Expedição Franklin

A Expedição Franklin foi uma missão britânica de exploração ao Ártico liderada pelo explorador Sir John Franklin em 1845. O objetivo era encontrar a Passagem Noroeste, uma rota marítima que ligaria o oceano Atlântico ao Pacífico pelo norte do Canadá. A expedição partiu com dois navios, o HMS Erebus e o HMS Terror, transportando 129 tripulantes.

Inicialmente, a expedição parecia promissora. Franklin, de 59 anos, contava com a experiência de seus oficiais superiores, Francis Crozier e James Fitzjames, ambos veteranos da exploração polar. Além disso, o Erebus e o Terror haviam sido especialmente adaptados para enfrentar as adversidades do Ártico. Suas proas foram reforçadas com camadas extras de madeira e ferro para resistir ao gelo. As embarcações estavam equipadas com motores a vapor para complementar as velas, sistemas de aquecimento e equipamentos para a produção de água doce. O suprimento incluía gado, porcos e galinhas, além de três anos de sopas e vegetais enlatados. Essa era a maior, mais tecnológica e mais bem equipada expedição polar realizada até então.

A expedição partiu da Grã-Bretanha em 19 de maio de 1845. Franklin comandava o Erebus, com Fitzjames como seu segundo em comando, enquanto Crozier era o capitão do Terror. Os navios fizeram uma última parada na Groenlândia para reabastecimento. No final de julho de 1845, dois navios baleeiros avistaram o Terror e o Erebus na Baía de Baffin, Canadá, antes de a expedição desaparecer na imensidão gelada. Nenhum homem branco os viu novamente.

Por dois anos, não houve qualquer notícia de Franklin ou sua tripulação. Em 1848, Lady Jane Franklin, segunda esposa do explorador, persuadiu o Almirantado Britânico a lançar um dos maiores esforços de busca da história naval. No entanto, a expedição havia se transformado em uma das maiores tragédias da exploração polar. Ambos os navios ficaram presos no gelo no Estreito de Victoria, obrigando os tripulantes a abandoná-los. A marinha britânica conduziu buscas extensivas, mas encontrou poucos corpos e nenhum vestígio das embarcações. Demorou quase 170 anos para que o Erebus e o Terror fossem finalmente localizados, naufragados nas águas árticas do Canadá.

Durante anos, expedições terrestres e marítimas vasculharam a região em busca de pistas, encontrando apenas alguns artefatos e restos humanos dispersos. Análises forenses revelaram que os tripulantes sofreram de fome, escorbuto e envenenamento por chumbo, possivelmente causado pelos mantimentos enlatados. Estudos também identificaram marcas de corte em alguns ossos, sugerindo que, em desespero, os homens recorreram ao canibalismo. A maioria da tripulação simplesmente desapareceu.

A busca pela expedição perdida de Franklin continuou ao longo dos séculos XIX e XX. Uma sequência aproximada de eventos foi reconstruída com base em expedições de busca, relatos orais inuítes e análises de exploradores. Um dos achados mais importantes foi a “Nota de Victory Point”, escrita por Crozier e Fitzjames e datada de 25 de abril de 1848. Descoberta em 1859 dentro de um marco de pedra na Ilha King William, a nota revelou que a expedição passou o inverno de 1845-1846 na Ilha Beechey e, no verão de 1846, seguiu pelo Estreito de Peel. No entanto, os navios ficaram presos no gelo, forçando os tripulantes a passar dois invernos seguidos na Ilha King William. Sir John Franklin faleceu em 11 de junho de 1847. Crozier, Fitzjames e os sobreviventes abandonaram os navios e tentaram chegar ao continente canadense através da região do rio Back River, uma jornada de 400 quilômetros. Relatos inuítes (indigenas que vivem no Ártico) mencionam que 35 a 40 homens brancos morreram próximo à foz do Back River, mas o destino dos demais tripulantes permanece desconhecido.

No início da década de 1980, pesquisadores canadenses realizaram um estudo que durou mais de cinco anos. Autorizados pelo governo do Canadá, eles exumaram e realizaram autópsias em três corpos de membros da Expedição Franklin. Eram os primeiros tripulantes a falecer e haviam sido enterrados pela própria expedição. Suas localizações eram conhecidas há décadas. Enterrados em solo congelado, os corpos estavam incrivelmente preservados, dando a impressão de que poderiam simplesmente acordar, apesar de terem morrido há mais de um século. Um dos pesquisadores envolvidos na exumação era descendente de um dos falecidos, vivendo um momento único e emocional ao olhar e tocar um ancestral perdido no tempo. Utilizando tecnologia de ponta do final do século XX, os cientistas conduziram um verdadeiro trabalho de CSI histórico, tentando desvendar o que levou à morte daqueles homens e lançando luz sobre o trágico destino da expedição.

O mistério dos navios foi finalmente resolvido graças a uma combinação de pesquisa histórica, relatos orais inuítes e tecnologia subaquática moderna. O Erebus foi localizado em 2014 no Golfo Queen Maud, e o Terror, em 2016, na Baía do Terror. Ambos os naufrágios estavam próximos da Ilha King William, onde os homens haviam tentado sobreviver. Diversos artefatos foram recuperados por mergulhadores, oferecendo novas pistas sobre os últimos dias da expedição.

Essas descobertas ressaltam a importância das narrativas inuítes na investigação da tragédia. Por décadas, os relatos dos povos indígenas sobre sofrimento, canibalismo e o destino da tripulação foram ignorados pelos pesquisadores britânicos. Apenas no século XXI esses testemunhos foram levados a sério, revelando-se inestimáveis para a compreensão do desastre. Hoje, a tragédia da Expedição Franklin é reconhecida como um dos eventos mais marcantes da história da exploração polar.

Sir John Franklin.
Latas de comida, que perteceram a Expedição Franklin.
Gravura do Erebus e do Terror.
Exumação de membro da Expedição Franklin.
Exumado 130 anos após sua morte.

 

DICAS DE LIVROS SOBRE O ASSUNTO

Congelados no Tempo (Owen Beattie e John Geiger)

É um livro que investiga o mistério da Expedição Franklin, uma missão britânica ao Ártico em 1845. A obra detalha as escavações realizadas nos anos 1980, quando pesquisadores exumaram três corpos incrivelmente preservados de tripulantes enterrados na Ilha Beechey. As análises forenses revelaram sinais de fome, escorbuto e envenenamento por chumbo, possivelmente causado pelas latas de comida contaminadas. Com uma abordagem quase CSI histórico, o livro combina ciência, história e investigação para explicar como a tripulação sucumbiu ao frio extremo e às condições adversas do Ártico.

Miragem Polar (Scott Cookman)

O que transformou a maior expedição ártica do século XIX na maior tragédia de que se tem noticia? Miragem Polar, investiga um dos mistérios mais duradouros nos anais da exploração – duas embarcações da mais poderosa marinha do mundo, ultramodernas para seu tempo, HMS Erebus e HMS Terror, 129 homens escolhidos a dedo, um comandante que sobreviveu a três viagens árticas anteriores, desaparecidos sem sinal de vida.  O que aconteceu? Por um século e meio a pergunta sobre o que aconteceu com a expedição Franklin, o pior desastre nos anais das viagens polares – permaneceu um mistério. Agora, baseado em pesquisa realizada no Almirantado Britânico, o autor recria a saga completa da malsucedida expedição e chega a uma conclusão aterradora para um dos mais longos enigmas da história das explorações humanas. Esta obra é para quem aprecia literatura de aventuras.

SÉRIE “The Terror”

The Terror é uma série de televisão, que estreou em 26 de março de 2018. Baseada no romance homônimo de Dan Simmons, a produção mistura história e ficção, explorando o mistério da Expedição Franklin, desaparecida no Ártico em 1845. Embora a série apresente eventos e personagens reais, ela incorpora elementos fictícios para preencher as lacunas da história, já que o destino exato da expedição ainda é desconhecido. Um dos aspectos mais marcantes da narrativa é a presença de uma criatura sobrenatural, que ataca e aterroriza a tripulação. Apesar das liberdades criativas, The Terror oferece uma ambientação detalhada e realista das condições extremas enfrentadas pelos exploradores, tornando-se uma excelente introdução ao tema. No Brasil, a série está disponível no Amazon Prime Video.

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