II Enduro a Pé de Nova Tebas (1º dia)

Acordei com um galo cantando. Achei que era hora de levantar e quando olhei o relógio senti vontade de depenar o galo cantor. Eram pouco mais de cinco da manhã, e o jeito foi tentar voltar a dormir. Fazia um pouco de frio, a barraca estava aconchegante, “convidando” para dormir mais. Mas não deu muito certo, o galo era insistente e chato, continuou cantando sem parar. Ainda consegui dormir um pouco e depois de acordar várias vezes resolvi levantar. O restante do pessoal estava acordado, todos querendo depenar o galo. 

Não demoramos muito para nos arrumar e deixando o acampamento montado, seguimos de carro até o centro de Nova Tebas. Lá pegamos um ônibus e viajamos alguns quilômetros até a comunidade de Volta Grande, onde seria o início do II Enduro a Pé de Nova Tebas. Seriamos somente nove participantes. Em razão do roteiro difícil e quilometragem planejada para mais de 40 quilômetros de caminhada, somente alguns “corajosos” se habilitaram a participar. Eu não me considero um dos “corajosos”, mas sim o “inconseqüente” do grupo, pois em razão de ainda estar me recuperando de um problema nas costas, não deveria participar de algo que exige tanto esforço e preparo físico. Mas sou teimoso e inconseqüentemente responsável, sabedor de meus limites. Então tomaria todos os cuidados para não me machucar mais. Minha única preocupação era conseguir acompanhar o ritmo do restante do pessoal. Não queria ser um estorvo para eles. 

Saímos de Volta Grande e logo atravessamos a estrada Campo Mourão/Guarapuava. Atravessando a estrada passamos a caminhar por uma estrada de terra em meio à mata e logo saímos numa região com pasto e muitas araucárias. O tempo estava nublado e meio frio, o que era bom para caminhar. Logo paramos no sitio do senhor José Dal Santo. Ali nos foi servido o café da manhã. Eu ainda estava empanturrado pela costela da noite anterior e não pretendia comer nada. Logo mudei de idéia quando vi a mesa farta. O café foi servido em uma mesa na varanda e o piso estava tão limpo que todos tiraram os calçados. Eu fiquei com preguiça de tirar minha bota e tomei o café ajoelhado ao lado da mesa. O pessoal comeu um monte, talvez prevendo que o almoço atrasaria muitooooo nesse dia. Logo após o café fomos até a Cachoeira São Roque, que ficava ali perto. Tivemos que descer um barranco enorme e úmido, mas sem grandes problemas. A visita valeu a pena, pois a cachoeira é muito bonita. Entrar na água nem pensar, a água estava muito gelada. 

Saindo da cachoeira, seguimos nossa caminhada. Andamos um bom tempo ao lado de uma cerca de arame, próximo a um pasto. Depois tivemos que passar pela cerca. Essa foi a primeira de muitas cercas de arame farpado que teríamos que atravessar nesse dia. Caminhamos por um trigal e após atravessar nova cerca, pudemos ver ao longe uma pequena boiada sendo conduzida por alguns homens a cavalo. Então passamos a percorrer a antiga estrada que ligava Pitanga a Catuporanga. Logo encontramos o primeiro de muitos pés de laranja que fariam nossa alegria durante o dia. O restante da manhã caminhamos por estradas de terra, entre árvores e capinzais. 

Passava um pouco do meio-dia quando chegamos a comunidade de Santa Clara. O Marcos, nosso guia, trabalha na Emater de Nova Tebas e conhece muita gente na região, o que facilitou muita coisa para nós. Em Santa Clara fomos nos abastecer de água em uma casa de pessoas que o Marcos conhece e a dona da casa nos “presenteou” com suco de laranja para levarmos no caminho. E tanto ela quanto o marido insistiram para almoçarmos com eles. Agradecemos o convite e seguimos nossa caminhada.   

Passamos por outra região com muita mata preservada, tendo muitas árvores centenárias. O sol estava começando a castigar, e caminhar sob a sombra das árvores era algo muito bom. Infelizmente logo a mata acabou e tivemos que caminhar sob o sol quente, ao lado de plantações. Passamos em um local onde uma enorme árvore caída servia de “ponte” sobre um riacho. Pulamos uma cerca de arame farpado e fomos atravessar a tal árvore. Foi um exercício de equilíbrio muito divertido. Então surgiu um touro muito bravo do outro lado da árvore, dando urros muito fortes e assustadores. Acho que o touro era meio psicopata. Achamos melhor ficar longe dele e seguimos nosso caminho pela estrada.

No meio da tarde chegamos a Cachoeira Barreirinho. Mesmo com sol forte, a água estava fria e achei melhor não entrar nela. Outro que não entrou foi o Wagner Lino, que estava meio resfriado. O restante da galera foi todo pra água. Após uma hora de descanso na cachoeira, chegou a vez de seguir com a caminhada. Ainda não tínhamos almoçado e a fome começava a apertar. Tínhamos uma programação básica para seguir e horários que não precisavam ser seguidos a risca. Isso era bom, pois podíamos parar em lugares que achávamos mais interessantes. Por outro lado, isso acabava atrasando o horário das refeições, o que acabou não sendo problema, pois ninguém reclamou de ter passado fome ou de comer fora do horário. 

Atravessamos mais um pasto, cuidando para manter as vacas distantes de nós. Entramos em uma estrada e seguimos por ela por um bom tempo, até pular mais uma cerca de arame e seguir pelo meio de um capinzal. Então chegamos a um pé de laranja carregado de laranjas muito doces. Como a fome começava a apertar, fizemos uma longa parada e chupamos todas a laranjas possíveis. Votamos a caminhar e passamos por outra estrada antiga que de tão abandonada foi tomada pela grama e pelo mato. Daí chegamos a um rio e a única forma de atravessá-lo foi entrando na água. Tiramos os calçados e com o Marcos nos guiando atravessamos o rio sem problemas ou quedas. Eu passei por uma situação digamos constrangedora. Escorreguei quando estava no meio do rio e foi uma perna para cada lado. Foi algo parecido com aquelas aberturas de perna que as bailarinas fazem. Confesso que foi uma experiência um pouco dolorida. Após atravessar o rio passamos por mais um pasto e logo chegamos ao Pesque Pague onde seria servido nosso almoço. O detalhe é que eram seis da tarde e o almoço estava mais é com cara de janta. 

Fomos muito bem recebidos no Pesque Pague e o almoço além de farto, era muito saboroso. Todos estávamos famintos e comemos até não poder mais. Eu mal tinha me recuperado da janta da noite anterior e me entupi de comida novamente. E ainda teve sobremesa, que não sei como consegui arrumar espaço para ela em meu estômago. Descansamos um pouco e seguimos com nossa caminhada. 

Já era noite e nos demos conta de que todos tinham deixado as lanternas nas barracas, no acampamento. Ninguém previu que poderíamos nos atrasar e termos que caminhar a noite. Por sorte a lua cheia estava nascendo e nem sentimos falta das lanternas. Foi uma experiência muito interessante caminhar a noite sob a luz da lua, sem lanterna alguma. Eu já tinha participado de caminhadas noturnas, mas sempre com lanternas. Sei que caminhamos por quase três horas iluminados pela lua cheia, até chegarmos a Nova Tebas. Entramos na cidade e caminhamos até o centro, onde sentamos em um gramado próximo a catedral da cidade e descansamos um pouco. Passava um pouco das 21h00min e pelo GPS tínhamos caminhado 30 quilômetros e alguns metros nesse dia. Tinha sido cansativo, mas muito prazeroso e todos estavam felizes por terem vencido o desafio do dia. 

Fomos de carro até o sitio do Alex, onde tinham ficado nossas barracas. Eu estava quebrado e fui direto para minha barraca, onde me deitei e cochilei por alguns minutos. Depois fui tomar banho. O banho era a moda antiga, ou seja, água quente em um galão suspenso por uma corda, com uma torneira embaixo dele. Era um chuveiro adaptado, mas que resolveu muito bem a necessidade de um banho. Lembrei que a última vez que tinha tomado banho nesse estilo, foi há quase vinte anos em uma fazenda no interior do Paraguai. 

Achei que ninguém ia querer jantar, pois tínhamos almoçado às seis da tarde e comemos muito. Mas o Alex e a Jaque prepararam uma alcatara assada e um arroz carreteiro que eram irresistíveis. Todos comemos e eu particularmente não sei como consegui comer tanto em menos de vinte quatro horas. Depois de jantar conversei um pouco com o pessoal e fui me deitar no gramado próximo a fogueira. Fiquei olhando a lua, as estrelas e pensando numa certa loira que naquele momento estava em uma festa em Londrina. Acabei adormecendo ali e após uns minutos acordei assustado e achei melhor ir dormir na barraca. Estava muito cansado, mas feliz por ter conseguido caminhar os 30 quilômetros sem sentir muitas dores. Logo peguei no sono, torcendo para que o galo tivesse ido  “parar”  na panela de alguém e não me acordasse muito cedo no dia seguinte. 

Volta Grande, Cachoeira São Roque, Café da manhã, Santa Clara.
A arte de pular cerca.
Alguns momentos do Enduro a Pé.
Paisagens do caminho.
Cachoeira Barreirinho.
Alguns momentos do Enduro a Pé.
Laranjas e mais laranjas...
Atravessando o rio.
Almoço no final do dia e caminhada sob a lua cheia.

4 opiniões sobre “II Enduro a Pé de Nova Tebas (1º dia)

  • 17 de agosto de 2011 em 17:52
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    to lendo e dando cada passo junto com vocês…agora vou chupar umas laranjas q peguei em uma chácara sábado…deu vontade de tanto q vc falou em laranja…rsrsrs

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    • 18 de agosto de 2011 em 02:02
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      Mari,

      Faltou você lá, para caminhar conosco e chupar laranjas… rs!!

      Grande abraço,
      Vander

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  • 18 de agosto de 2011 em 21:51
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    Vander meu caro amigo, parabéns pela sua conquista, você me surpreendeu, logo após passarmos por Santa Clara eu achei que você não chegaria ao final. Foi um Heroi mesmo!!!!!!!!!!
    Parabéns pelo seu Blog, vc escreve muito bem…. e como alguém tão cançado como vc estava consegue lembrar de tantos detalhes, rsrsrs
    Um abraço
    Marcos

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    • 19 de agosto de 2011 em 00:36
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      Oi Marcos,

      Confesso que ao passarmos por Santa Clara também pensei que não aguentaria chegar ao fim do primeiro dia de enduro. Estava fora de forma, voltando de um problema grave na coluna e só cheguei ao final por força de vontade, fé e o apoio de todos que estavam caminhando, que nunca se cansaram de me ajudar a atravessar as cercas de arame. E no rio você chegou a pegar em minha mão para me ajudar a atravessar. Foi essa ajuda de todos que me fez chegar até o fim.

      E lembrar dos detalhes é uma questão de técnica, ou seja, vou olhando as fotos na ordem em que foram tiradas e lembro de muitos detalhes. Só não consigo de lembrar de todos os nomes das pessoas que encontramos pelo caminho.

      Valeu amigo!!!

      Vander

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