária naquele lugar, poderia reformar estas casas e utilizá-las como pousada ou algo parecido. Após um breve descanso e algumas fotos, seguimos pela trilha de 850 metros que leva até a Estação Marumbi. Essa trilha corta caminho e passa pelo trilho do trem. O trilho faz algumas voltas até chegar a Estação. No caminho paramos para ver um trem de carga descendo a serra carregado. É algo bonito e barulhento de se ver. Mais alguns minutos de caminhada e finalmente chegamos na Estação Marumbi. Foram 07h10min de percurso, sendo 06h10min de efetiva caminhada e 01h00min de descanso. A estação estava cheia de gente e ficamos descansando até a chegada o trem, que atrasou um pouco.

Ás 16h10min, embarcamos no trem e fomos observando a maravilhosa vista da serra do mar. Alguns lugares por onde passamos são de dar medo, mas a beleza da paisagem compensa qualquer coisa. Chegamos em Curitiba no inicio da noite, cansados, doloridos, mas felizes e realizados por termos cumprido com exito o desafio proposto. Agora é descansar e planejar a próxima aventura.

Caminho do Itupava e Casa Ipiranga.
Caminho do Itupava e Casa Ipiranga.
Água cristalinas.
Águas cristalinas.
Santuário de Nossa Senhora do Cadeado.
Santuário de Nossa Senhora do Cadeado.
Trilho, tunel e trem...
Túnel,  trem e trilho…
Trechos do Caminho do Itupava.
Trechos do Caminho do Itupava.
Sobre os trilhos.
Sobre os trilhos.
Estação Engenheiro Langue.
Estação Engenheiro Langue.
Estação Engenheiro Langue e Eatação Marumbi.
Estação Engenheiro Langue e Estação Marumbi.
De trem rumo a Curitiba.
De trem rumo á Curitiba.

My Happy Birthday

Acordei com o barulho de um panelaço na porta de meu quarto. Depois de dormir pouco, não foi nada agradável acordar assim no dia de meu aniversário de 39 anos. Com muito custo sai da cama e fui tomar um longo banho pra tentar acordar. Depois fui lá fora olhar a paisagem e o espetáculo era belo, fazia um dia muito bonito. Tivemos seminário a manhã toda e foi difícil manter os olhos abertos. Acabei dando umas cochiladas e no intervalo para o lanche fui obrigado a tomar café (algo de que não gosto) e sem açúcar. Daí cantaram parabéns e fiquei todo sem jeito, meio encabulado, mas foi divertido e fazia tempo que não ganhava tantos abraços e beijinhos. Ainda bem que a mulherada era maioria. Antes do almoço demos mais uma volta e fomos até a cachoeira. Depois teve um suculento almoço, onde me acabei de tanto comer, pois eu merecia, já que era meu aniversário.

A volta pra casa foi tranqüila, mas eu estava quebrado, caindo de sono. Mas como bom dono de casa que sou, antes de descansar perdi um tempão lavando roupa e limpando casa. Depois pude dormir um pouco e a noite para finalizar as comemorações de meu aniversário, sai com a Kaciane. Fomos jantar em um restaurante de comida mineira e a meia-noite assistimos uma peça de teatro no Lala Schneider. A peça era divertida e mesmo cansado e com sono valeu a pena. Era uma comédia, “A Casa do Terror 3”. E assim foi o dia em que soprei 39 velinhas. O pior é que não me sinto com essa idade! Ou seria, o melhor é que não me sinto com essa idade? O importante é que cheguei até aqui e pretendo ir muito mais longe. Pra quem veio ao mundo por descuido e quase morreu nos dois primeiros anos de vida, chegar aos 39 anos é uma dádiva de Deus. Então agradeço sempre essa dádiva e vou seguindo em frente, correndo atrás de meus sonhos e procurando ser feliz…

Amanhecer do dia 04 de abril.
Amanhecer do dia 04 de abril.
Indo pra cachoeira.
Indo pra cachoeira.
A pequena e bela cachoeira.
A pequena e bela cachoeira.

Seminário de novos

Na sexta-feira e no sábado, teve seminário para funcionários novos na chácara do colégio que fica em Piraquara. Mesmo não sendo um funcionário novo, fui participar. Saímos do colégio no final da tarde e após 30 km, metade em asfalto e metade em estrada de chão, chegamos ao nosso destino. A chácara fica no inicio da Serra do Mar, num lugar muito bonito cercado de mato, “no pé” de alguns morros. Estávamos em aproximadamente 50 pessoas e quando fui procurar meu quarto na lista, descobri que tinham esquecido de me incluir na lista de participantes e o único quarto vago ficava justamente na ala feminina. Para piorar o quarto não tinha chave e o trinco de dentro não funcionava. E pra piorar ainda mais, logo apareceu uma gaiata e disse que por ser meu aniversário no dia seguinte, a mulherada ia me sacanear. Fiquei de olho, cuidando para que ninguém entrasse no quarto. Mas acabei esquecendo de trancar direito a janela e foi por ali que entraram e deram nó em toda minha roupa, só não deram nó nas cuecas. Até meu colchão desapareceu. Tivemos o inicio do seminário com uma discussão em grupos que foi bastante interessante. Depois teve janta regada a muita lasanha e como não tinha almoçado, me acabei de tanto comer. O ponto negativo foi que acabou a energia e ficamos no escuro total. Depois de um a rápida chuva o tempo começou a limpar e fomos numa turminha bater papo do lado de fora do prédio. O papo estava bastante animado e como o céu foi limpando cada vez mais, a lua surgiu e resolveram ir passear no escuro, até a entrada da chácara, onde existe um lago. Foi meio complicado caminhar no escuro em alguns trechos onde tinham árvores e a luz da lua não clareava. Não faltaram escorregões e pisadas em bosta de vaca. Eu fui um dos premiados e além de pisar, escorreguei num monte de bosta e quase cai sentado. Nosso passeio no escuro foi divertido e demos boas risadas e “micos” é que não faltaram. O maior de todos foi a Juliana H. que ao se afastar de costas para tirar uma foto do pessoal, caiu num barranco de cara numa árvore. Após o susto demos muitas risadas, mas quase que ela se machuca. E pior seria se ela tivesse caído do outro lado da estradinha, onde fica o lago. Outro fato curioso foi ao tirar uma foto com o Alysson, um morcego passou voando sobre nossas cabeças. Na foto aparece o Alysson olhando para cima, mas o morcego não aparece. Agora em vez de dizer “olha o passarinho” ao tirar fotos, melhor dizer “olha o morceguinho”. Fizemos o caminho da volta pouco depois da meia-noite e tive direito a “parabéns pra você” e cumprimentos no escuro, pois já era dia quatro, dia de meu aniversário. Acabei indo dormir bem tarde, pois fiquei conversando com o pessoal.

Na chegada encontramos um lindo por do sol.
Na chegada encontramos um lindo por do sol.
Perdido no meio da mulherada.
Perdido no meio da mulherada.
Passeio sob o luar.
Passeio sob o luar.
Parabéns pra você, nessa data queirda...
Parabéns pra você, nessa data queirda…