Caratuva 2024

Aproveitando que estava passando alguns dias em Curitiba, me desloquei até a Serra do Mar para subir uma montanha. Fazia quase dois anos que não subia montanhas, então estava sentindo saudade. Para um bate e volta escolhi o Caratuva, montanha que já subi duas vezes, em 2008 e 2021, mas em ambas as vezes não vi a paisagem lá do cume, pois estava tudo encoberto por nuvens. Dessa vez tinha esperança de ver algo lá do alto, pois o dia estava relativamente bom e não tinha previsão de chuva.

Comecei a subir pouco depois das dez da manhã e não levei muita coisa. Levei alguma comida e quatro litros de água. Segui num ritmo lento, pois o início da trilha é sempre a parte mais complicada e cansativa. Depois que o corpo foi aquecendo, aumentei um pouco meu ritmo e a primeira hora de subida foi tranquila. Encontrei algumas pessoas descendo, mas ninguém subindo pela trilha. Fiz algumas rápidas paradas para descanso e para beber água.

Chegando no Getúlio, encontrei um grupo de Ponta Grossa, que subia com mochilas cheias, pois pretendiam acampar no cume do Caratuva. Fiz uma parada mais rápida no Getúlio, onde lanchei, descansei e fiquei observando a paisagem para o lado da represa, que sempre é muito bonita. Me lembrei que a última vez que tinha estado no Getúlio tinha sido numa noite fria e chuvosa, quase dois anos antes. Como o tempo passou rápido desde aquela última vez ali…

Após meia hora parado no Getúlio, segui em frente. Na encruzilhada das plaquinhas encontrei novamente o pessoal de Ponta Grossa e um outro casal, que faria meia volta dali. Tiramos fotos, conversámos um pouco e segui pela trilha rumo ao Caratuva. Nesse trecho a trilha estava bem molhada, sinal de que tinha chovido por ali nas últimas horas. A trilha molhada significa mais dificuldade e atenção redobrada para não cair. Conforme ia subindo o tempo foi fechando e comecei a temer que mais uma vez não veria nada da bonita paisagem no alto do Caratuva.

Quase no final da trilha encontrei três soldados do 5º GAC AP, que estavam descendo. Paramos conversar rapidamente e me contaram que o tempo lá no alto estava completamente fechado. Senti vontade de voltar para traz dali mesmo onde estava. Mas como estava perto do cume, resolvi seguir em frente. Quando cheguei no cume do Caratuva, senti um misto de alegria e frustração. Alegria por ter vencido o desafio e por estar pisando pela terceira vez no cume dessa montanha, que é a segunda mais alta do sul do Brasil, perdendo em altura somente para o Pico Paraná. E frustração por mais uma vez não conseguir ver nada da bela paisagem que se vê lá do alto. Estava tudo branco, uma nuvem baixa deixava tudo branco em volta. Eventualmente era possível ver o Itapiroca no lado direito da montanha e mais nada. Definitivamente o Caratuva não gosta de mim! Justo ele que foi a primeira montanha que subi naquela região, no distante ano de 2008.

Achei uma pedra num canto, me sentei e lanchei. Logo comecei a ouvir raios e trovões bem próximos e resolvi iniciar logo a descida. Com temporal é perigoso ficar no alto da montanha, pois as antenas que ali existem costumam “puxar” raios. É bem visível nos cabos de aço que seguram as antenas, marcas de descargas de raios. Mal comecei a trilha de descida e caiu o maior temporal. Desci rápido até chegar na parte de floresta e dessa forma me senti mais protegido dos raios que escutava cair próximos de onde estava. A trilha se transformou numa grande enxurrada com a água que descia do alto da montanha. A descida prometia ser difícil e perigosa com tanta água na trilha.

Encontrei três membros do grupo de Ponta Grossa e parei para falar rapidamente com eles. Tinham decidido que continuariam a subida e acampariam no cume do Caratuva, mesmo com chuva. O restante do grupo tinha dado meia volta e desistido de acampar no cume. Me pediram para avisar os que desciam, que eles acampariam no Caratuva. Voltei a descer a montanha e logo encontrei o restante do grupo de Ponta Grossa. Dei o recado e resolvi descer junto com eles, pois era mais seguro do que descer sozinho. Durante boa parte da descida a chuva nos fez companhia. Conversamos um pouco e descobri que os quatro eram uma família, formados por pai, mãe, filho e nora. Acabei fazendo amizade com eles e na encruzilhada das placas, até tiramos foto juntos.

Walter, Berenice, Junior e sua esposa, formavam um grupo divertido e até o final da descida todos acabaram sofrendo ao menos uma queda. Sem querer acabei gravando a Berenice caindo próximo ao Getúlio. Eu tive uma queda daquelas bobas, quando meu pé direito tropeçou no meu pé esquerdo e caí de lado no mato. Fora o orgulho ferido, tive apenas um pequeno esfolado no cotovelo direito e uma mancha roxa enorme que surgiu no dia seguinte próximo ao cotovelo. Montanha sem queda, não é montanha…

Quase chegando na Fazenda Pico Paraná, a esposa do Junior (cujo nome não lembro) sofreu duas quedas em sequência. Ela ficou meio inconformada com isso, mas disse que as pernas não obedeciam mais…

Já na fazenda dei baixa na minha ficha de entrada, me despedi dos novos amigos pontagrossenses e mesmo molhado e enlameado, peguei o carro e resolvi partir antes de escurecer. A estrada que leva da Rodovia Régis Bitencourt até a Fazenda Pico Paraná, estava em péssimas condições e depois da chuva que tinha caído eu não queria passar por ela com o escuro da noite. Mesmo com chuva a viagem até Curitiba foi tranquila e apesar da frustação de mais uma vez só ver nuvens no cume do Caratuva, o bate e volta até a montanha foi válido.

Pouco mais de uma hora de subida.
No Getúlio.
Descanso no Getúlio.
A clássica foto nas plaquinhas.
Subida difícil.
A bela vista da represa.
Caixa de cume no Caratuva.
Marco geodésico no Caratuva.
No cume do Caratuva pela terceira vez.
O Itapiroca aparecendo entre nuvens.
Lanche no Caratuva.
Antenas no alto do Caratuva.
Na descida, com os amigos de Ponta Grossa.

Feriado na Fazenda Rio das Pedras

Aproveitando o feriado da sexta-feira santa, peguei dispensa do trabalho na quinta-feira a tarde e junto com Eliane, André, Roberto e Carla, segui para a região de Campina Grande do Sul, cerca de 50 quilômetros após Curitiba. Nosso destino era a Fazenda Rio das Pedras, que fica ao lado da Fazenda Pico Paraná. As duas fazendas são o portão de entrada para as altas e belas montanhas que existem na região. As principais são o Pico Paraná e o Caratuva, respectivamente as duas maiores montanhas do sul do Brasil.

A viagem foi tranquila e conversamos e rimos muito. O mais difícil foi suportar a trilha sonora que o André colocou para tocar. Como o carro era dele, tinha direito de escolher as músicas. Fizemos uma parada no meio do caminho, pouco antes de chegar em Ponta Grossa. Nossa parada foi numa lanchonete especializada em pão de queijo. Depois dessa parada assumi a direção do carro e seguimos em frente, chegando em Curitiba quando já estava escuro. Por ser véspera de feriado o trânsito estava lento e atrasou um pouco nossa viagem.

Já quase no final da viagem, logo após sairmos da Rodovia Régis Bitencourt e entrarmos numa estrada de terra com muitas subidas e buracos, tivemos o primeiro problema da viagem. O carro morreu no meio de uma subida e para sair do lugar os passageiros tiveram que descer e alguns ajudarem a empurrar o carro, que por muito pouco não caiu em uma valeta ao lado da estrada. Felizmente deu tudo certo e chegamos em segurança na Fazenda Rio das Pedras. Passava um pouco das 21 horas, fazia frio e garoava.

Tiramos as bagagens do carro, nos ajeitamos nos três quartos do chalé de madeira que alugamos e nos reunimos para decidir o que fazer. O plano inicial era chegar e logo depois partir para o ataque ao Pico Paraná. Como estávamos cansados da viagem, que demorou mais que o planejado e fazia frio e chuviscava, por votação foi decidido adiar o ataque para a noite seguinte. Depois disso o jeito foi tomar banho e jantar uma deliciosa lasanha feita pelo Roberto. Em seguida cama, um merecido descanso após pouco mais de 500 quilômetros de viagem.

Na manhã seguinte cada um levantou num horário diferente. Após o café da manhã fomos passear pelo lugar, que é muito bonito. Fizemos uma rápida parada numa lanchonete para usar o wi-fi e depois fomos andar ao lado do rio que passa atrás do chalé. O rio é raso, a água transparente e muito gelada. Algumas fotos e voltamos para o chalé. Teve roda de chimarrão e bate papo e logo voltamos ao rio, dessa vez para entrar na água. Foi preciso muita coragem para entrar na água congelante. Era difícil entrar, mas após um minuto dentro da água o corpo acostumava com o frio e ficava relaxante a experiência.

De volta ao chalé teve almoço e a tarde foi de descanso. Aproveitei para dormir um pouco e depois deu até para assistir um filme da Netflix, devidamente baixado no aplicativo instalado no celular. Depois foi banho, janta e mais um pouco de descanso visando o ataque ao Pico Paraná logo mais tarde. Sobre tal ataque você pode ler na próxima postagem…

Pé na estrada…

Entrada da Fazenda Rio das Pedras e a direita o IAP.

Relaxando na água extremamente fria.
Roberto e o dog.
Vander e Eliane

De volta ao Caratuva

No feriado de 15 de novembro, estive pela segunda vez no cume do Pico Caratuva, que é a segunda montanha mais alto do sul do Brasil, com 1.860 metros de altitude. A outra vez que estive nessa montanha foi em novembro de 2008. Na época eu ainda morava em Curitiba, então era mais fácil ir até a Fazenda Pico Paraná e iniciar a subida da montanha, pois a distância da fazenda até minha casa era de apenas 50 quilômetros. Atualmente moro a 500 quilômetros de distância, então a ida até lá demandou uma certa organização, tempo e gastos.

Saímos de Campo Mourão em dois carros, com quatro ocupantes cada um. Pegamos estrada no início da tarde de sábado, com um calor na casa dos 30 graus. Chegamos na Fazenda Pico Paraná a noite e com uma temperatura de 14 graus. Nós ficaríamos alojados em um chalé na Chácara Rio das Pedras, que fica ao lado da Fazenda Pico Paraná. Lá nos esperavam mais dois caras de Joinville – SC, que subiriam a montanha conosco e um amigo deles que não subiria. A viagem foi cansativa e após ajeitarmos as coisas e comermos, fui dormir.

Acordei às 02h30min, após ter dormido pouco mais de três horas. Fiz uma descoberta nem um pouco agradável. Cometi um erro de iniciante, esquecendo minhas botas. Tinha levado apenas um tênis velho, cujo solado estava completamente liso. Subir com aquele tênis por trilhas molhadas e cheia de barro era algo perigoso. Por alguns momentos cogitei desistir de subir o Caratuva, mas resolvi arriscar, sabendo que sofreria muitos escorregões com aquele par de tênis liso e teria que tomar muito cuidado para não sofrer nenhuma queda.

Fazia ainda mais frio. Rapidamente me arrumei e saí com os outros nove integrantes do grupo, rumo a montanha. O plano era ver o sol nascer lá do alto. O início da caminhada sempre é difícil, pois o corpo está meio frio e travado. Tinha chovido durante a semana naquela região e encontramos muito barro pelo caminho. Após duas horas de caminhada, um dos companheiros desistiu, devido a dores no joelho e deu meia volta. Começou a ventar forte e cair uma fina garoa.

A subida não foi das mais fáceis, mas seguimos em frente e nosso grupo acabou se separando, pois alguns seguiam mais rápidos e outros menos. Eu era um dos que ficou no grupo mais lento, pois desde o início vinha fechando o grupo. Devido a trilha ruim que encontramos, logo que o dia começou a clarear percebemos que não conseguiríamos chegar ao cume antes do nascer do sol. Logo baixou uma neblina densa o que era sinal de que no alto da montanha devia estar com o tempo fechado e não seria possível ver o sol nascer.

Quase que exatamente às 07h00min, atingimos o cume do Caratuva. Lá em cima estava tudo branco pela neblina, ventava e fazia muito frio. Após 13 anos eu voltava ao cume e encontrava o tempo igual da vez anterior. A vista lá do alto quando o dia está limpo é muito bonita, mas com o tempo fechado como estava não dava para ver nada. Estranhamos em não ter encontrado no cume quatro companheiros que tinham seguido na frente. Será que se perderam pelo caminho?

Ficamos uma hora no cume esperando para ver se o tempo limpava e que no mínimo pudéssemos ver o Pico Paraná lá do alto. Mas nada de o tempo limpar e ficar parado causava frio, então resolvemos descer. Na parte de trás da montanha, pelo caminho onde tínhamos subido, o tempo estava limpando e era possível ver a bela paisagem onde se destaca a Represa do Capivari. Ficamos alguns minutos admirando a paisagem e nos aquecendo ao sol.

Começamos a descer, o que teoricamente é mais fácil. Mas devido a trilha molhada e enlameada, não foi tão fácil a descida. Sem contar que ela estava mais perigosa. Era muito fácil escorregar e sofrer uma queda. Após pouco mais de uma hora de iniciarmos a descida, escorreguei e ao tentar me segurar numa árvore um pedaço de pau atravessou um dedo de minha mão esquerda. Saiu muito sangue e senti uma dor terrível. Fui socorrido pelos amigos Welison e Paulo, sendo que esse improvisou um curativo. Se a descida já estava difícil, com uma mão imobilizada e sentindo dor, o resto da descida foi ainda mais complicado. Mas ficar parado não era uma opção e o jeito foi seguir em frente.

Começamos a encontrar muita gente na trilha. Em razão do feriado, muitas pessoas tinham optado em seguir para as montanhas. Após passar frio de madrugada e no início da manhã, agora era vez de sofrer com o sol quente quando chegamos na região do Getúlio, onde a maior parte da trilha não é protegida pela sombra das árvores. Pouco antes do meio dia chegamos na Fazenda Pico Paraná e seguimos para nosso chalé. Me sentia muito cansando, com muita dor nas pernas e no dedo machucado.

Chegando no chalé, descobrimos que o Roberto, Ronaldo, Vitor e André, tinham errado a trilha e foram parar na montanha errada. Eles acabaram indo parar no Taipa. Tal erro foi motivo de muita zoação, principalmente com o Ronaldo e o André, que já tinham o histórico de ter tido problemas no Pico Paraná. Eles foram considerados pé frios de montanha.

Tomei um longo banho quente, limpei o dedo ferido e fiz um curativo mais caprichado. Fiz um lanche rápido e fui dormir. Dormi o resto do dia e a noite levantei para comer e conversar um pouco com o pessoal. O dedo machucado tinha inchado e estava latejando. Cogitei ir até um hospital em Curitiba, para dar uma olhada melhor no ferimento. Meu receio era de que alguma sujeira ou pedaço de madeira tivesse ficado dentro do dedo.

Nessa viagem o Roberto, que está fazendo um curso noturno de cozinha no Senac, foi nosso cozinheiro. Ele caprichou nas refeições e confesso que nunca comi tanto e tão bem durante uma viagem as montanhas. Ele se mostrou bem preocupado com meu dedo machucado e a noite tive tratamento vip por parte dele. A todo momento ele vinha me trazer churrasco e refrigerante, queria saber como estava meu dedo, perguntava se eu queria ir para um hospital e muita coisa mais.

Dormi cedo, tinha esfriado bastante e meu saco de dormir colocado em cima de um colchão no chão, estava bastante acolhedor. No dia seguinte levantamos cedo, arrumamos nossas coisas e pegamos a estrada de volta para casa. Meu dedo estava ainda mais inchado e doendo, o que me fez tomar alguns comprimidos para dor. Não vi necessidade de parar num hospital em Curitiba. Só fui buscar tratamento médico no dia seguinte, quando já estava em minha cidade e acordei com o dedo roxo, muito inchado e ainda mais dolorido. Tive que tomar antibióticos durante uma semana e também tomar vacina para tétano. A vacina (pra variar) me deu reação e fiquei um dia e meio muito mal, com dores pelo corpo, febre e desanimo. Mas no fim tudo deu cedo e o dedo está curado.

Essa foi uma viagem e uma aventura muito legal e nosso grupo se mostrou divertido e a parceria foi total. Agora que venham as próximas montanhas…

 

 

Vitor, Ronaldo e Cris.
Ao fundo a Represa do Capivari.
André, Vander, Roberto e Welison.

 

Pico Paraná (Parte I)

Fazia alguns anos que eu queria chegar ao cume do Pico Paraná, mas sempre acontecia algo e eu tinha que adiar. Cheguei a subir o Caratuva em 2008 e o Itapiroca em 2009, que são duas montanhas próximas ao Pico Paraná. Mas quando chegou a vez de subir o PP (apelido carinhoso dado ao Pico Paraná) me machuquei um pouco antes e levei meses para ficar bom e em forma novamente. Daí quando estava novamente planejando subir o PP, tive dois problemas sérios de saúde e em seguida me mudei de Curitiba. Três anos se passaram e o PP continuava em minha lista de locais onde queria colocar os pés.

Atualmente estou morando cerca de 500 quilômetros do Pico Paraná e sem tempo para arrumar um amigo e planejar a ida até o PP, achei melhor procurar uma agência de turismo que fizesse o serviço de guia. De início pensei que não existissem agências que levassem clientes até o PP, mas acabei encontrando a Ana Wanke Turismo e Aventura (http://www.anawanke.com.br/). Entrei em contato, troquei algumas informações com a Ana e logo fechei o pacote, que incluía transporte, alimentação, barracas e guias. Achei essa ser e melhor opção no momento, pois não estava a fim de ir sozinho e também não queria que mais uma vez acontecesse algum problema e eu tivesse que desistir de tentar subir o Pico Paraná.

Tudo pago e acertado, agora era torcer para o tempo ajudar e não chover no final de semana marcado para subida do PP. E uma coisa a fazer era melhorar o condicionamento físico! Eu não estava muito mal fisicamente, mas precisava melhorar, pois o Pico Paraná é a montanha mais alta da região sul do Brasil e para evitar problemas e acidentes era melhor estar bem fisicamente. E também precisava perder dois ou três quilos extras adquiridos nas comilanças de inverno. Tinha exatamente um mês para me preparar e foi justamente o que fiz. Caminhei e corri, fiz reforço muscular para as pernas e duas vezes por semana aula de spinning. Também fechei um pouco a boca e reduzi drasticamente o meu maior vicio, que é refrigerante. Mas na segunda semana de treinamento tive um problema de tornozelo e tive que diminuir um pouco o ritmo dos treinamentos. Mesmo assim cheguei tinindo fisicamente no dia do embarque rumo à Curitiba.

Encontrei o pessoal numa madrugada gelada em Curitiba e fomos de van até a Fazendo Pico Paraná, distante uns 40 quilômetros da cidade, no sentido São Paulo. Na van já tive o primeiro contato com o pessoal que fazia parte do grupo. O grupo seria formado por mim e mais sete pessoas. A Ana seria a guia principal, auxiliada pelo Rodrigo e pelo Gustavo. E de caminhantes tinham as curitibanas Andy e Maristela, o gaúcho Eduardo e o pernambucano Jorge. Se eu vinha de longe, o Eduardo e o Jorge vinham de ainda mais longe!

Chegando na Fazenda Pico Paraná tomamos o café da manhã, onde foi servido um delicioso chocolate quente que serviu para esquentar um pouco. Em seguida fomos nos arrumar e nos preparar para iniciar a caminhada. E logo de cara descobri que tinha esquecido de trazer minha calça de caminhada. Não acreditei que tinha deixado para trás um item tão importante. A opção seria caminhar de calça jeans, mais isso limitaria muito meus movimentos. Já estava ficando desanimado, quando lembrei que tinha levado minha calça de ciclismo, a qual costumo usar para dormir em acampamentos, pois ela é bem confortável e quente para utilizar dentro do saco de dormir. O problema é que ela é bastante justa e achei que pagaria um grande mico ao usá-la. Fiquei uns dois minutos pensando em qual calça utilizar e nisso dei uma olhada para o lado e vi que tanto o Rodrigo, quanto o Gustavo estavam utilizando uma calça de ciclismo. Então vi que não seria mico nenhum colocar minha calça de ciclismo para caminhar no mato e foi assim que fiz.

Todos prontos, mochilas nas costas, uma breve reunião para que fossem dados alguns avisos e iniciamos a caminhada. Eu conhecia boa parte do caminho a ser percorrido, pois parte do caminho que leva até o Pico Paraná é o mesmo caminho que percorri anos antes para ir ao Caratuva e depois ao Itapiroca. Segui quase no final da fila, pois queria sentir o ritmo de caminhada dos demais e saber como seria o meu ritmo comparado a eles. Nos primeiros minutos de caminhada aconteceu um incidente com a Maristela, que ao tentar pular de uma pedra a outra em um trecho de lama, escorregou e caiu no barro. Felizmente ela não se machucou (talvez o orgulho tenha ficado um pouco ferido) e assim seguimos em frente. O primeiro trecho é pelo meio do mato, subindo alguns degraus esculpidos na terra e depois seguimos por uma trilha relativamente tranquila, mas sempre subindo. Fizemos algumas breves paradas no início e logo resolvi ir mais para frente na fila, seguindo pouco atrás da Ana, que ia sempre na frente.

Levamos cerca de uma hora para chegar ao morro do Getúlio, que é um local descampado, cheio de pedras e de onde se tem uma bela visão para todos os lados. A visão mais bonita é da represa Capivari, alguns quilômetros abaixo. Ali fizemos uma longa pausa, ajeitamos as mochilas, tiramos fotos e seguimos em frente. Foi a partir do Getúlio que nosso grupo se dividiu, formando dois. No grupo que estava mais rápido seguiam a Ana, Andy, eu e Eduardo. Me sentia muito bem fisicamente e não tive nenhum problema em acompanhar o ritmo mais forte do pessoal da frente. De tempos em tempos fazíamos alguma parada para descanso e a Ana aproveitava para falar pelo rádio com o Gustavo, que seguia fechando a fila do segundo grupo. Caminhamos um bom tempo assim até que chegamos no cruzamento das trilhas que levam ao Pico Paraná e ao Caratuva. Ali ficamos esperando o restante do grupo. Eu conhecia o caminho até esse local, então a partir dali tudo ficaria mais interessante para mim, pois o caminho a seguir seria inédito.

Após descansar e tirar fotos, voltamos a caminhar e o grupo continuou dividido. A trilha seguia quase sempre pelo meio do mato, em um terreno cheio de raízes. Vez ou outra tinha algum trecho onde era preciso fazer uma pequena escalada segurando nos galhos e raízes de árvores e em alguns casos em cordas estrategicamente amarradas nos locais de mais difícil acesso. Tinham alguns trechos de rocha que eram bastante lisos e era preciso tomar cuidado para não cair. Num trecho de mata fechada e cheia de raízes eu seguia no final do meu grupo e acabei sofrendo um pequeno acidente. Ao pisar ao lado de um galho enorme, meu pé afundou no barro e virou. Para não torcer o pé, fiz um movimento brusco virando o corpo rapidamente e nisso bati muito forte com a canela num galho. A pancada foi forte e senti muita dor. Soltei alguns palavrões e me sentei para olhar o estrago. No local da pancada tinha levantado um caroço e a dor era forte. Por alguns momentos achei que minha caminhada tinha terminado ali, que eu não conseguiria pôr o pé no chão por culpa da dor e teria que desistir de chegar ao PP. Meus olhos se encheram de lagrimas por culpa da dor e da decepção e quando vi o pessoal voltando para ver o que tinha acontecido comigo, segurei as lágrimas e contive a vontade de chorar. O Eduardo é médico e a Andy é dentista e os dois se encarregaram de ver o estrago em minha canela e logo a Andy me deu uma pomada para passar no local da pancada. Fiquei em pé e vi que mesmo sentindo muita dor dava para seguir em frente, o que me deixou bastante aliviado. Voltamos a caminhar, mas a dor ainda era forte e comecei a achar que não conseguiria chegar até o fim do dia caminhando. Logo fizemos uma parada em um pequeno córrego para pegar água e ali a Andy me deu um remédio para dor. Aproveitei para colocar uma mochila com água (que ali era bem fria) na canela e isso aliviou a dor quase por completo.

Na parada que fizemos no córrego aproveitei para comer um dos sanduiches naturais que faziam parte do kit lanche entregue pela Ana. O sanduiche era muito saboroso e ajudou a levantar meu animo que tinha ficado um pouco baixo após a canelada que dei um pouco antes. Voltamos a caminhar e não demorou muito para sairmos do trecho de mata fechada e chegarmos em um trecho mais aberto e termos a primeira visão do Pico Paraná. A visão era maravilhosa, pois mostrava a enorme montanha imponente em meio a algumas nuvens. Olhando dali parecia ser meio que impossível atingir seu cume. Fiquei pensando nos primeiros montanhistas que passaram por ali, abrindo caminho pela mata em busca da melhor rota que os levassem até o cume. Esses caras eram valentes e persistentes, pois se hoje em dia com a rota conhecida e demarcada, bem como a facilidade que alguns equipamentos modernos dão aos montanhistas não é muito fácil chegar ao cume do Pico Paraná, no passado devia ser muitas vezes mais difícil.

Depois de passar pelo trecho de mata aberta, que era quase que completamente formado por uma planta chamada caratuva (o mesmo nome da montanha próxima dali), caminhamos mais um pouco e chegamos ao acampamento número um (A1). Ali encontrei um pessoal de Londrina, que fazem parte do grupo de caminhadas Londrinapé. Nesse grupo estavam o Arnaldo, amigo de outras caminhadas pelo interior, e também o Berti, que é guia de caminhadas na cidade de Faxinal, local famoso por suas cachoeiras. Conversei um pouco com o pessoal, tiramos fotos e logo retomamos a caminhada. Dessa vez a trilha era em descida, o que era menos cansativo, mas que exigia mais cuidado para não cair. Não demorou muito e chegamos a famosa “carrasqueira”, um paredão de rocha com escadinhas, que é considerado o trecho mais difícil para se chegar até o cume do Pico Paraná.

Com bastante cuidado meu grupo subiu a “carrasqueira”. A Ana foi na frente, seguida pela Andy. No meio da subida a alça da mochila da Andy arrebentou e quase provoca um acidente. Por sorte foi somente um susto e conseguimos chegar são e salvos no alto da “carrasqueira”. Dali para frente a trilha era tranquila. Logo chegamos em algumas rochas enormes, próximas ao acampamento dois (A2). A Andy adora tirar fotos sentada em pedras e quando a Ana mostrou a ela uma pedra enorme, ela não se conteve e correu para tirar muitas fotos. Essa pedra acabou sendo batizada como “Pedra da Andy”. Após muitas fotos seguimos mais um pouco morro acima, até o A2, local onde montaríamos nosso acampamento. Lá nos esperava o Silvio, um cara digamos meio exótico, mas muito prestativo e gente finíssima. Ele é gerente da loja Território Mountain Shopping, em Curitiba. Ele costuma dar suporte a algumas expedições promovidas pela Ana e nesse dia não foi diferente. Como ele chegou de manhã no A2, ele reservou o melhor lugar para que montássemos nossas barracas. Era uma pequena clareira, cercada por arbustos altos que protegiam do vento, que ali no alto costuma ser forte.

Foram montadas três barracas, com ajuda do Silvio e depois fizemos um lanche. A Ana falou pelo rádio com o pessoal do grupo que vinha mais atrás e as notícias não eram nada boas. O Gustavo tinha torcido o pé e ficaria acampado sozinho no A1. O restante do grupo seguiria ao nosso encontro no A2. Tínhamos levado seis horas para chegar até o A2. Segundo a Ana chegamos super rápidos, pois ela tinha previsto que levaríamos de dez a doze horas para chegar ali. Então ficou a dúvida se partiríamos dali para o ataque ao cume, o que levaria mais uma hora morro acima, ou se esperaríamos o restante do grupo e faríamos o ataque ao cume todos juntos de madrugada. Acabou ficando decidido que esperaríamos os demais membros do grupo.

Eu, Ana e Andy, descemos até a “Pedra da Andy” e lá ficamos esperando o restante de nosso grupo. A Ana ficou em comunicação via rádio com o Gustavo, que ficou no A1. Enquanto esperávamos ficamos admirando a paisagem e tirando algumas fotos. Abaixo de nós existia um verdadeiro mar de nuvens, que ao mesmo tempo que não nos permitia admirar por completo a paisagem, era um espetáculo à parte. As nuvens se moviam com o vento, hora cobrindo parte de algumas montanhas menores que estavam abaixo de nós, hora escondendo partes do cume do Pico Paraná, que estava acima de nós. O Pico Paraná fica numa região onde existe uma pequena cadeia de montanhas, sendo que ele é a maior montanha dessa cadeia. Então de onde estávamos era possível ver várias montanhas próximas, bem como o Conjunto Marumbi, bem mais distante dali, no meio da Serra do Mar.

Após um tempo de espera, a Ana resolveu descer até a “carrasqueira” para auxiliar o pessoal de nosso grupo quando eles lá chegassem. Eu e Andy ficamos na “Pedra da Andy” com o rádio. Logo a Andy resolveu explorar algumas pedras abaixo de onde estávamos e que ficavam na beira do abismo. Acabei indo atrás dela, em parte com receio de que ela pudesse se meter em encrenca e em parte por que ficar parado olhando a paisagem estava me dando sono. Sei que acabamos encontrando um local muito legal, uma espécie de janela entre as rochas e ali ficamos vendo a paisagem e tirando fotos. Comentei com ela que poucas pessoas deveriam ter estado naquele local antes de nós. E isso me atrai muito, estar em locais onde poucas pessoas colocaram o pé antes! Resolvemos parar com nossa pequena exploração no meio das pedras, com receio de encontrar alguma cobra e voltamos para o alto da “Pedra da Andy”. Tiramos mais algumas fotos e logo vimos a Ana chegando a frente do restante de nosso grupo.

Cumprimentamos o pessoal e eles pararam na “Pedra da Andy” para tirar fotos. Logo todos seguimos para o local onde estava montado nosso acampamento. A segunda parte do grupo, formado pelo Jorge, Maristela e Rodrigo, chegou no A2 duas horas e quinze minutos depois da chegada da primeira parte do grupo. Achei sensata a forma como a Ana conduziu a expedição, quando deixou que os dois grupos, que tinham preparo físico e velocidade diferentes, se separassem. Se ela mantivesse o grupo sempre junto, estaria fazendo o pessoal mais veloz ir lentamente, o que não seria legal, ou então faria que o grupo mais lento andasse num ritmo mais forte, o que poderia desgastar demais o pessoal. Tal divisão só foi possível graças ao grupo ter três guias. Mesmo com a contusão do Gustavo, foi possível manter os dois subgrupos com um guia cada, o que tornou a subida até o A2 bastante segura.

Antes de escurecer fui com a Ana e a Andy até um mina próxima buscar água. No caminho paramos na “Casa de Pedra”, que é a ruína de uma construção feita de pedras. Não sei o motivo da construção em tal local, nem sua datação e muito menos o motivo de estar em estado de abandono. Me ocorre que no momento não tive a curiosidade de perguntar isso a Ana ou alguma outra pessoa que estivesse pelas imediações. De lamentável é a quantidade de lixo deixado pelas imediações da Casa de Pedra. Parece que muita gente que sobe até o Pico Paraná, não tem nenhuma consciência ecológica e na descida resolve aliviar um pouco do peso da mochila, deixando no A2 muito lixo, bem como toalhas, mantas, pedaços de lona plástica e diversas garrafas pet. E como não existe nenhum tipo de controle por parte do IAP (Instituto Ambiental do Paraná) ou dos proprietários da Fazenda Pico Paraná (que cobram para permitir o acesso até o Pico), cada dia que passa vai ficando mais lixo acumulado. Infelizmente existe muita falta de educação por parte das pessoas, que costumam jogar lixo na rua e deixar lixo no alto de um morro. Lá não tem coleta de lixo, não existe caminhão de lixo passando toda semana.

O sol foi embora e a noite chegou com muito vento e frio. Fui para a barraca e lá tomei meu banho de gato, utilizando uma pequena toalha molhada e lenços umedecidos. Em seguida coloquei roupa limpa e me senti um novo homem. Não consigo ficar sem banho, não importa onde eu esteja! A Ana começou a preparar o jantar, cujo cardápio consistia de estrogonofe, arroz e purê de batata. A comida era liofilizada, que resumindo quer dizer que era um tipo de comida que foi desidratada e depois reidratada ao ser adicionada água quente nela. Durante o preparo da comida quase todos ficaram ao redor da Ana, vendo ela preparar o delicioso jantar e também ajudando. A ajuda consistia de ficar chacoalhando os envelopes com comida liofilizada após a Ana colocar água quente neles. O resultado foi muito bom, pois a comida ficou saborosa.

Após jantar fui escovar os dentes e achar um banheiro. Ventava muito e fazer as necessidades no meio do mato, com vento e escuridão não era das tarefas mais agradáveis. Mas em minhas aventuras já passei por situações mais difíceis ao ter que usar banheiros, então não tive grandes problemas. Antes de ir dormir fui dar uma volta e fiquei olhando o céu. O céu estava limpo e com muitas estrelas. Consegui até mesmo ver uma estrela cadente! Fiz um pedido a ela, mas até agora tal pedido não se realizou…

Encontrei a Ana pelo caminho e fomos nos juntar a Andy, Rodrigo e Maristela, que estavam do outro lado de nosso acampamento. Ficamos um tempo deitados no chão, conversando e vendo o céu estrelado. O frio aumentou e como estava muito cansado, achei melhor ir para a barraca. Eu dividiria a barraca com o Rodrigo. Me ajeitei dentro do saco de dormir e logo fiquei quentinho. Olhei no relógio e passava um pouquinho das 21 horas. Estava dormindo cedo para um sábado à noite, mas isso não importava. O que importava é que dali poucas horas eu estaria pisando no cume do Pico Paraná, realizando mais um sonho, mais um item da lista de realizações que formulei há pouco mais de três anos. ZZZZZZZZZZZzzzzzzz…

Com 1.877 metros de altitude, o Pico Paraná é a montanha mais alta da Região Sul do Brasil. Está situada entre o município de Antonina e Campina Grande do Sul, no conjunto de serra chamado Ibitiraquire. Foi descoberto pelo pesquisador alemão Reinhard Maack. Entre 1940 e 1941 Maack efetuou diversas incursões à Serra do Ibitiraquire com o objetivo de obter medições e anotações sobre a fauna e a geomorfologia da região. Maack juntamente com os alpinistas Rudolf Stamm e Alfred Mysing e com auxílio de tropeiros da região, partiu em 28/06/1941 com o objetivo de conquistar o cume da montanha. Stamm e Mysing conseguiram o intento em 13/07/1941.

Rodrigo, Andy, Vander, Ana, Eduardo, Gustavo, Maristela e Jorge.
Rodrigo, Andy, Vander, Ana, Eduardo, Gustavo, Maristela e Jorge.

Descanso no Getúlio.
Descanso no Getúlio.

Cruzamento de trilhas: Pico Paraná e Itapiroca.
Cruzamento de trilhas: Pico Paraná e Caratuva.

Subindo com ajuda da corda.
Subindo com ajuda da corda.

Primeira visão completa do Pico Paraná.
Primeira visão completa do Pico Paraná.

Com o pessoal de Londrina e Faxinal.
Com o pessoal de Londrina e Faxinal.

No meio das caratuvas.
No meio das caratuvas.

Subindo a carrasqueira.
Subindo a carrasqueira.

Na Pedra da Andy.
Na Pedra da Andy.

Acampamento.
Acampamento.

Observando a paisagem.
Observando a paisagem.

Lanche no A2.
Lanche no A2.

O Eduardo admirando a paisagem.
O Eduardo admirando a paisagem.

O jantar...
O jantar…