Viagem ao Peru e Bolívia (25° e 26° Dias)

08/06/2012 

Porto Quijarro 

Eram 6h30min quando uma moça me acordou e entregou uma bandeja com o café da manhã. Comi o sanduiche de presunto e a salada de frutas que foram servidos. Dispensei o café e o chá de coca. Fui ao banheiro escovar os dentes e lavar o rosto e logo voltei para minha poltrona. Fiquei olhando pela janela do trem e a paisagem eram árvores e alguns pastos. Vi muitos passarinhos, inclusive alguns papagaios e araras azuis. Aquela região fazia parte do pantanal e era muito rica em fauna e flora. Mais meia hora de viagem e chegámos a Porto Quijarro.

O desembarque foi tranquilo e nem entrei na estação, saí por um portão lateral e peguei um taxi na rua em frente. Paguei $ 10,00 bolivianos (meus últimos bolivianos) e desembarquei na fronteira com o Brasil. Fui para a fila da imigração, que não era grande naquele horário e não demorou muito para que verificassem e carimbassem meu passaporte. Apenas achei muito detonado o escritório da imigração, que era todo sujo, com móveis velhos e equipamentos quebrados. Com certeza foi o pior escritório de imigração onde já estive!

Atravessei a fronteira a pé e fui “recebido” no lado brasileiro por um simpático cachorrinho. Passei pela imigração brasileira, onde pela primeira vez consegui ver na tela do computador como é o cadastrado vinculado ao número de passaporte da pessoa e as informações de entrada e saída no Brasil. Geralmente em aeroportos o monitor do computador fica virado para o funcionário e não é possível ver nada. Ali o monitor estava de lado e eu dei uma esticada de pescoço para poder matar minha curiosidade e ver o que aparecia para o agente federal. Carimbaram meu passaporte, o que não é um procedimento usual e foi a primeira vez que isso aconteceu, de eu ganhar um carimbo brasileiro no passaporte. 

Corumbá – MS

Já em solo brasileiro fui procurar um jeito de ir até a rodoviária de Corumbá, cidade ao lado da fronteira. Pedi informações para dois rapazes que entregavam panfletos sobre viagens turísticas pelo pantanal. Os rapazes me sugeririam conversar com uma mulher e sua filha, que estavam num ponto de taxi próximo e propor a elas pegar o mesmo taxi até a rodoviária. E foi o que fiz, conversei com a tal mulher, que tinha vindo no mesmo trem que eu. O preço da corrida até a rodoviária era R$ 40,00 e paguei a metade. No caminho o taxista parou em um supermercado, onde fui sacar reais num caixa eletrônico. Desembarcamos na rodoviária pouco antes das 9h00min e fomos direto ao balcão da Viação Andorinha, para comprar a passagem até Campo Grande. O próximo ônibus partiria às 11h00min e paguei R$ 79,00 na passagem. Fiquei bastante tempo conversando com a senhora com quem dividi o taxi e com sua filha. A tal senhora era paranaense, mas vive em Minas Gerais e é casada com um boliviano.

Estava ficando com fome e fui procurar um lugar para comer. Na rodoviária só tinha uma lanchonete e para comer a única opção eram algumas coxinhas gordurosas e caras. Dei uma volta pelas proximidades e só encontrei um restaurante, do outro lado da rua. O local era bem simples, mas olhei a cozinha e era limpa e o cheiro da comida era tentador. O Problema é que ia demorar um pouco para a comida ficar pronta. Voltei até a rodoviária e falei para a senhora com quem dividi o táxi, sobre o restaurante que tinha encontrado. Ela e a filha foram comigo até o restaurante e ficamos esperando a comida ficar pronta. Eu fiquei o tempo todo de olho no relógio, com medo de perder o ônibus. Quando faltavam vinte minutos para o horário de partida do ônibus, o almoço foi servido. Era prato feito, na verdade dois pratos, um com feijão e arroz, e outro com bife e salada. Era muita comida para uma pessoa somente e achei que não ia dar conta de comer tudo. Fazia quase um mês que eu não comia feijão e quando vi aquele prato de feijão e arroz na minha frente não pensei duas vezes e comecei a comer. A comida era muito boa e foi uma pena que tive que comer correndo. E comi tudo, não deixei um único grão de arroz no prato! A senhora e sua filha dividiram um prato e mesmo assim não conseguiram comer toda a comida.

Voltamos à rodoviária e o pessoal já estava embarcando. Coloquei minhas mochilas no bagageiro e fui para meu lugar, no corredor ao lado de um homem. Tão logo o ônibus partiu eu dormi e acordei uma hora depois, num posto de fiscalização. Voltamos à estrada e dormi um bom tempo, até nova parada, dessa vez num posto da Policia Rodoviária Federal. Os policiais pediram documentos de alguns bolivianos e também de duas garotas com cara de menores de idade, que viajavam sozinhas. No fim não encontraram nenhum problema e fomos liberados para seguir viagem. Dormi mais um pouco e acordei novamente quando teve uma parada para lanche. Desci, estiquei as pernas e fiz um lanche rápido. Embarquei e o restante da viagem fui dormindo.

Campo Grande

Pouco depois das 18h30min o ônibus passou em frente ao aeroporto de Campo Grande e desembarquei. Fiquei feliz pelo ônibus ter passado em frente ao aeroporto, pois assim eu economizava o taxi da rodoviária até ali. Entrei no saguão do aeroporto e fui direto ao banheiro. Eu estava sem banho desde o dia anterior, então procurei amenizar um pouco a situação lavando os pés e passando uma toalha úmida pelo corpo. Coloquei uma camiseta limpa, que era a última peça de roupa limpa que eu tinha. Voltei ao saguão e lembrei-me da lanchonete do posto de gasolina que fica do outro lado da avenida em frente aeroporto. Nessa lanchonete eu tinha lanchado quando passei por Campo Grande no início da viagem. Fui até lá e comi três deliciosas coxinhas, acompanhadas de um Todynho. A bela e simpática dona da lanchonete lembrou que eu tinha passado por lá dias antes e puxou conversa. Ficamos um bom tempo papeando. Como estava ficando tarde resolvi voltar para o aeroporto. Escolhi uma cadeira confortável e fiquei ali usando o net book, organizando as fotos da viagem e também alguns textos sobre a viagem, para postar no blog. Tenho uma tia e alguns primos que moram em Campo Grande e poderia entrar em contato com eles e me hospedar na casa de algum deles. Ou poderia ir para um hotel. Mas como não gosto de incomodar os outros, principalmente meus parentes e como sou um cara econômico (não confunda com pão duro) achei melhor passar a noite acordado no aeroporto. Já fiz isso outras vezes, tanto em aeroportos brasileiros como no exterior. Aeroportos são locais seguros e sossegados para passar a noite. Tem muita gente que faz isso, sendo que alguns dormem pelos bancos ou no chão. Eu prefiro ficar acordado, fazendo algo para passar o tempo.

Pouco antes da meia noite resolvi dar uma volta pelo aeroporto, que não é grande. Entrei numa livraria e fiquei vendo os livros e revistas. Acabei comprando um livro do Rodrigo Ranieri, onde ele conta sobre suas escaladas pelo mundo e principalmente suas experiências no Everest. Sentei-me para ler o livro, que era muito interessante. Animei-me tanto com a leitura que só fui parar de ler poucos antes da 3h00min, quando estava na metade do livro. Dei mais uma volta pelo aeroporto, para esticar as pernas. Sentia fome e fui até uma Casa do Pão de Queijo, que fica ao lado de uma das portas do aeroporto e que estava aberta naquele horário. Olhei o cardápio e pedi um suco. A atendente disse que não tinha. Daí pedi um sanduíche e também não tinha. Olhei mais uma vez o cardápio e pedi outro tipo de sanduíche. Novamente a resposta foi que não tinha. Então desisti! Levantei, dei tchau para a atendente e por pouco não perguntei a ela porque não fecham aquela espelunca, já que não tem nada para servir. Acabei entrando no restaurante mais caro do aeroporto, pois era o único que restava aberto. Pedi um suco e um sanduíche (ali tinha!) e fiquei numa mesa lendo meu livro e comendo. Após quase uma hora ali, comecei a sentir sono e resolvi sair e dar uma volta.

Fiquei uns 15 minutos caminhando pelo aeroporto e resolvi me sentar e terminar de ler meu livro. Mas cadê o livro? Voltei ao restaurante, pois só podia ter esquecido o livro lá. Quando entrei pela porta vi a atendente lendo meu livro. Quando ela me viu deu um sorriso, mostrou a capa do livro e perguntou se era eu na foto. Respondi que não, apesar de estar barbudo igual o Rodrigo Ranieri na capa do livro. Ela disse que me achou parecido com o cara da capa e como eu estava cheio de mochilas, pensou que fosse eu o autor do livro. Ficamos papeando um pouco e quando chegaram clientes a deixei ir trabalhar e voltei a me sentar no saguão. Fiquei lendo meu livro até amanhecer o dia. 

09/06/2012 

Campo Grande 

Às 6h00min fui até o balcão da Gol e fiz meu checkin. Despachei a mochila grande e a média, e em seguida fui para a sala de embarque, onde terminei de ler o meu livro. Logo embarquei num voo que vinha de Santa Cruz de La Sierra e seguia para São Paulo. Fui o último a embarcar no avião lotado. Meu lugar era no meio, na janela e ao meu lado foi sentado um senhor de meia idade e uma boliviana com cara de antipática. Antes da decolagem peguei no sono e só fui acordar quando chegámos à São Paulo, ao aeroporto de Guarulhos.  

São Paulo 

Minha conexão para Maringá seria às 11h00min, então não tinha pressa para desembarcar do avião. Esperei todos passarem pelo corredor e me levantei para sair. Ao passar pela poltrona do corredor onde a boliviana estava sentada, vi uma pasta com um note book e um Iphone. Na pressa de descer a boliviana esqueceu suas coisas. Peguei o note book e o Iphone e na saída do avião os entreguei a comissária de bordo e falei a ela o número da poltrona onde os tinha encontrado. Em nenhum momento tive vontade de ficar com tais coisas, o que seria fácil, pois era só guardar rapidamente em minha mochila e desembarcar. Mas aprendi desde criança a não pegar o que é dos outros. Se eu tivesse encontrado aquilo em um lugar onde não tinha como devolver ao dono, ou então não soubesse quem era o dono seria diferente, seria algo “achado” literalmente. Mas nesse caso eu sabia quem era o dono, tinha a opção de deixar com a comissária de bordo, pois a dona podia procurar com a Cia Aérea.

Desci do avião e resolvi ir atrás da boliviana, para avisá-la que tinha encontrado suas coisas e deixado com a comissária. Em vez de seguir para a sala de embarque de minha conexão, segui por outra porta e tive que passar pela imigração. Mostrei meu passaporte e cartão de embarque, para provar que mesmo eu vindo num voo internacional eu tinha embarcado em solo brasileiro, o que me liberava de certos tramites burocráticos. Fui até a esteira de bagagens e lá encontrei o senhor que estava sentado ao meu lado. Perguntei se a boliviana estava junto com ele e a resposta foi negativa. Ele disse que ela desceu somente com a bagagem de mão e que a viu saindo pela porta de desembarque. Eu não tinha mais como encontrar a boliviana, mas minha consciência estava tranquila, pois fiz a coisa certa. Apenas não sei (e jamais saberei!) se a comissária de bordo fez a parte dela e deu o encaminhamento correto ao note book e Iphone que entreguei a ela. Espero que tenha dado!!

Andei um pouco pelo aeroporto, para espantar o sono. Pouco antes das 11h00min embarquei e mais uma vez dormi durante quase toda a viagem. 

Maringá 

O desembarque em Maringá como sempre foi um pouco tumultuado, em razão do pequeno espaço físico na hora de pegar as malas na esteira. E a saída para o saguão também é complicada, pois sempre tem gente esperando quem chega de viagem e eles acabam travando a saída de quem está saindo com suas malas. Encontrei meu irmão, que me levou até a rodoviária, onde peguei um ônibus para Campo Mourão.

Na viagem fui lembrando de alguns momentos dos vinte e poucos dias de viagem. Lembrei dos amigos que fiz e das pessoas que conheci. A maioria dessas pessoas jamais verei ou terei notícias delas novamente. Alguns amigos que fiz manterei contato, mas com o tempo alguns vão desaparecendo e somente com poucos é que terei um contato mais permanente. Também lembrei das fotos que tirei na viagem e que muitas dessas fotos ficarão espalhadas pelo mundo. Daqui uns cinquenta anos o neto de algumas das pessoas que estavam ao meu lado nas fotos, vai ficar se perguntando quem era e de onde era aquele cara de barba vermelha que aparece na foto junto ao seu avô ou avó. Bem como daqui cinquenta anos meus netos vão olhar minhas fotos e perguntar quem eram as pessoas que estavam comigo nas fotos.

Essa foi uma das melhores viagens que já fiz, principalmente em razão das coisas que fiz, das pessoas maravilhosas que conheci. E contar sobre essa viagem de forma detalhada no blog é uma forma de não esquecer tal viagem e nem as pessoas que fizeram parte dessa história. Sempre que eu reler a narrativa dessa viagem estarei recordando momentos especiais e inesquecíveis e relembrando as muitas emoções e até momentos de medo pelos quais passei. Viajar, conhecer novos lugares e pessoas, viver aventuras, é uma das coisas que mais gosto na vida. Em cada viagem, no contato com todas as pessoas que conheço nas viagens, aprendo algo novo e procuro colocar em prática no meu dia a dia muitas dessas coisas que aprendo.

E finalizando os relatos da viagem ao Peru e Bolívia, vou “emprestar” o lema da empresa na qual trabalho atualmente e que diz: VIVER É VIAJAR!

Olhando pela janela do Trem da Morte.
Desembarcando na Estação de Porto Quijarro.
O Trem da Morte, na versão luxo (Ferrobus).
Ferrobus em Porto Quijarro.
Fronteira Bolívia/Brasil.
Fila de embarque em Corumbá – MS.
O livro que li no aeroporto.
Aeroporto de Campo Grande.
Em Campo Grande o embarque é na pista.

Viagem ao Peru e Bolívia (24° Dia)

07/06/2012 

Santa Cruz de La Sierra 

Acordei às 10h00min e fiquei vendo TV na cama por algum tempo. Depois levantei, tomei banho frio (não tinha outra opção!), arrumei minhas coisas e saí. Fiz o checkout às 11h30, que era o horário limite para sair do hotel. Saí e atravessei à avenida em frente ao hotel para ir até o Terminal Bimodal. Lá deixei minhas mochilas no guarda volumes e fui para o centro da cidade. A chuva tinha parado, mas continuava nublado e fazendo frio. Ao caminhar pela rua notei que minha calça estava caindo. Após tantos dias comendo comidas ruins, fazendo algumas atividades físicas desgastantes e vivendo em altas atitudes, acabei perdendo alguns quilos.

Eu conhecia o caminho até o centro da cidade, pois estivera passeando por alí algumas semanas antes, no início da viagem. Minha intenção era almoçar no mesmo restaurante onde almocei da outra vez em companhia de alguns amigos. Encontrei o restaurante, mas naquele dia não serviriam almoço. Achei estranho isso, mas não perguntei o motivo. Saí andar pelo centro e então notei que todas as lojas estavam fechadas. Foi então que lembrei que era feriado de Corpus Christi. Nessa viagem eu tinha perdido um pouco a noção de tempo e muitas vezes não sabia que dia da semana ou do mês era, e muito menos me lembrava de feriados. Andei um pouco pelo centro e fui até a praça em frente à Catedral, que mais uma vez estava fechada. Com tudo estando fechado em razão do feriado e Santa Cruz não sendo uma cidade com muitos atrativos para turistas, resolvi voltar para o Terminal Bimodal. Pelo caminho fui procurando algum restaurante aberto, mas não encontrei nenhum.

Na região em frente ao Terminal Bimodal existiam muitos restaurantes e todos estavam abertos. Resolvi procurar outro lugar para almoçar e não o restaurante onde tinha almoçado e jantado no dia anterior. Passei por todos os restaurantes, olhei as mesas, a comida que estava sendo servida e nenhum me agradou. Todos eram sujos e a comida estranha. Tinha até uma pequena churrascaria, cuja churrasqueira ficava na calçada. Dei uma olhada nas carnes que estava sendo assadas e que no meio tinha algumas tripas de boi sendo assadas. Fiquei alguns minutos parado olhando o churrasqueiro e após ver algumas atitudes nada higienicas por parte dele, desisti de comer ali. Fui almoçar no mesmo restaurante do dia anterior, que se não era um exemplo de limpeza e higiene, ao menos a comida era razoável e não tinha me feito mal. Chegando ao restaurante encontrei uma única mesa vazia, pois como das outras vezes estava lotado. Pedi o costumeiro prato feito com arroz, frango, batata frita e comecei a comer.

Á tarde eu não tinha nada para fazer, a não ser esperar o final do dia quando meu trem partiria. Voltou a chover e isso impossibilitou qualquer passeio pela cidade. Entrei em uma lan house e passei o resto da tarde usando a internet. Quando escureceu fui para o Terminal Bimodal e no caminho ouvi música na rua, que vinha de uma loja. Dessa vez era Roberto Carlos, cantando em espanhol. No Terminal Bimodal peguei minhas mochilas no guarda volumes e fui para a fila do embarque. A fila era pequena e quando fui passar pelo portão de embarque me barraram. Ali também era preciso comprar o tal ticket de taxa de embarque. Fui comprar o ticket e voltei para o portão de embarque. O trem estava parado logo em frente e eram somente dois vagões. Creio que por ser o trem luxo que é mais caro, pouca gente costuma viajar nele.

Embarquei no trem e me senti frustrado, pois esse Trem da Morte não era nada parecido com o Trem da Morte das histórias que li em livros. Esse trem em que estava embarcado era a versão luxuosa do Trem da Morte, com poltronas macias e reclinaveis, ar condicionado, TVs de plasma passando filmes norte americanos e banheiro limpo. Eu que esperei tanto tempo para viajar no clássico Trem da Morte, acabei tendo que me contentar com a versão luxo e sem graça do trem. Viajar pelo Trem da Morte é uma espécie de ritual e todo mochileiro que se preze um dia deve passar por tal ritual, deve fazer tal viagem, para então ser considerado um mochileiro de verdade. Eu que viajo há muitos anos no estilo mochileiro, ainda não tinha tal viagem no meu currículo.

A viagem de trem entre Santa Cruz de La Sierra e Porto Quijarro, na fronteira com o Brasil, é de pouco mais de seiscentos quilômetros. O nome Trem da Morte, ao contrário do que muitos imaginam não é em razão da estrada ser perigosa, com desfiladeiros e cheia de pontes prestes a cair. O nome Trem da Morte é por que no século passado durante uma grande epidemia de febre amarela que assolou a região de Santa Cruz de La Sierra, esse trem foi utilizado para transportar muitas pessoas doentes e também corpos de mortos na epidemia. E muitos dos doentes transportados no trem, morreram durante a viagem. Além disso, naquela época a ferrovia se encontrava em péssimas condições de conservação e muitos descarrilhamentos com mortes aconteciam, aumentado ainda mais a má fama da ferrovia e tornando “famoso” o Trem da Morte.

Atualmente existem três tipos de trens percorrendo o trecho entre Santa Cruz de La Sierra e Porto Quijarro (e vice versa). Tem o Regional, que é o preferido dos viajantes, pois é o mais barato. O Regional é considerado o Trem da Morte clássico, pois sua viagem dura em média 19 horas e normalmente está lotado. Ele costuma ter pessoas dormindo pelo chão e transportando galinhas dentro dos vagões. Nesse tipo de trem é permitida a entrada de vendedores, então em cada parada que o trem faz muita gente entra e desce dos vagões, vendendo diversos tipos de produtos. O Regional também é o preferido pelos mochileiros do mundo todo que buscam fazer a famosa viagem pelo Trem da Morte. O trem intermediario é o Expresso Oriental, cuja viagem tem duração média de 16 horas e o preço é um pouco maior do que o Regional. O trem mais luxuoso é o Ferrobus, que é o mais chique e caro, e cuja duração da viagem é de cerca de 12 horas. Era justamente no Ferrobus que eu ia viajar. O mais caro, mais luxuoso, mais confortável e mais sem graça dos trens. E justamente o trem pelo qual eu não queria viajar. Mas não tive opção, pois tinha ficado mais de um dia esperando um trem que partisse de Santa Cruz e tanto meu dinheiro, quanto minha paciência estavam no fim e eu queria voltar logo para casa.

Acomodei-me em minha poltrona, que era bastante confortável. Meu vagão estava quase vazio, com mais seis pessoas somente. Dentro do vagão fazia muito frio e mais tarde descobri que o sistema de ar condicionado estava com defeito e por isso que ficava tão frio dentro do trem. Entrei dentro de meu saco de dormir e fiquei vendo um filme que passava em uma TV presa ao teto, no corredor do trem. E para minha surpresa logo apareceram duas moças com um carrinho igual os de serviço de bordo de aviões. Elas traziam o jantar! O trem era mesmo chique, tinha até jantar quente. O cardápio era arroz, batata cozida e carne assada. Para beber tinha água e Coca-Cola. E de sobremesa tinha pudim. A comida era boa, pena que em pouca quantidade. Mesmo tendo gostado da comida, do filme e do conforto do trem, fiquei decepcionado e frustrado, pois aquela não era a viagem pelo Trem da Morte que tanto planejei e esperei. Paciência! O jeito era me conformar e talvez um dia voltar ali e fazer a viagem pelo Trem da Morte clássico, desconfortável, sujo, cheio de gente e extremamente lento…

Praça no centro de Santa Cruz de La Sierra.
Catedral de Santa Cruz de La Sierra.
Muro pichado no centro de Santa Cruz.
Rua em frente ao hotel onde me hospedei.
Na fila de embarque do trem.
Interior do trem.
A comida servida no trem.