Caminhando sob chuva e a cada minuto mais aliviado por ter recuperado minha mochila, fui seguindo meio sem rumo pelas ruas da cidade. Resolvi entrar numa lan house para fugir da chuva e também pra dar notícias ao pessoal de casa. Perguntei onde ficava a Plaza de Armas, que é o centro da cidade e em cuja região pretendia me hospedar. E junto perguntei sobre a rua onde ficava a agência onde eu devia fazer o pagamento da segunda parcela do pacote para a Trilha Inca. No Brasil eu havia pago 50% do valor para a empresa Brasil de Mochila e agora deveria quitar o restante junto a agencia local e obter informações para a partida rumo a Trilha Inca no dia seguinte. Descobri que estava bem próximo de ambos os endereços que procurava, então resolvi seguir a pé. Primeiro passei na agencia do senhor Rimber, mas o mesmo não estava. Então resolvi seguir para a Plaza de Armas. Após caminhar alguns metros senti uma forte tontura e então me lembrei do mal de altitude, mais conhecido como soroche. Os sintomas do soroche são: dor de cabeça, tontura, dores de estômago e cansaço. A cidade de Cuzco fica a 3.400 metros acima do nível do mar, nessa altitude o ar tem baixa pressão atmosférica e conseqüentemente menos oxigênio. Com baixa pressão de oxigênio, os glóbulos vermelhos (hemácias) não conseguem pegar a quantidade mínima de oxigênio para o correto funcionamento do metabolismo e não “rendem” o que deveriam. Resumindo, fiquei com dor de cabeça e dificuldade para respirar, no popular, me faltava ar. Também fiquei meio tonto, parecia que minha antiga labirintite tinha vindo fazer uma visita. Diante de tal quadro acabei não conseguindo encontrar o hotel que tinha visto na internet e acabei entrando em um que achei simpático e cujo preço era igual ao que pesquisei na net. O hotel estava bem localizado, muito próximo a Plaza de Armas, que é o point da cidade.
Fiz os tramites burocráticos e me hospedei no Hotel Sol Plaza Inn. O hotel era simpático e mais tarde descobri que o local tinha sido o antigo Palácio Qasana, residência do Inca Pachacuteca. Descansei um pouco e logo saí para comprar alguns itens que faltavam para levar para a Trilha Inca. Também aproveitei para passar em uma farmácia e comprar algumas Sorojchi Pills, pílulas que ajudam a combater o mal de altitude. Não precisei comprar uma caixa, me venderam quatro pílulas a granel. Liguei para o dono da agência e ele mandou uma funcionária até o hotel receber o restante do pagamento pela Trilha Inca e também me explicar os detalhes finais do que estava contratando. Voltando para meu quarto, no caminho vi duas moças e notei sobre uma mesa onde uma delas separava alguns papéis, uma identidade brasileira. Puxei conversa e descobri que eram quatro amigas viajando juntas, todas do Rio de Janeiro. Três estava fazendo aniversário meio juntas e me convidaram pra mais tarde comer o bolo. Saí mais algumas vezes do hotel para conhecer as redondezas e também para comprar água e um bastão para caminhada, o que seria muito útil na trilha.
Sentia-me cada vez mais tonto e tomei um pouco de chá de coca e masquei algumas folhas de coca. O gosto era horrível, mas deu uma boa aliviada na tontura. Andei mais um pouco pelas proximidades do hotel, comprei água, chocolate e um casaco. Estava fazendo frio em Cuzco e fiquei com receio de que na Trilha Inca estivesse muito frio e os casacos que trouxera do Brasil não fossem suficientes. Voltei ao hotel e encontrei ás quatro cariocas: Renata, Alessandra, Patrícia e Fabiana. Cantamos parabéns, comemos bolo e conversamos um pouco. Elas iam embora de Cuzco naquela noite, rumo à cidade de Puno. Despedi-me delas, deixei o endereço do blog e fui para o quarto descansar e arrumar minha mochila para no dia seguinte encarar a Trilha Inca. Arrumar a mochila foi complicado, pois não podia levar muito peso pra carregar na trilha, pois além do peso tornar a caminhada mais difícil, venho de duas hérnias de disco e não posso arriscar a exagerar no peso e machucar minha coluna novamente. Sei que fiquei um longo tempo colocando e tirando coisas da mochila, até que cheguei numa definição do que levaria. No final a mochila pesava uns 12 quilos e como nesse peso estavam computados duas garrafas de água e alguns biscoitos e chocolate, a tendência era que o peso da mochila fosse ficando menor a cada dia de caminhada. Levei água suficiente para o primeiro dia e meio e algumas pílulas bactericidas para colocar na água que pegaria nas montanhas após meu estoque de água engarrafada acabar.
Antes de ir dormir resolvi ir fazer um lanche e como não sou fã de comidas locais, me garanti indo no único McDonalds da cidade, que ficava a pouco mais de 100 metros do hotel. Na fila do caixa um cara ficou me olhando e perguntou se eu era brasileiro ao me ouvir falar “obrigado” e não “gracias” para a atendente do caixa. Esse brasileiro estava com mais quatro amigos e fiquei um pouco conversando com eles. Na hora de sair vi minhas quatro amigas cariocas numa mesa e fui me sentar com elas. Elas iam pegar o ônibus para Puno, na praça em frente ao Mac. Fui com elas até o local do embarque, nos despedimos e voltei para o hotel dormir. Os próximos dias seriam difíceis, três noites dormindo em barraca, comida que não seria das melhores, frio, chuva, calor, mosquitos, altitudes acima de três, quatro mil metros. Resumindo, um grande desafio, uma grande aventura, ao mesmo tempo que era excitante pensar nos próximos dias, dava um certo frio na barriga ao pensar em tudo o que poderia acontecer. Mas ia fazer algo que desejava fazer havia vários anos, realizar uns dos sonhos pendentes de minha lista de sonhos e vontades a realizar antes de morrer. E nesse turbilhão de pensamentos adormeci. Acordei algumas vezes com falta de ar e tive uma noite horrível sofrendo com o mal de altitude.